De Élcio Abdalla, João Carlos Alves Barata e Luís Raul Weber Abramo
A Universidade de São Paulo está sob ataque. Seu futuro como universidade de pesquisa e instituição acadêmica de ponta está ameaçado.
De um lado, claques de burocratas encastelados nos órgãos de poder universitário empurram uma agenda mediocrizante, que estrangula os esforços daqueles que sustentam a “marca USP”. De outro, alguns sindicatos e movimentos estudantis empenham-se em transformar a USP em um “escolão para as massas”, no qual o mérito acadêmico seria decapitado.
É nesse contexto que a sociedade concedeu algum interesse aos rituais uspianos de alternância de poder que culminam, dia 10 de novembro, com o segundo turno da eleição para reitor.
Mas, afinal, que modelo a sociedade paulista deseja ter na USP? Uma escolinha de terceiro grau ocupada por alunos e professores dedicados à lúmpen-política? Mais uma sonolenta repartição pública?
Entendemos que uma universidade de ponta, capaz de produzir soluções para os desafios científicos, tecnológicos e sociais do futuro e de multiplicar essas soluções por meio dos alunos egressos de seus cursos, é aquilo que se espera da USP.
Uma tal instituição só se constrói atraindo o que há de melhor na inteligência brasileira e formando os profissionais que liderarão a sociedade do futuro.
Foi assim que os países desenvolvidos chegaram ao sucesso social, econômico, científico e cultural. E só assim se justifica, para o contribuinte paulista, as cifras bilionárias que sustentam a USP.
Então é preciso questionar: estamos caminhando em direção a esse ideal de universidade? A resposta é que, ultimamente, não.
Nas universidades de classe mundial, compreende-se que uma instituição de ensino e pesquisa nunca será melhor do que os melhores pesquisadores que nela trabalham.
Essas instituições fazem o possível para atrair e estimular esses pesquisadores, além de oferecer aos alunos a possibilidade de conviver e aprender com esses indivíduos desde o ingresso na universidade.
Os reitores dessas universidades são escolhidos por meio de rigorosos processos de seleção (que nada têm em comum com as eleições), nos quais a liderança acadêmica e a penetração na sociedade são pré-requisitos indispensáveis.
Já na USP, nos últimos anos, o trabalho dos melhores docentes tem se desenvolvido à revelia e apesar das sucessivas administrações.
A lógica da administração acadêmica foi invertida, com burocratas cada vez mais aboletados nos órgãos centrais em busca de poder, benesses típicas do serviço público e, agora, até mesmo para aventuras políticas.
Por outro lado, na USP, o processo de escolha dos reitores é uma pseudoeleição, em que promessas de bastidores e acordos de poder definem o resultado do pleito.
É preciso inverter esse jogo ruinoso. Os pesquisadores da USP, apoiados pela sociedade que a financia, precisam corrigir os rumos de uma instituição que está à deriva e imprimir-lhe o perfil que dela se exige.
Em primeiro lugar, é preciso acabar com esse processo bizantino de eleição para reitor, que terminou por deformar todas as estruturas administrativas e acadêmicas.
O delírio da tal “democracia universitária”, muito popular entre grupelhos na vanguarda do atraso (dentro e fora da universidade), não funciona em lugar nenhum do mundo e deve ser rechaçado como a apropriação indébita de um bem público pelos seus usufrutuários.
Nas melhores universidades, públicas ou não, essa escolha é feita por um comitê de busca composto em sua maioria por membros externos à universidade, tipicamente expoentes das áreas acadêmicas e da sociedade civil, além de representantes dos financiadores daquelas instituições.
Também é preciso instituir mecanismos reais de controle de qualidade e produção dos docentes. Nenhuma universidade de primeira linha resiste a décadas de emprego vitalício garantido a qualquer um que passe num concurso público de ingresso.
A depuração, mesmo de uma parcela ínfima, dos docentes mais acomodados e ausentes, mais do que um aviso àqueles que flertam com o ócio improdutivo, seria um sinal positivo poderoso aos pesquisadores que de fato produzem.
A USP tem que iniciar imediatamente um processo de reforma e modernização, no qual prevaleçam os interesses da pesquisa e do ensino de qualidade. A alternativa é o inexorável sucateamento de um patrimônio público acumulado ao longo de décadas e o empobrecimento científico e cultural de nossa sociedade.
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