Com devida vênia a Lima Barreto e François Rabelais.
Um alquimista descobriu como transformar merda em metais preciosos. Com isso, os habitantes de Jambon começaram a obrar ouro por fezes. Cada qual recolhia suas porcarias e comprava escravos, gado, automóveis de luxo, plantava cana e comia pernis regados a vinhos de boa cepa.
A enorme obradeira virou imponente riqueza e globalizou-se. Pesquisas realizadas pelo Center for Shit Research da Universidade de Harvard e pelo Bureau de la Recherche de la Merde da Sorbonne constataram que enquanto um bem alimentado miliardário americano ou um inteligentíssimo filósofo francês produziam um pobre cocô, qualquer cidadão (mas sobretudo os nobres e os políticos) de Jambon produzia um excremento de incomparável teor de riqueza. Para desconsolo de uma elite que sempre achou o nacional inferior, descobriu-se que não havia no mundo nenhuma excremento superior ao de Janbom.
A perspectiva de uma riqueza para todos — afinal, defecar é universal — promoveu, porém, controvérsia.
Foi interpretada como uma “paradoxal contradição que liquidava a desigualdade”. Deste modo, os entendidos em merda realizam um plebiscito que estatizou a bosta. Ela foi centralizada numa grande estatal que controlava as ambições dos empresários e cuidava da porcaria dos pobres, impedindo-os de desperdiçar suas cagadas que, reunidas num fundo, eram distribuídas para todos como parte de um grande tesouro nacional. Com isso, o governo reiterava seu compromisso com a salvação pátria e com a promoção do altruísmo. A borra, diziam, era coisa muito séria para ser explorada pela iniciativa privada.
Um acirrado debate desembocou na campanha, “a merda é nossa!” e o excremento, finalmente politizado, valorizado e devidamente indexado e quantificado, passou a ser o grande tema nacional.
Criou-se o programa “Merda-nostra” e um superdisputado Ministério da Merda, governado por um irmão do próprio rei de Janbom, pois um cargo de tal responsabilidade só poderia ser ocupado por “alguém de confiança!” Institucionaliza-se o lema pátrio: “Cagar é a melhor política.” Nacionaliza-se a bosta e, em seguida, o Comitê dos Sábios Nacionais separa por decreto o cagar do defecar. O primeiro era obra dos destituídos, o segundo seria uma exclusividade da classes superiores, dos que têm biografia e dos membros do partido, cujas fezes eram trocadas por títulos do Tesouro e, depois, cambiadas por ouro na Bolsa da Merda que, a essas alturas, apostava num extraordinário mercado futuro que iria redimir o país de todas as suas mazelas.
Um amplo esquema de corrupção fecal, entretanto, insinuou-se nos intestinos do governo. Ele sustentava um clube de corruptos merdosos que enriquecia cada vez mais os administradores do excremento que, junto dos seus compadres, amigos e parentes, lucravam com a centralização da bosta nacional. Esse nepotismo de bosta jamais cessou mesmo quando um novo governo implementava novos marcos exploratórios e critérios para a divisão das quotas do cocô entre os diversos ducados. Mas, apesar de medidas distributivas, a merda continuava concentrada, como demonstrou empiricamente, por meio do “índice da kaca”, um professor catedrático especializado em bosta da Universidade de Stanford, Veio então a “Crise da Bosta”, quando outras nações conseguiram produzir industrialmente a imundície.
Dilacerado por coalizões intestinas, Jambon assiste à falência do seu Estado que, àquelas alturas, já havia transformado todos os seus habitantes em clientes do bosta-governo.
Usando dos seus tradicionais laços fisiológicos, os políticos aumentavam privada e legalmente o valor das cagadas. Uma hiperinflação excremental atinge o país, fazendo aquela economia de merda entrar na fossa. Muda-se o regime, congelam-se os preços das cagadas e os estoques de titica nacional.
Jambon chega ao fundo da latrina.
Gradual e lentamente, os cidadãos comuns, cognominados de “cagões”, começaram a controlar a fedentina, retomando o usual, mas legalmente proibido hábito de puxar a descarga. Chegou-se à conclusão de que era preciso limitar e punir a produção de merda e obrar mais responsavelmente.
PS: Estou informado que esta continua sendo a grande discussão do Reino de Jambon. Enquanto isso, as pessoas vão levando suas vidas, comendo e descomendo o pão amargo de cada dia. Vez por outra tomam o choque de saber que crianças não têm escola porque o governo continua preocupado com o tamanho das latrinas, os empresários querem vender mais caro o papel higiênico e o povo, bem, o povo continua com uma insuportável dor de barriga.
Nota Final: Essa história me foi contada pelo Sebastião Azambuja (o Sabá) debaixo do testemunho do Emmanuel Plumbio Dias e eles não tem nada a ver com essa versão que — obviamente — não guarda nenhuma semelhança com países, fatos e pessoas vivas ou mortas, sendo inteiramente ficcional e fantasiosa.
O tio aí, chutou o pau da barraca mesmo.