O Brasil está envelhecendo e as regras da previdência se tornaram insustentáveis. Teremos de trabalhar mais ou a renda na aposentadoria estará comprometida. O Brasil está bastante atrasado na agenda de reforma da Previdência, que vem sendo perseguida por muitos países nas últimas décadas.
Não há reforma perfeita. Porém, a sociedade como um todo será ganhadora. A alternativa é a falência do sistema, com graves consequências sobre a inflação e as políticas públicas, que morreriam de inanição.
Demandas por ajustes na proposta do governo são legítimas. Não se pode perder de vista, no entanto, alguns princípios a serem atendidos.
Primeiro, é necessário estabilizar, em um horizonte não muito distante, o gasto da previdência como proporção do PIB, atualmente em 8% na esfera federal; cifra hoje comparável a países com população mais velha e que dobrará nas próximas décadas.
Segundo, é necessário eliminar distorções distributivas das regras atuais. A previdência dá tratamento especial para grupos que deveriam ter tratamento igual.
Terceiro, a previdência deveria ser uma fonte de recursos perene que acompanhe a mudança de padrão de consumo na velhice. É natural que o valor da aposentadoria seja sensivelmente inferior à renda do trabalho, pois os gastos do aposentado tendem a ser menores do que o da pessoa na ativa. Se o indivíduo quiser manter a renda, deverá poupar mais por meio de outros instrumentos. Os gastos com saúde mais elevados na velhice deveriam ser foco de políticas de saúde pública, e não da previdência.
A proposta de reforma da previdência tem muitos méritos, pois consegue avançar nesses princípios.
A regra de transição de 15/20 anos proposta pode parecer dura, mas não chega a ser ambiciosa do ponto de vista técnico à luz do fim do bônus demográfico. A expectativa é que as despesas previdenciárias se estabilizem como proporção do PIB apenas em 20 anos. Até lá, a regra do teto (estabelece que gastos públicos não podem crescer mais que a inflação) disciplinará os gastos públicos federais e estimulará a eliminação de políticas públicas ineficientes e injustas.
Há avanços na remoção de distorções distributivas, pela eliminação de aposentadorias precoces e de acúmulo de benefícios e redução de regimes especiais, regras que beneficiam os mais ricos. Os mais pobres serão preservados, pois continuarão recebendo o salário mínimo e se aposentando por idade (35% dos beneficiários).
Igualar a idade de aposentadoria de homens e mulheres é importante iniciativa, em função da maior expectativa de vida das mulheres (em 2013, a sobrevida das mulheres com 65 anos era de 20 anos, contra 16 dos homens).
Outro avanço será reduzir a taxa de reposição (razão entre benefício previdenciário e renda na ativa) dos mais ricos. Os mais pobres, que ganham salário mínimo, manterão taxa de 100%. No grupo mais rico, que aposenta por tempo de contribuição (19% dos beneficiários), quem trabalha menos, receberá menos. Pela proposta, uma pessoa com 25 anos de contribuição teria taxa de reposição de 76%. Nada que destoe da experiência mundial.
Há quem defenda um tempo menor de contribuição para receber o benefício pleno em relação ao proposto, de 49 anos. O espaço para flexibilização, no entanto, não parece muito grande por conta do impacto nas contas públicas.
Feitas essas considerações, valem algumas recomendações.
Seriam importantes políticas sociais focalizadas e alguma flexibilidade do sistema para corrigir distorções que poderão aparecer ao longo dos anos, sem necessidade de mudanças constitucionais.
Será necessário também avançar na reforma trabalhista, reduzindo o custo e o risco na contratação de mão de obra, para elevar a empregabilidade de todos nós.
O custo político de uma reforma previdenciária é elevado. O País não pode desperdiçar a janela de oportunidade atual. A proposta vai na direção correta. Que ajustes venham a aprimorá-la, e não a desconfigurá-la.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 23 de fevereiro de 2017.
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