Para Carlos Kawall, diretor do Asa Bank e ex-secretário do Tesouro Nacional, o pacote de ajuda aos estados aprovado pela Câmara na segunda-feira é “muito falho”. O motivo: faltam contrapartidas à ajuda da União.
Em compensação, ele vê vantagens na proposta alternativa apresentada pela equipe econômica, que prevê R$ 77 bilhões entre repasse de recursos aos estados e suspensão de dívida.
Especialistas em finanças públicas apontam a tentativa da equipe econômica de fixar um limite para a ajuda financeira a estados e municípios como ponto central para reequilibrar o projeto aprovado no início da semana pela Câmara dos Deputados.
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A intenção do Ministério da Economia de aportar R$ 77 bilhões vai na direção correta?
O pacote do governo me parece muito mais bem desenhado que o aprovado na Câmara. Evita o cheque em branco quase ilimitado. Além disso, é um valor muito expressivo mesmo assim, mas com responsabilidade fiscal.
Como foi aprovada na Câmara, a ajuda federal compromete as contas públicas?
Sim. Antes da pandemia, o Congresso discutia uma ajuda pelo Plano Mansueto, que flexibiliza coisas como o acesso a crédito externo e as regras para a ajuda do Tesouro. Com a pandemia, ficou acordado entre governo e deputados que questões estruturais seriam deixadas de lado, e seria discutida uma ajuda focada no esforço contra o vírus. O projeto aprovado foi uma reviravolta. A ajuda vai muito além do Plano Mansueto. Acende o alerta máximo em relação às finanças públicas.
Por quê?
Pelo projeto aprovado, estados terão liberdade para, por exemplo, conceder benefícios fiscais ou postergar a cobrança de impostos das empresas a título de preservar empregos. Em seguida, poderão pedir compensação da União pela perda dessas receitas. O Tesouro terá pouca ingerência sobre o tamanho dessa conta. Além disso, o projeto como está usa arrecadação como critério para ajuda. Isso privilegiará estados maiores e mais ricos, como São Paulo e Rio.
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Como resolver essas falhas?
Falta um teto para a ajuda da União. Do jeito que está, a compensação pela queda de arrecadação pode superar os R$ 80 bilhões por semestre. A depender da duração da crise, a conta vai ficar muito cara. Faltam critérios para garantir recursos suficientes ao interior e à Região Amazônica. E, acima de tudo, ter contrapartidas claras para garantir destinação correta dos recursos.
O Brasil gasta o suficiente para combater o coronavírus?
A União já desembolsou perto de 2,5% do PIB. É um valor próximo à média desembolsada pelos países emergentes, de 3%. Com a medida aprovada anteontem, a ajuda vai superar em muito este patamar. É extremamente importante ter foco no uso dos recursos. Se deixar como está, abre-se o caminho para o inchaço da máquina pública, que nos levou à crise de 2014. Usar os recursos para despesas com funcionalismo é imoral nos tempos atuais.
Fonte: “O Globo”