Os pesquisadores do Fundo Monetário Internacional (FMI) andaram ocupados nos últimos tempos: em apenas uma semana publicaram três bons estudos sobre as perspectivas e riscos da economia mundial. Juntos, eles dão a visão do Fundo sobre o médio prazo da economia mundial.
O FMI reviu para baixo sua projeção de crescimento para este ano (3,4%), em função principalmente dos resultados ruins para o PIB americano no primeiro trimestre e de uma reação mais lenta do que esperava do investimento global. Mas manteve sua projeção de alta do crescimento em 2015 (4%). Como a instituição vem sistematicamente pecando por um excesso de otimismo – e as suas previsões para o Brasil parecem confirmar isso – vamos torcer, mas com um pé atrás.
O Fundo aposta que nos próximos anos o mundo crescerá mais, por conta do melhor desempenho das economias avançadas. Assim, comparando os períodos pré-crise (2002-07), de crise (2008-13) e pós-crise (2014-19), a contribuição dos países ricos para a expansão da economia mundial seria de 1,6; 0,3 e 1,1 pontos percentuais, respectivamente; com crescimento de 2,6%, 0,7% e 2,3%, em cada período. Para as economias emergentes, essas contribuições seriam de 2,9, 2,6 e 2,8 pp. A estabilidade da contribuição dos emergentes é, porém, enganadora: ela se dá com essas economias crescendo menos (7,2%, 5,4% e 5,3%), ainda que respondendo por maior parcela do PIB mundial.
É esse cenário que sustenta as análises de risco do FMI. Com a retomada do crescimento nas economias avançadas, o Fundo prevê que os juros longos vão subir, levando à reprecificação de ativos. Além disso, vê uma desaceleração sincronizada e prolongada do crescimento dos emergentes, afetando tanto a América Latina quanto Ásia e Europa emergentes.
Para o Fundo, a desaceleração dos emergentes terá significativos impactos sobre o crescimento e o comércio mundiais, o que reduzirá o preço de commodities, mais sensíveis ao que acontece nos emergentes do que nos países ricos. Essa perda de dinamismo reflete em parte a desmontagem das políticas expansionistas adotadas no auge da crise, envolvendo especialmente a expansão do crédito, como bem ilustra o caso da China. Mas para o FMI essa desaceleração é majoritariamente estrutural. O Fundo não explica, porém, porque isso acontece, limitando-se a afirmar que medições do potencial de crescimento são pouco confiáveis.
Os efeitos da normalização monetária serão ampliados pelas recentes quedas da volatilidade implícita nas taxas de câmbio e juros, assim como pelos níveis extremamente baixos dos prêmios de risco de crédito e de duração (duration). O Fundo enfatiza o nível historicamente baixo do prêmio embutido na curva a termo como um fator que torna as condições iniciais do processo de normalização monetária especialmente perigosas. E observa que os ajustes no mercado financeiro vão levar a problemas de liquidez que vão ampliar a volatilidade do preço de ativos.
A desaceleração prolongada nos emergentes e a reprecificação de ativos cria um risco adicional para o sistema financeiro, vindo da exposição dos bancos – e investidores – dos países ricos às economias emergentes, que mais do que dobrou nos últimos oito anos.
Os emergentes serão inevitavelmente afetados pela recuperação do crescimento nas economias avançadas. O tamanho desse efeito dependerá de dois fatores. De um lado, do peso relativo das relações comerciais e financeiras com essas economias. Países em que o vínculo é predominantemente comercial tendem a ganhar. Aqueles com ligações principalmente financeiras, vão perder. De outro lado, de quão sólidas são a situação e as políticas econômicas de cada país. Países mais vulneráveis sofrerão mais com essa transição.
A vulnerabilidade dos países é aferida pela sensibilidade do seu crescimento a um cenário que combine os fatores de risco acima. A questão central é que países que já têm inflação alta, contas públicas frágeis e elevados déficits em conta corrente têm menos flexibilidade para ajustar sua política econômica em reação à mudança no quadro externo. Por exemplo, um país com inflação alta tem mais dificuldade de deixar o câmbio depreciar.
O FMI faz uma detalhada avaliação da situação das principais economias em termos de seu saldo em conta corrente. Um dos fatores que levaram à crise foi o forte desequilíbrio em conta corrente entre países poupadores e aqueles que gastavam mais do que produziam. Esse desequilíbrio foi fortemente reduzido. Porém, alguns países tiveram uma alta preocupante do seu déficit externo. A política fiscal aparece como o principal fator explicando tanto o ajuste como o desajuste externo de diferentes países.
O Brasil está entre os países vulneráveis. Quer se goste ou não, é isso que mostram os números (ver www.bit.ly/1qseUKP). Baixa poupança e políticas econômicas erradas são as principais causas da nossa vulnerabilidade. O FMI alerta que não deveríamos procrastinar em adotar medidas corretivas.
Fonte: Valor Econômico, 02/04/2014.
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