Guro Nygaard, norueguesa formada em letras, resolveu morar no Brasil aos 26 anos. Sem conseguir achar um emprego ideal, decidiu empreender. Montou a padaria Bakeri Nord. Localizado na Santa Cecília, região central de São Paulo, o espaço modesto vende doces típicos do país nórdico. Nativa digital, Guro já possuía contas pessoais no Facebook e no Instagram – e decidiu fazer o mesmo para sua pequena padaria. “O movimento mal foi planejado”, conta.
No Facebook, divulgou o trabalho em grupos de moradores do bairro e diz que usa o Instagram e o WhatsApp para receber encomendas. Mas admite que não consegue gerir tudo sozinha: “É melhor ter mais bolos de chocolate do que fazer postagens.”
O dilema de Guro é o mesmo de outras tantas pequenas e médias empresas no Brasil. Mais de 70% dos pequenos negócios possuem alguma estratégia de marketing digital, aponta a pesquisa “Transformação Digital nas MPE”, a última realizada pelo Sebrae, em 2018. Mas ainda faltam recursos para explorar as tantas possibilidades. Apenas 43% expõem seus produtos, 27% possuem um site e 23% fazem vendas dos seus produtos de forma online.
“O pequeno empreendedor vai ter uma dificuldade maior do que uma empresa varejista, porque tem tamanho reduzido. Geralmente é o dono e mais ninguém. Ele é a própria equipe”, avalia Rodrigo Bandeira, vice-presidente da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm).
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Mesmo com as dificuldades, a projeção dentro do setor é positiva. Antes da pandemia causada pelo novo coronavírus, a ABComm já previa que o comércio eletrônico deve movimentar R$ 106 bilhões neste ano e de que haverá mais de 135 mil lojas virtuais no País até o fim do ano – projeções mantidas até agora.
Com a pandemia, a ABComm, em pesquisa com a Konduto, especializada em prevenção à fraude no e-commerce, notou uma queda de 19,24% nas vendas na segunda quinzena de março em relação à primeira (antes do isolamento social). Por outro lado, o ticket médio cresceu 5,44%, segundo análise de mais de 20 milhões de pedidos em 4 mil lojas virtuais.
Os dados mostram a versatilidade no espaço digital – e o isolamento social por conta da pandemia tem impulsionado ainda mais os negócios online. Presença e atividade nas redes sociais, posicionamento de busca no Google ou inserção em marketplaces podem ser formas de tornar a sua empresa – física ou virtual – presente na internet.
“Com uma loja virtual, você está aberto para atender qualquer público e qualquer cliente do mundo inteiro”, avalia Rodrigo, da ABComm. “As pessoas podem visitar sua página às 3h, 4h da manhã, por exemplo.”
COMO SE TORNAR VISÍVEL?
“A empresa não pode estar fora do espaço digital”, analisa Farah Braga, professora de marketing digital do Insper, que vê um receio muito comum a ser vencido pelos pequenos e médios negócios: “Alguns obstáculos que as pequenas empresas podem enfrentar são a falta de conhecimento dessas ferramentas ou o mito de que marketing digital é para grandes empresas”.
A digitalização aumenta em média 20% o faturamento das MPEs – mostra estudo do Instituto Locomotiva em parceria com o Ibmec, realizado em fevereiro de 2018. “Uma das estratégias que recomendo para pequenas e médias empresas é a utilização de automação de inbound marketing”.
As principais ferramentas na internet usadas por empresas de pequeno e médio porte são Facebook, Instagram e Whatsapp – cada qual com sua particularidade. Somadas as três plataformas, são 306 milhões de usuários apenas no Brasil.
No Instagram, já são 25 milhões de perfis comerciais em todo o mundo, que produzem um terço do total de stories. E 80% dos usuários de Instagram no mundo seguem pelo menos uma empresa.
Foi no Instagram que a Il Casalingo viu seu próprio crescimento. “Dá para ver um refinamento das imagens ao longo do tempo”, conta a designer Joana Naracci, de 34 anos, uma das fundadoras da loja.
Ao lado de sua amiga de infância Larissa Saraval, Joana montou em 2012 uma empresa para comercializar aventais, uma de suas especialidades de produção. Logo, o negócio acabou por comercializar materiais de decoração para toda a casa. A empresa hoje faz suas vendas em seu próprio site, mas produz newsletters, compartilha receitas, histórias de viagens e produz imagens no Instagram.
O negócio nasceu na internet e havia programado sua primeira loja física em São Paulo para este mês de abril – planos temporariamente adiados por conta da pandemia do coronavírus. “A gente nunca esteve tão seguro de dar esse passo de abrir loja física”, conta Joana, segundo quem as obras estão paradas há mais de um mês, mas as vendas online cresceram com a quarentena.
Após a entrada no Instagram, Joana viu que a rede social trouxe um padrão de qualidade para a empresa. “Precisávamos tornar nossos produtos ‘instagramáveis’. A foto é a nossa chance de mostrar que não é só um pano de prato.”
DE OLHO NO ALGORITMO E EM TÉCNICAS DE SEO
Na visão de Ariadne Mecate, consultora do Sebrae, é preciso saber do que falar e como fazer o anúncio porque não é todo conteúdo que vai ser exibido na timeline do seguidor. “O algoritmo está cada vez mais seletivo”, diz. Hoje, há como definir o público a ser atingido por uma publicidade paga. Lugar onde vive, faixa etária e alguns outros critérios podem ser definidos para impulsionar uma publicação online.
É preciso adaptar-se ao algoritmo – que pode fazer o “boca a boca” pela empresa, se manipulado em seu favor. “Se o seu conteúdo ficar entre as três primeiras páginas no Google, isso gera um monte de cliques, de pessoas que estão interessadas no seu produto”, avalia Denis Strum, diretor de marketing digital da Synapcom, empresa voltada para soluções em e-commerce. Para ele, isso deve se tornar uma atitude levada como uma regra para as pequenas e médias empresas.
É fundamental saber as lacunas do caminho. Conhecer outras ferramentas do Google, como o Google Meu Negócio e o Trends também são fundamentais para empresas que buscam crescer no ambiente digital. E ter conhecimento de SEO (Search Engine Optimization, ou otimização dos motores de busca) é importante.
Investir em palavras-chave comuns para descrever o que uma empresa oferece pode ser importante para ajudar um negócio a se tornar visível – e, por isso, é importante pensar em conteúdos alternativos.
Um blog que produza conteúdo vinculado à área da empresa pode ser um caminho. Além de gerar conteúdo relevante para a página, materiais menos focados em vendas colaboram a criar uma linha de pensamento que ajuda a mostrar valor na loja.
Pensar em termos mais específicos pode ser outro caminho. “Em vez de apostar em palavras-chave pensadas para vender notebook, que é algo muito procurado, pode ser pensado o uso de palavras-chave voltadas para ‘como comprar um notebook em Barueri’, por exemplo”, sugere Renan Mota, fundador da Corebiz, outra empresa que fornece soluções em e-commerce.
Para redes sociais, a dica mais geral é sempre interagir com o usuário. O Facebook, em resposta à reportagem por e-mail, pontua que “o cliente que manda mensagem quer uma resposta rápida e a falta dela pode passar a sensação de abandono”.
De acordo com a plataforma, os empreendedores devem priorizar conteúdos que mostram o dia a dia do seu negócio para que os usuários possam conhecer mais sobre a empresa. Este conteúdo pode ser feito por meio de posts, stories e vídeo, para que o conteúdo possa gerar conversa – o boca a boca digital.
“Não adianta ir para a internet e utilizar esses canais como propaganda e serviços. Ir para a internet quer dizer que você abre canais para o seu cliente poder conversar”, diz Ariadne Mecate, consultora do Sebrae-SP.
MAS E QUANTO INVESTIR?
“Fato é que há como fazer marketing digital de graça. Mas, se você quer ganhar resultado, vai ter que investir”, aponta Farah Braga, professora do Insper. “Qualquer pessoa ou empresa de qualquer porte pode ter sua página numa rede social, ou construir um blog. Veja bem, não é de graça, mas é financeiramente viável”, conclui.
Existem empresas voltadas a automatizar o marketing digital de empresas de pequeno e médio portes que cobram mensalidade de R$ 60. Não há um número mágico de quanto destinar para o marketing, mas as empresas costumam enviar entre 3% e 5% de seu faturamento para o setor.
“Tem que definir investimento que faça sentido para o serviço que ele pretende vender. Cada negócio vai demandar um tipo de estratégia”, diz Marcos Facó, diretor de Comunicação e Marketing da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Para quem pensa em vender mais do que anunciar, marketplaces são boas escolhas. Magazine Luiza, Mercado Livre, B2W e Netshoes estão entre as opções (confira nossa lista de 61 marketplaces onde anunciar). O custo dentro de um marketplace só se aplica quando a venda é efetivada, uma vantagem estratégica.
“Isso é muito bacana porque provavelmente o empreendedor gastaria em marketing digital em outras frentes”, indica Renan Mota, do Corebiz.
E se apenas 27% das plataformas possuem um site, a Il Casalingo mostra que investir na plataforma pode ser uma boa solução. Quando a empresa trocou para um site mais eficiente e com uma melhor proposta estética, de acordo com Joana, fundadora da empresa, os custos aumentaram de forma significativa, mas os resultados foram dobrados.
CURSOS E AJUDA DE INFLUENCIADORES DIGITAIS
A Bakeri Nord, de Guro Nygaard, tem pouco mais de 2 mil seguidores no Instagram. Ela vê que o crescimento da sua empresa começa a exigir um aumento do pessoal e gostaria de ter alguém na gestão das redes sociais. Ainda assim, prefere tomar as rédeas. “Acho importante o dono participar dessa parte negócio, não deixar de lado”, afirma.
Para Ariadne Mecate, do Sebrae, “não dá para deixar função nas mãos de terceiros sem saber de nada”. Joana Naracci, da Il Casalingo, diz ter encontrado as plataformas ideais para atrair seus clientes e manter o negócio sustentável. Ela conta que estudou e fez cursos presenciais e online – um deles, com influenciador digital.
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Parcerias com influenciadores, aliás, podem ser uma boa estratégia para empresas gerarem engajamento orgânico, o famoso boca a boca digital. Por isso, empresas querem também aprender com eles.
Lena Mattar, que hoje é também influenciadora, decidiu profissionalizar seu Instagram pessoal e começou a produzir conteúdo voltado para a gastronomia. Fez newsletter, começou a compor as imagens do perfil com um fotógrafo profissional e compartilha receitas no perfil. O número de seguidores, segundo ela, duplicou. Hoje, são quase 20 mil seguidores.
Agora, ela planeja montar um curso para ensinar empresas sobre como usar a rede social de uma forma mais eficaz, como ter um melhor planejamento de imagem. A ideia surgiu depois de Lena perceber a grande procura de empreendedores para saber como chegar até o cliente por meio de redes sociais e mantê-lo fiel à marca.
Especialista em marketing digital, Livia Bravin também oferece cursos para empresas. Ela trocou a assessoria de imprensa pela área e começou o seu curso em dezembro do ano passado, no Rio de Janeiro. Ela também faz pequenos tutoriais em seu Instagram sobre como usar ferramentas para aperfeiçoar a produção de conteúdo para as redes sociais.
Cursos online também podem ser uma boa opção. Apenas 27% dos donos de pequenas e médias empresas fizeram cursos online, segundo pesquisa do Sebrae.
O Facebook oferece o serviço Facebook Business, que tem cursos gratuitos disponíveis para empresários entenderem melhor os fundamentos do marketing digital, além do Impulsione com o Facebook, em parceria com o Sebrae, com cursos presenciais para ensinar como se pode usar os serviços de WhatsApp, Facebook e Instagram de uma melhor forma para os negócios.
É preciso, além de conhecer, sempre se atualizar, frisam os especialistas. “O mercado digital está em constante modificação”, pondera Marcos Facó, da FGV. “Aquele que se diz expert no tema só é especialista naquele momento, porque logo tudo mudará de novo.”
Fonte: “Estadão”