O Brasil tem grandes desafios a vencer para melhorar a qualidade da educação, mas é importante constatar que inúmeras iniciativas em curso trazem a perspectiva de bons resultados. Universalizamos o acesso ao ensino fundamental, introduzimos uma cultura de avaliação que permitiu, entre outras coisas, clareza de algumas competências a serem desenvolvidas série a série, há livros didáticos para praticamente todos os cursos e o piso salarial para o professor, se não é o ideal, avançou bastante.
Mesmo assim, como mostram as avaliações externas aplicadas pelo Ministério da Educação (MEC) e por muitos Estados, a aprendizagem das crianças ainda deixa muito a desejar. Os alunos têm mostrado níveis críticos de domínio de competências em leitura e raciocínio matemático em quase todos os Estados e municípios. Precisamos, evidentemente, avançar mais, e mais rápido. Para tanto não basta investir mais em educação. É necessário, também, ter uma política educacional que se consolide num sistema nacional de educação, a exemplo do que já existe na saúde e em outras áreas. A fragmentação da política educacional começou a ser combatida com o Plano de Desenvolvimento da Educação, mas só teremos um ensino de qualidade se houver um processo nacional de certificação de professores e um currículo mínimo a que qualquer criança, por ser brasileira, tenha direito. A valorização de culturas locais e a autonomia da unidade escolar não podem vir à custa do acesso dos alunos a uma formação sólida em Português, Matemática, Ciências, História ou Geografia.
Nos Estados e municípios deveria haver uma definição e uma comunicação clara do que é sucesso escolar. A sociedade deve ser informada, seja por meio do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) ou de outros índices que meçam aprendizagem e fluxo escolar, se as crianças estão aprendendo. Da mesma forma, seria necessário tornar efetivo e complementar em todas as escolas o currículo mínimo nacional. Isso garantiria a padronização e o direito a uma aprendizagem comum, independente da escola ou do professor, bem como a possibilidade de considerar culturas locais e potenciais de cada unidade escolar. Além disso, a preparação de material de suporte para todas as disciplinas, com propostas alternativas de atividades a serem desenvolvidas em aula, ajudaria na instrumentalização do professor e complementaria o trabalho feito com base no livro didático.
Cada gestor estadual ou municipal deveria, por meio de avaliações regulares internas e externas, identificar alunos que não aprendem e oferecer-lhes a chance de um processo de recuperação da aprendizagem. Não é possível aceitar que a escola continue produzindo analfabetos funcionais e que isso só seja descoberto no sexto ano, quando o aluno não conta mais com professor alfabetizador! Neste caso, a recuperação só pode ser feita assumindo a existência do problema e realfabetizando a criança.
O gestor deveria também capacitar os professores de forma a sanar os problemas de aprendizagem identificados nas avaliações, associando capacitação não só à carreira, mas às reais dificuldades reveladas pelos alunos. Para ultrapassar essa realidade de baixos níveis de aprendizagem é urgente envolver a sociedade e dialogar com toda a comunidade escolar: professores, diretores e pais de alunos.
O Estado ou o município poderia ainda estabelecer um calendário de avaliações, definindo a cada período, dentro do ano letivo, as competências a serem trabalhadas e as verificações que darão conta do aprendizado. Não menos importante seria criar planos de carreira capazes de reter profissionais qualificados e atrair talentos para a profissão de professor. Além disso, considerar concursos que identifiquem melhor as aptidões para o magistério e incluam a formação como segunda etapa no processo seletivo.
Mas, sobretudo, deve-se investir em educação infantil, uma das áreas de melhor relação custo-benefício em educação. São excelentes os resultados de uma educação de qualidade ministrada na primeira infância, seja pela família, com o eventual suporte de políticas públicas, seja por creches que ofereçam uma abordagem integrada do desenvolvimento infantil, com estimulação precoce do cérebro, imersão num ambiente letrado, atenção à saúde e segurança afetiva.
O único caminho seguro para melhorar a educação é avaliar tanto a aprendizagem dos alunos quanto o acesso de crianças às escolas, os índices de evasão escolar, a repetência e a defasagem idade-série. A política educacional é uma política pública e, como tal, deve ter metas claras, voltadas não entropicamente para si própria, mas para os cidadãos beneficiários da ação que se quer implantar.
A definição de metas claras ajuda não só o monitoramento da implantação de projetos que integram a política, mas também a comunicação com a sociedade e a possibilidade de controle social. Cada família pode saber quanto melhorou a escola dos seus filhos e cada cidadão pode acompanhar o resultado dos impostos aplicados em educação.
Em todas as situações, é fundamental uma boa coordenação da implantação dos projetos associados à melhoria da educação básica: desenhar boas estratégias que enfrentem os problemas identificados, saber modificá-las se necessário, monitorar sua implantação, combinando com sabedoria continuidade e ruptura. Mais ainda, comunicar com frequência e consistência os resultados obtidos em cada etapa e os esforços que será necessário empreender.
A educação é um investimento de longo prazo e os projetos geram impactos cumulativos, e não imediatos. Mas, se não se contar à população em que estágio se está no enfrentamento dos problemas, fica uma sensação de que nada está sendo feito. A transformação demanda persistência estratégica e a população é capaz de entender isso.
Fonte: Jornal “O Estadao de S.Paulo” – 20/03/10
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