Há poucos dias encontrei um velho amigo que hoje dirige, com grande competência, uma empresa estatal e o perguntei: “E aí quando vai ser a privatização? Quero comprar ações da sua empresa.” “Privatização nunca! Vamos apenas fazer uma concessão” – respondeu.
Existe uma unha encravada nas mãos da esquerda. Eles sabem que é preciso usar plenamente a capacidade empresarial do mercado, mas temem trair seus sentimentos estudantis, contra os empresários que “só pensam nos lucros, na avidez dos capitalistas malditos, no domínio do capital sobre o trabalho sofrido”.
Infelizmente, para eles, felizmente, para o país, a prática está levando a providências, ainda que tímidas, no sentido da desoneração do governo de obrigações e investimentos que podem e devem ser feitos pela iniciativa privada.
Ao governo, responsável maior pelo futuro do Brasil, devem sobrar recursos para cuidar da educação, saúde, segurança, infraestrutura, funcionamento universal da Justiça, aplicação de subsídios e incentivos à inovação e alta tecnologia (com estímulos destinados aos resultados, e não a intermediários).
Ao poderoso governo cabe, ainda, facilitar e modernizar a estrutura do marco regulatório de diversas áreas da economia, oferecendo condições confiáveis aos investidores e adquirindo prestígio internacional como porto seguro de negócios. Rever a legislação tributária é inadiável, desde a identificação fácil do arcabouço dos impostos, até a facilitação do recolhimento, passando pela redução do milhar de taxas e alíquotas cobradas e, às vezes, mal gastas pelos municípios, estados e União. Tudo junto ajudaria muito à população a identificar os valores recolhidos e, o mais importante, os destinos dados a eles.
A legislação trabalhista, ainda calcada em modelo da primeira metade do século passado, não serve, nem ao trabalhador, nem à economia do país. A vergonhosa quantidade de trabalhadores não “protegida” pela famosa lei a descaracteriza como documento justo e cria uma situação absurda para o sistema de seguridade social, que, responsável por todos, só recebe da metade, assumindo enormes déficits, cobertos sempre pelo Tesouro Nacional. Uma legislação moderna e competitiva, que resguarde os direitos dos trabalhadores, redundará em mais empregos e abrangência.
No pequeno mundo transformado pela tecnologia das informações, a competição entre países chegou a seu nível mais dinâmico. O amor à pátria não impede uma fábrica francesa de fechar suas portas em Bordeaux e passar a produzir no Brasil. A decisão é econômica. Se produzir na China é o melhor caminho para a Embraer disputar esse enorme mercado, em nada o Brasil perderá. Ao contrário. Exportaremos serviços, componentes e qualidade administrativa.A ideologia da juventude precisa se voltar para objetivos mais modernos, exigindo o cumprimento das leis, fazendo com que esta arma da democracia funcione para todos, sem exceção. O capitalismo democrático é, apesar de seus males, a única forma de convivência para a humanidade sempre em busca do melhor para cada um. A falta de liberdades no capitalismo pode até parecer positiva, se olharmos para a China de hoje.
Mas até quando os chineses conviverão com a proibição de greves, com impedimento de manifestação do pensamento, com a restrição do número de filhos, com a limitação dos movimentos artísticos e culturais? A China rica e pobre de hoje está grávida da filha Liberdade. Veremos quando ela nascer.
Ao Brasil, cabe trilhar o caminho para o verdadeiro desenvolvimento calcado na educação, no crescer tecnológico, na produção de conhecimento, estas, sim, verdadeiras riquezas renováveis para o grande futuro que merecemos.
A ação do Estado deve ser restrita à criação de um ambiente livre para a multiplicação de negócios, não dando guarida aos empresários patrimonialistas que, não sabendo disputar o mercado, apelam para o nacionalismo balofo e sem caráter. Cabe ao Estado, com a arma sublime da lei, ajustar condutas, prevenir a burocracia autoritária e aproveitadora.
Do cidadão brasileiro, em busca do que é melhor para si e os seus, espera-se o compromisso de um país competitivo, criativo e digno para todos e maior do que qualquer viés ideológico, a não ser a liberdade.
Quanto ao meu amigo sei que ele está fazendo um ótimo trabalho numa empresa que ele encontrou destruída. E depois dele quem virá?
Fonte: O Globo, 11/08/2012
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