A PEC 287, um passo importante em direção ao equilíbrio nas contas públicas, foi elaborada com muita competência por pessoas que conhecem profundamente o assunto.
Mesmo que o Congresso a altere em alguma medida, proporcionará uma redução significativa nos gastos previdenciários no médio e no longo prazo. Mas é insuficiente, pois deixa de lado dois aspectos críticos: a sustentabilidade do sistema no longo prazo e o alívio nos gastos no curto prazo. Medidas complementares a esses dois pontos são indispensáveis.
Como a maioria dos países, o Brasil adota o modelo da repartição, que se baseia em um pacto implícito entre gerações: os trabalhadores jovens contribuem para um fundo geral que é repartido entre os idosos, sob a promessa de que quando se aposentarem outros jovens pagarão as suas aposentadorias.
Isso funcionou bem enquanto o número de novos trabalhadores era suficiente para financiar os benefícios dos que se aposentavam. Todavia, a redução nas taxas de fertilidade conduziu gradualmente o modelo de repartição à crise em todos os países que o adotaram.
Juntamente com o envelhecimento da população, ocorre uma transformação profunda nos mercados de trabalho, nos quais surgem novas formas de contratação, com vínculos menos duradouros e maior rotatividade.
O sistema de repartição, que depende da “abundância” de jovens e de mercados de trabalho com vínculos estáveis, está duplamente ameaçado e será cada vez mais difícil sustentá-lo. A PEC 287 mantém esse modelo, alterando apenas alguns de seus parâmetros. É preciso complementá-la, a fim de criar um sistema sustentável para nossos filhos e netos.
A Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) tem sugerido a criação de uma nova Previdência. Seria um sistema único que cobriria todos os trabalhadores, inclusive funcionários públicos e militares, composto por benefícios contributivos e não contributivos e organizado em quatro pilares.
A proposta combina capitalização em contas de poupança individual, benefícios de repartição em um fundo social e transferência de renda incondicional para os idosos. A combinação de diferentes conceitos daria sustentabilidade ao sistema, que não dependeria de apenas um pilar, como o atual.
A proposta Fipe tem a qualidade adicional de diminuir drasticamente as contribuições sobre a folha de salários, que hoje são de 28% a 31% e passariam, provavelmente, para apenas 10% a 12%, desonerando o trabalho, promovendo o emprego e reduzindo a informalidade.
Como transitar do atual sistema para a nova Previdência? Uma possibilidade seria manter as atuais alíquotas de contribuição sobre os novos trabalhadores. Os jovens continuariam a financiar os atuais aposentados e contribuiriam para as suas próprias aposentadorias. Pagariam duas vezes e seriam penalizados.
Outra possibilidade, mais justa, seria taxar os benefícios das aposentadorias atuais, para diminuir a carga sobre os jovens.
Evidentemente, interesses corporativos se oporão, mas uma contribuição progressiva sobre os benefícios de maior valor dividiria com mais justiça o ônus da transição e, ao mesmo tempo, traria um alívio apreciável e imediato nas contas públicas.
Assim como o Plano Real interrompeu o conflito distributivo da superinflação de 1980/90, a nova Previdência pode ser a fórmula para superar o conflito corporativo dos dias atuais.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 28 de fevereiro de 2017.
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