A crise da covid-19 obrigou-nos a encarar a dura realidade. Se o País continuar trilhando o caminho do sectarismo político, do capitalismo de Estado e do clientelismo social, vamos deixar para as próximas gerações um Brasil politicamente instável, fiscalmente falido e socialmente desigual. Os arroubos populistas contribuíram para aprofundar os males que já existiam antes da pandemia. A falta de coordenação política do governo desestabilizou a relação institucional entre os Poderes. O agravamento da tensão política com os governadores, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal colaborou para a formação da tempestade perfeita. Durante a pandemia nos tornamos um dos recordistas mundiais em número de mortes e sofremos uma das maiores quedas da atividade econômica entre os principais países.
A economia, que rastejava à beira da recessão antes da epidemia, voltou a mergulhar no crescimento negativo do PIB, estimado em torno de -6%. A dramática situação fiscal agravou-se com o aumento do gasto emergencial para enfrentar a crise, levando o País a uma dívida próxima de 100% do PIB. O desemprego, que já se encontrava num dos patamares mais elevados da História do Brasil, atingiu quase metade da população economicamente ativa. A extrema pobreza voltou a crescer, 15 milhões de brasileiros passaram a viver com menos de US$ 1,90 por dia. Mas momentos de impasse servem para repensarmos nossas ações, revermos nossos erros e mudarmos de atitude para corrigir a rota a ser trilhada.
Há sinais importantes de mudança de comportamento. O presidente da República trocou o tom belicoso por gestos conciliatórios com o Supremo e o Congresso. O vice-presidente reabriu o diálogo com empresários sobre as questões ambientais, buscando desanuviar a desconfiança dos investidores no País e reafirmar seu compromisso com o combate ao desmatamento na Amazônia. Os presidentes da Câmara e do Senado informaram que o Parlamento está pronto para retomar a votação das reformas e dos projetos de lei necessários para destravar o investimento e diminuir a insegurança jurídica no País. A sociedade civil também se mobilizou. O movimento Unidos pelo Brasil, lançado pelo CLP ( www.clp.org.br), almeja unir a sociedade civil, o governo e o Congresso em torno de uma agenda vital para impulsionar a retomada da economia, do investimento privado e do emprego. O objetivo é aprovar um conjunto de medidas até dezembro para reavivar a confiança dos investidores e atacar o crescente problema da desigualdade social, sem clientelismo estatal.
A união da Nação em torno de uma agenda de prioridades demandará mudanças de atitude de todos nós. Se nossas preferências políticas, partidárias e ideológicas predominarem sobre a busca do diálogo e do entendimento com o Congresso e com o governo, as reformas não avançarão e a economia continuará oscilando entre a recessão e o baixo crescimento nos próximos dois anos. Para evitar a ruína do País precisamos deixar nossas preferências políticas e ideológicas para o embate eleitoral em 2022.
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Se quisermos pavimentar o caminho da retomada do investimento privado e do emprego, será preciso enfrentar a pressão do corporativismo estatal e abandonar as reivindicações setoriais que buscam extrair benefícios do Estado. Teremos de dar prioridade à agenda nacional, como abertura econômica, privatização das estatais (que até agora não saiu do papel) e aprovação das reformas administrativa e tributária. Trata-se de medidas essenciais para aumentar a produtividade do governo e do setor privado. Ademais, é preciso transformar a educação na agenda prioritária do País. Não há futuro promissor numa nação onde 48% dos jovens abandonam a escola antes de concluir o ensino médio. Na era do conhecimento, a péssima qualidade da educação condenará uma geração de jovens ao desemprego e à dependência do Estado. Não se resolve a questão da desigualdade social criando dependentes do governo.
A igualdade de oportunidade continuará a ser um princípio inatingível num País em que o Estado é o principal criador de desigualdades sociais. Provedor de favores para o setor privado e de privilégios para o setor público, o Estado precisa abandonar suas políticas clientelistas e focar atenção e recursos para socorrer a população carente. O programa de renda básica precisa ser direcionado aos mais pobres e tem de ser financiado cortando os privilégios do corporativismo estatal e boa parte dos R$ 300 bilhões que o Estado confere em subsídios, isenção fiscal e benefícios para a classe média, empresas e setores da economia.
O impasse da covid-19 nos colocou numa encruzilhada. Se não mudarmos de atitude, vamos perpetuar a desigualdade, a injustiça social e a volatilidade política. Mas se nos unirmos em torno da agenda modernizadora do Estado, podemos dar ao Brasil o que a atual geração está devendo aos brasileiros: a criação das condições para construirmos uma nação mais próspera, mais estável e menos desigual.
Fonte: “O Estado de São Paulo”, 22/7/2020