Segundo declarações da presidente e de seu bravo ministro da Fazenda não há motivos para preocupação com a queda do PIB (-0,6%) no segundo trimestre do ano: seria um fenômeno “momentâneo”, resultado de seca, preços de commodities em queda, feriados associados à Copa do Mundo, fraqueza da economia global e, claro, também do estado do gramado, pesado, sem sal e pouco afeito à prática do esporte bretão. E se o juiz ainda desse aquele pênalti quando o jogo estava 0x0…
Pode ser que minha definição de “momentâneo” esteja algo defasada, mas, consultando os dados, notei que em três dos quatro últimos trimestres a economia cresceu como rabo de cavalo. Foi apenas no último trimestre do ano passado que registramos expansão do produto, 0,5% (naquele momento a estimativa era um pouco maior, 0,7%), suficiente à época para o ministro da Fazenda soltar rojões e prever crescimento neste ano superior aos 2,3% observados em 2013. Como de hábito, errou. E agora se mete a prever as chuvas…
Caminhamos para crescimento baixíssimo neste ano, provavelmente inferior a 0,5%, e isto se a economia crescer a um ritmo positivo, ainda que moderado, no segundo semestre. Com isto, a presidente registraria expansão do PIB ao redor de 1,6% ao ano durante seu mandato, o pior desempenho entre todos os presidentes desde a estabilização da economia em 1994.
Se esta é uma questão “momentânea”, nem quero saber o que poderia ocorrer caso um problema mais persistente viesse a se materializar.
Baseado nesta nova definição, deve também ser “momentâneo” o colapso do investimento, que caiu em cada um dos últimos quatro trimestres, acumulando retração pouco superior a 11% no período.
A presidente herdou uma taxa de investimento na casa de 19,5% do PIB em 2010, ainda abaixo da necessária para crescimento mais veloz, é verdade, mas agora o investimento caiu para apenas 17,7% do PIB, o menor desde 2007, sugerindo que nossa capacidade de expansão sustentada seria ainda inferior à de quatro anos atrás.
Não há dúvida: o péssimo desempenho é devido à alteração do padrão de política econômica, que começou de forma tímida nos anos finais do segundo mandato do presidente Lula, mas que foi aprofundado inequivocamente na atual administração. Não faltaram fanfarras quando o governo adotou a chamada (e agora convenientemente escondida) “nova matriz macroeconômica”, em contrapartida às políticas ditas “neoliberais”.
Não se trata apenas do repúdio ao tripé macroeconômico. Sim, as metas fiscais viraram uma peça de ficção (nada) científica, a inflação nunca ficou na meta (sempre namorando seu limite superior) e o câmbio passou a ser administrado, mas, ainda que os resultados disto tenham sido lamentáveis, a verdade é que a deterioração se estendeu muito além da questão macro.
Testemunhamos o retorno do intervencionismo econômico, expresso na escolha de “campeões nacionais” propelidos por abundante crédito público. Voltaram controles de preços, seguidos, é claro, por subsídios e empréstimos para mitigar os efeitos sobre setores prejudicados. O governo se engajou na batalha inglória de tentar estimular o investimento na infraestrutura ao mesmo tempo em que tabelava preços e retornos, desconhecendo a dinâmica básica das economias capitalistas.
Ganhos modestos em termos de abertura comercial foram revertidos, à medida que setores demandaram (e obtiveram) proteção contra a concorrência externa. Com isso, o crescimento da produtividade caiu de forma dramática, com efeitos visíveis no nosso desempenho recente.
Tempos atrás se dizia que “subdesenvolvimento não se improvisa”. Também não improvisamos a impressionante deterioração do crescimento econômico: trata-se de fruto quase que deliberado das políticas postas em prática nos últimos anos, a despeito dos alertas de vários economistas.
Parecia impossível, mas agora sentimos saudades do pibículo. Parabéns aos responsáveis.
Fonte: Folha de São Paulo, 3/09/2014
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