Com a retomada econômica e a farta liquidez global, o Brasil voltou a chamar a atenção de gestores pelo mundo – inclusive os do segmento de alta renda – bancos, family offices e consultorias que disputam patrimônios milionários.
“Há um grande movimento de fluxo para os emergentes que não ocorre desde 2012, e o Brasil é um componente importante”, afirmou ao “Estado” Ivan Pascual, diretor executivo da BlackRock – maior gestora de recursos do mundo –, responsável pelo segmento wealth na América Latina e Ibéria.
Para ele, os portfólios se tornarão cada vez mais globais e, com a queda dos juros, gestores brasileiros também engrossarão o apetite por ativos estrangeiros. Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Estado: Como o sr. avalia a gestão de fortunas na América Latina? Quais as principais tendências?
Ivan Pascual: As tendências globais chegaram à América Latina: há uma corrida para sofisticar consultoria e aumentar a transparência, e não só vender produto – o que tem sido reforçado por reguladores. Os gestores querem deixar de ser uma instituição local para ganhar escala global. No Brasil, temos os grandes bancos, que dominam o mercado, mas também family offices e gestoras independentes. Trata-se de um grande mercado que vai continuar atraindo bancos estrangeiros. Vimos hoje (última quarta-feira) o anúncio do (banco suíço) Julius Baer, que comprou a (gestora brasileira de patrimônio) Reliance; no ano passado, o banco UBS acertou a compra do (family office) Consenso. As grandes instituições estão interessadas em evoluir seu modelo de negócio. Acredito que o Brasil está muito avançado em estratégias, mas precisa diversificar os ativos. As instituições têm apostado em fundos multimercado, por exemplo, mas por que não recorrer a fundos de hedge estrangeiros ou outros tipos de fundos mais sofisticados? O ponto é que não há mais espaço para desempenho ruim.
Com a retomada econômica, as gestoras estrangeiras de alta renda devem aumentar a exposição a ativos brasileiros?
O ano de 2017 foi muito bom para mercados emergentes. Tomemos como exemplo a indústria de ETFs – fundos que replicam índices –, que é muito boa para entender fluxos globais, já que grande parte do dinheiro é institucional. A indústria quase dobrou no ano passado. A classe que mais cresceu foi equity dos Estados Unidos, mas a segunda categoria foi de mercados emergentes – à frente de índices europeus, dividendos ou renda fixa. Essa tendência deve continuar, é uma de nossas mais fortes convicções. O que estou vendo é que há muito interesse pelo Brasil.
Mesmo o País tendo perdido o grau de investimento?
Uma nota melhor (de classificação de risco) certamente vai deixar os clientes mais confortáveis. Porém, acredito que o relevante é entender que há um grande movimento estrutural de fluxo para os mercados emergentes que não ocorre desde 2012, 2013. Os clientes não aportaram nesses mercados pelos últimos cinco anos, e agora esse dinheiro está voltando. O Brasil é um componente muito importante dos mercados emergentes e certamente vai absorver esse fluxo e ganhar a confiança do investidor.
Como as eleições podem afetar esse cenário?
Eleições são um evento muito importante na equação dos retornos do mercado e é algo monitorado de perto globalmente. Sim, as eleições estão na mira dos investidores. A indústria investe muito tempo e recursos tentando entender os possíveis resultados, e no Brasil não vai ser diferente.
Em 2017, os fundos brasileiros que investem no exterior tiveram um crescimento de 139%. O apetite por ativos internacionais deve crescer?
Sem dúvida. O investidor está pedindo por um portfólio cada vez mais global. Muitos clientes brasileiros estão me dizendo que esperam dobrar a exposição a ativos internacionais. O ano passado foi bom para obter retornos no mercado local, mas agora os juros estão comprimidos. A queda da taxa de juros no Brasil foi extremamente relevante para levar investidores locais a olhar para o exterior, e isso eleva o trabalho do gerente de portfólio e das instituições.
A Bolsa teve alta de 10% só este ano. Olhando a pontuação em dólares, o preço ainda está barato para o estrangeiro?
Vemos grandes oportunidades no mercado de equity, em conjunção com a retomada de uma economia global sólida. Também é preciso observar que há falta de oportunidades na renda fixa. As companhias, porém, terão de provar que são capazes de aumentar os lucros.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”