Esta coluna, com frequência, criticou o governo da presidente Dilma Rousseff, sobretudo por seu alinhamento ideológico com governos autoritários e com ditaduras que amordaçam as liberdades e espancam os direitos humanos. A adesão cada vez mais explícita ao projeto bolivariano de socialização continental, marca registrada do governo petista, está comprometendo gravemente o peso do Brasil no cenário mundial e arranhando o prestígio do Itamaraty.
A honestidade intelectual e o dever de isenção, pré-requisitos de quem pretende fazer jornalismo ético, me obrigam a reconhecer quando o governo acerta. É o caso da Medida Provisória 657/2014, que confere maior autonomia e independência à Polícia Federal.
Para entender a importância da iniciativa da presidente Dilma Rousseff, seria oportuno que, juntos, façamos a leitura da medida provisória. Muita gente aplaude ou condena iniciativas em razão direta com suas simpatias políticas ou preferências ideológicas. E não é por aí. É necessário ir à fonte.
Inicialmente, não se trata de uma ação partidária. Basta ver que o mesmo conteúdo dessa MP de iniciativa do PT também foi objeto da emenda à Constituição do Estado de São Paulo, de nº 35/2012, editada por iniciativa do PSDB.
São três os pontos que merecem destaque: 1) o posto de diretor geral da Polícia Federal passa a ser ocupado apenas por delegado de Polícia Federal de carreira, dentre os integrantes do mais alto nível desse cargo; 2) passa a ter participação da OAB nas fases do concurso público para o cargo de delegado de Polícia Federal; 3) passa a haver exigência de três anos de atividade jurídica ou policial para a posse no cargo de delegado de Polícia Federal.
A iniciativa confere maior autonomia e independência à Polícia Federal, pois seu chefe passa a ser, necessariamente, alguém oriundo dos quadros técnicos, que foi aprovado em concurso e que já trilhou todos os níveis do cargo. Ou seja, indicações meramente políticas deixam de ser viáveis.
A nomeação pela Presidência da República do diretor geral não acarreta por si só uma intervenção na atividade policial. Basta lembrar que o mesmo já ocorre com outras carreiras, como com os ministros do STF, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União.
A participação da OAB no concurso público representa uma saudável vigilância da sociedade civil organizada sobre um dos concursos mais concorridos, o que contribui para uma Polícia Federal cada vez mais independente, republicana, técnica e transparente.
A exigência de experiência jurídica ou policial para o ingresso no cargo de delegado sobressai como uma evolução do que já acontece em diversos outros cargos, tais como na magistratura, no Ministério Público, na Defensoria Pública etc.
O escândalo da Petrobras, um autêntico enredo de novela de bordel, tem seu lado positivo: a força irreprimível da investigação e dos fatos. A Polícia Federal tem feito um excelente trabalho. Reforçar as instituições da República, sua independência e transparência, é o melhor caminho de defesa da democracia.
Fonte: O Globo, 10/11/2014.
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