Finalmente um sopro de bom senso, tanto de regulados quanto de reguladores, no mercado de seguros de saúde. Segundo notícia publicada no portal “UOL”, “o governo estuda permitir que as operadoras ofereçam planos com franquia, de forma semelhante a um seguro de carro. Para usar o plano, o cliente teria que pagar um valor adicional, além das mensalidades. A medida só valeria para novos contratos”.
É óbvio que o sistema de consultas e exames ilimitados, sem franquia, é insustentável, pois leva segurados e médicos a abusar do uso do seguro, inclusive de forma fraudulenta, em alguns casos. A tendência é que, com isso, caiam os custos e os preços dos prêmios.
Como alertei, aqui mesmo neste espaço, há cinco anos, o tipo de contrato que vigora majoritariamente no Brasil incentiva de forma absurda a utilização dos serviços pelos usuários, que, apesar de pagarem prêmios mensais fixos, estão praticamente livres para utilizar os serviços cobertos (consultas e exames) de forma ilimitada.
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Não por acaso, muita gente corre para o hospital logo no primeiro espirro e de lá não sai enquanto não constatar, via exames caríssimos, que não está com alguma doença gravíssima. Os médicos, clínicas e hospitais conveniados, por seu turno, também não demonstram o menor pudor de pedir exames detalhados, ainda que o exame físico do paciente, em princípio, não demonstre a necessidade de tantos cuidados.
Já imaginaram se, a exemplo do que ocorre no setor de saúde, existissem seguros com direito a serviços ilimitados de barbeiro, cabeleireiro, manicure, mecânico de automóvel ou corrida de taxi? Provavelmente, quem costuma cortar o cabelo uma vez por mês, sentir-se-ia impelido a ir ao salão toda semana. O dono de um carro não pensaria duas vezes em recorrer à oficina ao primeiro barulhinho estranho no veículo e qualquer um deixaria de caminhar um quilômetro para tomar um taxi.
Não há nada de errado nesse tipo de comportamento. O problema está nos incentivos que tais seguros gerariam. Pensando nisso, as seguradoras de automóveis criaram as franquias e os bônus de descontos para aqueles usuários com poucos sinistros no currículo. São maneiras de incentivar os segurados não só a dirigir com mais cuidado, como também evitar deixar seus veículos estacionados em locais de risco.
O problema com os seguros de saúde é que os regulamentos do governo não permitem que eles façam o mesmo. E a tendência, na esfera judicial, é ainda pior: descartar o teor dos contratos e julgar todo e qualquer caso de acordo com a necessidade do segurado, afinal “a saúde é um direito humano”.
Quando surgiram, os primeiros seguros de saúde cobriam apenas internações emergenciais, deixando de fora consultas e exames. Pode ser que eu esteja enganado, mas ou reformamos o modelo atualmente vigente ou daqui a pouco não teremos mais nada, além do sistema público e de um sistema privado tão ruim quanto.
Fonte: “Instituto Liberal”, 24/04/2018