Não adianta mais enganar as pessoas. A mentira governa a República
Após duas décadas de autoritarismo, a geração de 88 pensou que o advento de uma Constituição democrática seria capaz de recompor a liberdade individual com uma consciência cívica de transformação social. A questão é que as palavras só ganham sentidos com a exata compreensão dos seus significados. Ou seja, quando a cultura cede à ignorância, as palavras — inclusive as da lei — não passam de abstratos nacos de tinta sobre o papel.
Veja-se, então, que, em seu artigo inaugural, a Constituição estabeleceu a “livre iniciativa” como um fundamento republicano; todavia, estamos a viver um estatismo esganador que faz do empreendedor um refém da burocracia insana. Adiante, no artigo 3º, dentre os objetivos constitucionais fundamentais, foi estabelecida a construção de uma “sociedade livre, justa e solidária”; no entanto, vivemos como presos em nossas gradeadas residências, apavorados com uma atmosfera violenta e injusta, pautada por egoísmos desencontrados. E, lá no artigo 37 da CF, a “moralidade” foi estabelecida como um princípio da administração pública, quando o país fica de joelhos perante a corrupção descontrolada.
Como se vê, a Constituição prometeu muito, mas entregou pouco. Muitos dos direitos constitucionalmente previstos não passam de ilusões perdidas. Objetivamente, a lei é incapaz de mudar a realidade quando despida de preceitos de verdade. Logo, não adianta mais enganar as pessoas. A mentira governa a República. Dessa forma, ou mudamos verticalmente a substância e a qualidade do debate público ou veremos o Brasil afundar num mar de pobreza, calotes governamentais e descrença na democracia.
Temos um problema nuclear a resolver: o Estado deve caber nas suas receitas. Se não encontrarmos a solução, os salários, aposentadorias e demais deveres estatais não serão pagos nem cumpridos. Chega de ilusões; palavras não pagam dívidas. Não há direito adquirido à falta de recursos públicos. A sociedade aceita sacrifícios, mas não tolera mais ser enganada por gente desonesta. É preciso, portanto, a integridade de falar a verdade, a firmeza de tomar decisões e a fibra intemerata do espírito público superior. Falo isso porque temos. Ou será que somos aquém do que já fomos?
Fonte: “Zero Hora”, 09/08/2017
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