A cada dia que passa fica mais claro que estamos passando por tempos de mudanças constantes. Tais mudanças no jogo econômico e político tornam evidentes que qualquer sociedade com o mínimo de liberdade tem natureza dinâmica, e nos fazem questionar sobre a real existência de um “ponto de equilíbrio” que não seja puramente teórico. Para uma melhor apresentação das ideias, consideraremos aqui, por ponto de equilíbrio, um determinado período de estabilidade na economia, no qual níveis de emprego, preços, renda, dentre outras variáveis, têm variação constante.
O conceito de que as sociedades alicerçadas na economia de mercado sejam dinâmicas e tenham por natureza a busca por novos equilíbriosnovos níveis de renda, preços, etc.) não é novo. A ideia de o dinamismo ser natural vem com Joseph Schumpeter e sua teoria dos Ciclos Econômicos. Nesta teoria, o economista austríaco coloca a inovação tecnológica como crucial para o desenvolvimento das economias capitalistas. Apesar de ser citada tanto por Adam Smith quanto por Marx, a inovação só recebe o papel principal na teoria schumpeteriana.
Para ele, o empresário (ou empreendedor) é o agente econômico responsável por quebrar um determinado período de estabilidade (ou equilíbrio) na economia, e assim gera desenvolvimento econômico a partir desta “instabilidade”. Segundo Schumpeter, é o empresário quem insere uma inovação no mercado. Tal inovação pode acontecer de cinco formas distintas: novos produtos, novos métodos de produção, novas fontes de insumos, novos mercados e novas formas de organização[1]. Antes de poder descrever como se dá o processo de inovação, temos que ter em mente que a descoberta ou criação de novos conceitos e práticas puramente científicas (descoberta cientifica) são chamadas de invenção. Esta só se torna uma inovação quando é incorporada pelo mercado.
Agora, podemos perceber a dinâmica da inovação da seguinte forma: o agente inovador observa uma invenção (ou descoberta científica) e a insere no mercado, transformando-a, assim, em uma inovação. Tendo ela alcançado um relevante sucesso, fará com que antigos produtos ou processos se tornem obsoletos. Tão logo o mercado note o sucesso de tal inovação – comumente por meio dos lucros auferidos pelo agente inovador – outros atores do cenário econômico o imitarão, visando também obter os lucros extraordinários. Assim que os “imitadores” alcançarem o avanço tecnológico do agente inovador, as margens de lucro tenderão a um mesmo nível, fazendo com que os empresários busquem novamente a fuga desta possível estabilidade (busca por lucros extraordinários) por meio de outras inovações. Este é o processo de destruição criadora, em que se tem a destruição de um padrão pela criação de outro. Para Schumpeter é a dinâmica deste processo a responsável pelo desenvolvimento econômico.
Cabe aqui notar que a mudança (ou instabilidade) gerada pela inovação não se prende apenas às margens de lucro dos empresários. Neste momento de troca de “padrões” no mercado temos diversas mudanças no mercado de trabalho, nos custos de produção, preferências dos consumidores, etc.
Apesar de o efeito de uma determinada inovação ser desconhecido previamente, existem algumas abstrações que podem ser feitas levando em consideração a observação do cenário econômico. Neste artigo, visando fazer um futuro paralelo ao Brasil, exemplificarei os possíveis efeitos no mercado de trabalho. Para efeitos teóricos, vamos considerar, aqui, como equilíbrio de mercado um determinado cenário em que as empresas não geram mudança na estrutura do mercado. Devemos levar em conta, também, que fatores externos a este mercado podem desequilibrá-lo, mas no exemplo o desequilíbrio é gerado especificamente por uma inovação tecnológica.
Vamos usar, aqui, o mercado de aparelho celular. Para tornar a explicação mais simples, admitamos que este mercado seja dominado apenas por duas empresas, Apple e Samsung, tendo cada uma 50% de participação no mercado.
Ambas possuem um forte programa de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e, em decorrência disso, a Samsung apresenta um aparelho com um novo sistema operacional, tendo uma tecnologia completamente nova. Tal sistema é bem aceito entre os antigos consumidores e, sendo superior ao concorrente, conquista alguns clientes novos, ganhando mais espaço no mercado. Agora, vamos analisar algumas possibilidades para o mercado de trabalho.
A Apple, neste caso, deverá utilizar de P&D para ter aprendizado sobre a nova tecnologia e assim alcançar o novo nível tecnológico ou até mesmo gerar uma nova mudança. Porém, para isso, depende do nível de qualificação e produtividade da mão de obra disponível. Considerando a realidade das duas empresas, ambas contam com capital humano qualificado e produtivo em seus países de origem (EUA e Coreia do Sul). Isso faz com que nenhuma das duas empresas consiga um salto tecnológico tão grande que a outra não consiga alcançar.
Fazendo um link do modelo apresentado acima com o Brasil, temos um cenário no qual grande parte da mão de obra tem baixa qualificação e produtividade. Continuando no exemplo supracitado, vamos inserir no cenário da concorrência no mercado de aparelho celular mais uma empresa, agora instalada no Brasil. Além do fato de a mão de obra ser de baixa produtividade[2], o Brasil não possui investimento forte em P&D[3]. Isso quer dizer que possivelmente a empresa brasileira poderia encontrar dificuldades para acompanhar todas as novidades do mercado.
De fato, os países que possuem um sistema mais dinâmico e inovador se tornam mais desenvolvidos, tanto no campo econômico quanto no social. A maioria dos países que são usados como exemplo de inovação estão entre os considerados “Desenvolvidos” ou “industrializados”. A questão principal é como tratar este assunto no Brasil, já que qualquer choque intenso de inovação pode vir a gerar uma onda de desemprego. Este assunto torna-se cada vez mais urgente, pois nossa competitividade internacional, que já é extremamente baixa[4], pode ficar ainda pior na iminência de uma IV Revolução Industrial, quando a tecnologia tende a tomar conta da indústria, substituindo os seres humanos em diversos setores[5].
A questão que fica, então, é sobre como transformar o Brasil para que o processo de inovação seja sustentável e gere progresso. Este artigo é apenas a mínima parte de um debate que deve ser travado no Brasil para que se construa um ambiente em que tanto empresas quanto os cidadãos se tornem cada vez mais aptos a viver em mundo onde a inovação é cada vez mais constante.
Entre as barreiras à inovação no Brasil podemos citar: a alta burocracia e o alto nível e complexidade dos impostos, que faz com que os empresários percam tempo e dinheiro preocupados com a entrega de inúmeras declarações ao governo; a baixa produção científica e o pequeno número de pesquisadores na iniciativa privada[6], indicadores que mostram um dos motivos para o baixo nível de investimento em P&D; o elevadíssimo custo do crédito, que faz com que as empresas (muitas vezes pequenas e médias) tenham dificuldade de buscar financiamentos para pesquisas e, principalmente, a baixa qualidade da educação, que afeta além da nossa capacidade de inovar, a nossa capacidade internalizar as inovações que chegam. Estes são apenas alguns itens que podem gerar inúmeras discussões em várias áreas da teoria econômica e até mesmo em outras áreas.
A crise é um ótimo momento para repensarmos tudo que sabemos sobre o funcionamento do nosso país. Que façamos isso com destreza, então.
Igor Paim – Graduando em Economia pela Universidade Estácio de Sá – RJ
[1] Teoria do Desenvolvimento Econômico, Joseph Alois Schumpeter, 1964.
[2] http://oglobo.globo.com/economia/produtividade-ainda-menor-eficiencia-do-trabalho-no-brasil-cai-3-em-2015-19283379
[3] http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,investimento-empresarial-em-ped-no-brasil,10000090668
[4] http://oglobo.globo.com/economia/brasil-cai-seis-posicoes-em-ranking-de-competitividade-internacional-20189882
[5] The Fourth Industrial Revolution, Klaus Schwab
[6] Relatório Unesco sobre Ciência, 2010
Fonte: “Terraço Econômico”.
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