As mudanças ocorridas na Venezuela, passando de um Estado Democrático de Direito para um Estado autoritário e centralizado, sem divisão de Poderes e sem garantias dos direitos fundamentais, iniciaram-se com a formação da nova Constituição. Em 1999, a Assembleia Nacional Constituinte foi muito além da tarefa original de elaborar a nova Constituição e submetê-la à consulta popular. Deu-se início à modificação da estrutura de Poderes no país, facilitando a edição pelo Executivo de uma série de medidas eleitorais e de alteração do sistema judicial, entre outras áreas, favoráveis a um governo em processo de modificação e controle dos Poderes.
Esse processo se desenrolou até 2002, quando ainda foi implantada uma série medidas que aprofundaram a intervenção e a tentativa de controle da economia pelo governo, até chegar, por meio de movimentos eleitorais, à situação atual, que dá a Hugo Chávez o controle parlamentar.
Por volta de 2005, o governo passou a produzir leis e decretos sem nenhuma limitação, seja pelo Judiciário, seja pelo Legislativo. Em 2008, o Executivo venezuelano implementou reformas que haviam sido rechaçadas pela maioria dos eleitores em consulta popular de 2007, e propôs reforma geral da Constituição, passando o país de um Estado Democrático de Direito a um Estado socialista, com todas as consequências econômicas, sociais e políticas que isso implica. No entanto, o conteúdo dessa reforma, relacionado a aspectos econômicos, Forças Armadas e organização da administração pública, entre outros, foi aplicado via decretos-leis e hoje se encontra totalmente implementado.
Atualmente, um projeto de lei sobre a propriedade privada está na fila para ser aprovada no Congresso venezuelano. Porém as expropriações já ocorrem na prática, como a estatização do Hotel Hilton na Ilha Margarita, realizada agora em outubro. Esses fatos vêm ocorrendo desde de 2005, via aplicação de uma série de mecanismos que contornam os procedimentos legais e constitucionais, realizando-se expropriações por decreto e sem garantir o direito básico do proprietário de receber um preço justo, após a avaliação de um perito independente, que levaria em conta o valor de mercado da propriedade. Em 2007 e 2008, o governo Chávez sancionou na Assembleia Nacional lei especial voltada para a questão envolvendo as empresas siderúrgicas da região de Guayana, de cimento, as que trabalhavam com petróleo da Venezuela e postos de gasolina, que modificou os procedimentos de proteção e permitiu a expropriação por decreto, sem garantir pagamento posterior.
No caso do setor agrário, o governo simplesmente assumiu que propriedades rurais nunca pertenceram a seus titulares e, portanto, são terras públicas. Passou, então, a realizar “resgates administrativos” de terras agrícolas, apesar de seus proprietários terem documentos públicos registrados, e a exigir provas de sucessão de posse desde 1848, algo impossível de ser realizado. Como resultado, mais de 2,5 milhões de hectares de propriedades rurais foram tomados pelo governo. Encontram-se em tramitação na Assembleia Nacional vários projetos de lei, como o de Propriedade Social ou o de Ordenação de Territórios, que facilitarão a eliminação da propriedade privada sobre os meios de produção, com a desculpa de “democratizar” as empresas públicas.
Assim, ficará mais difícil para empresas estrangeiras estabelecerem negócios nesse cenário. O sistema político da Venezuela mudou e é distinto do que foi previsto na Constituição, em que há regras econômicas estabelecidas, além de garantias efetivas dos valores democráticos. O socialismo da Venezuela é dirigido a implantar paulatinamente um sistema denominado Propriedade Social, que não é uma invenção de Hugo Chávez. Está estabelecido nas Constituições chinesa e cubana. Essa denominação traz o significado de apropriação dos meios de produção, que é totalmente distinto do que foi estabelecido na Constituição venezuelana.
Chávez diz que o socialismo da Venezuela dará mais importância aos direitos sociais do que aos econômicos, mas não é assim. Em seus planos para a nação, alega que é preciso substituir a estrutura burguesa da Constituição, está propondo o fim da divisão dos Poderes, das diferenças na distribuição do trabalho, num modelo que reproduz as normas previstas pela Constituição de Cuba. Com uma diferença: Cuba é socialista e tem um partido único estruturado pela Constituição. O comportamento político daquele país, porém, coincide com o seu texto. Para um investidor interessado em Cuba haverá regras claras, cabendo a ele gostar delas ou não. Hoje, quem pretende investir na Venezuela pensará estar operando numa democracia, o que, na verdade, não é.
Além disso, um governo democrático deveria oferecer segurança jurídica a toda empresa que queira investir e fazer negócios no país, o que as leis em tramitação na Assembleia Nacional venezuelana tratarão de eliminar definitivamente. Como consequência, a empresa que enfrentar problemas com seus negócios na Venezuela só conseguirá solucioná-lo por vias políticas, e não mais pelo natural caminho jurídico. Já há diversos casos comprovando que a falta de proximidade política com o governo gera um risco muito grande para os investimentos a serem capturados. Não há, portanto, regras claras, enquanto a instabilidade reina no jogo econômico. Um ambiente nada motivador para qualquer empreendedor.
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