Depois de um período complicado, no qual predominou o impasse nos diversos temas tratados, uma breve trégua se fez sentir nos últimos dias. Isto se refletiu no comportamento dos ativos, com o dólar recuando um pouco e se acomodando entre R$ 3,70 e R$ 3,80, a bolsa de valores, ainda meio “congestionada”, meio de lado, mais próxima a 48 mil pontos, e o risco país a 390 pontos, depois de chegar a 420 pontos em alguns momentos do passado recente.
Trégua temporária– Levy parece ter ganho mais tempo para levar adiante seu ajuste fiscal, “prestigiado pela presidente até segunda ordem”, a “pauta-bomba” foi “esvaziada”, com vários vetos passando em plenário, algumas decisões de política fiscal avançaram, e o próprio candidato à presidência, Lula da Silva, deu uma recuada nas pressões contrárias ao ministro da Fazenda, afirmando que “este era um problema da presidente”. A meta de 2015 e o Orçamento de 2016 passaram pelas comissões e devem ser votados, em conjunto, nesta semana e, aliviando um pouco a crise política, Eduardo Cunha, pressionado pela Comissão de Ética, afirmou que qualquer decisão sobre impeachment seria adiada para 2016. Ou seja, depois de muitas semanas em permanente suspense, voltamos a respirar um pouco (só não sabemos por quanto tempo).
Sobre os vetos– Nas votações da semana passada, dois chamaram atenção. Um foi o reajuste nos salários do Judiciário, definido em 78% para os próximos quatro anos, o que poderia gerar um impacto fiscal de R$ 36 bilhões. Acabou mantido o veto, com aperto no placar, 251 presentes na votação, quando seriam necessários 257 para haver quórum (isto sinaliza haver uma fragilidade na base de apoio do governo Dilma no Congresso). Outro veto tratou da vinculação do salário mínimo aos benefícios dos aposentados, gerando um rombo de R$ 11,1 bilhões para os cofres públicos. Juntos somariam um aumento de despesas de R$ 47,2 bilhões. Sobre isto, sabe-se, aliás, que o regime previdenciário é um dos que vem sendo objeto de intensos debates, inclusive colocado como prioridade de reforma para o ministro Levy. Acha ele que sem uma reforma ampla deste regime, a dívida previdenciária, hoje em torno de R$ 90 bilhões, explodirá a mais de R$ 200 bilhões até 2020.
Sobre a meta fiscal deste ano e o Orçamento de 2016– Na meta, o ministro Levy achou por bem incluir as “pedaladas fiscais”, totalizando R$ 57 bilhões, o que elevou o déficit primário a R$ 119,9 bilhões ao fim deste ano (2,08% do PIB). Foi melhor assim, visto que caso o governo enviasse uma meta pouco factível de ser cumprida, acabaria, mais uma vez, envolvido na Lei de Responsabilidade Fiscal. Isto abriria espaço para mais um caso de “crime de responsabilidade” para a presidente Dilma, colocando-a na mira de um impeachment. Soma-se a isto, no Orçamento para 2016, na perseguição do superávit de 0,7% do PIB, o ministro acabou retirando o abatimento dos investimentos do PAC, dando a esta peça maior transparência e clareza. Outro ponto importante foi a inclusão da CPMF.
Próximo desafio fiscal– Este, aliás, deverá ser o próximo “cavalo de batalha” do ministro Levy. Num esforço concentrado tentará colocar na pauta do Congresso, ainda neste ano, a CPMF, com alíquota de 0,2%. Seu objetivo é garantir a arrecadação extra de R$ 32 bilhões no ano que vem e o resultado primário de 0,7% prometido no Orçamento. Para isto, entram nas negociações também os governos regionais, que demandam uma transferência de parte desta receita para permitir o avanço da reforma do ICMS, num primeiro momento, impactando na arrecadação destes “entes federativos”.
Já se comenta, inclusive, a possibilidade destes governantes exigirem a elevação da alíquota da CPMF a 0,38%, tal qual no passado, permitindo 0,18 ponto percentual a ser repartido entre ambos. Têm-se aqui os governos regionais brigando por partilhas da CPMF, lembrando que a presidente havia prometido direcionar parte destes recursos para as áreas de saúde e educação.
E as reformas?– Observamos, no entanto, que todo este evoluir do ajuste fiscal não contempla medidas mais estruturantes, voltadas ao longo prazo. Boa parte do que foi amarrado até aqui diz respeito ao que Levy chama de “ponte fiscal”. Ou seja, uma melhoria fiscal que permitiria o desanuviamento do ambiente de negócios, com a confiança retornando, assim como a retomada das atividades, as transações se intensificando, aumentando a geração de empregos e novos investimentos.
Neste contexto, o ajuste fiscal evoluindo reduziria as pressões sobre a política monetária, abrindo espaço para o juro ser reduzido ao longo de 2016, assim como a inflação cedendo e o consumo retomando. Esta, aliás, era a estratégia da equipe econômica no início de 2015. Dar uma avançada na área fiscal, sanear as contas, limpar as barbeiragens (pedaladas), para desanuviar o ambiente de crise, reduzindo a volatilidade nos mercados de ativos, assim como estabilizando a taxa de câmbio e, por fim, a inflação.
Superada esta fase, seriam recolocadas em pauta a agenda de reformas estruturais, começando pela da Previdência, passando pela Tributária, pela Trabalhista, pela reforma do Estado, só para ficarmos nas mais urgentes. Até tivemos algumas discussões recentes, como a readequação de alguns direitos trabalhistas e previdenciários, o fim do “fator previdenciário”, a criação do “vetor 85/95”, etc. No front tributário, lembraríamos da reforma do ICMS, em debate, mas parada pelo impasse na compensação aos governos regionais. Todas estas medidas, todos estes movimentos até aqui, no entanto, ainda são insuficientes. Muito ainda precisa ser feito. Poderíamos lembrar do fim da aposentadoria “por tempo de contribuição”, da definição de idade mínima para aposentar, na tributária da necessidade de maior simplificação na malha e na retirada de impostos que afetam a produtividade da economia.
Concluindo, poderíamos resgatar Joaquim Levy, num dos seus embates contra a desconfiança de alguns quadros do PT e outros mais afoitos, dos seus ajustes: ”a segurança fiscal, que diminui os temores das pessoas e dá visibilidade ao futuro, é a base das outras ações para o desenvolvimento”. Por estes dias, Levy, quando indagado se continuaria ou não no governo disse “vamos navegando”. Até quando não se sabe.
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