O tempo é dos empreendedores. As tecnologias estão disponíveis, os capitais financeiros são abundantes e a mão-de-obra eurasiana transborda suas fronteiras e inunda os mercados de trabalho globais. As bolsas registram novas máximas em todo o mundo, valorizando os ativos existentes. As primeiras ondas dos fluxos internacionais de capitais atingiram apenas as mais importantes empresas da nova economia global, as companhias existentes listadas em bolsa.
A disparada de preços nos mercados acionários deflagra agora um aprofundamento na busca por novos empreendimentos, companhias até então inacessíveis aos investidores em bolsas, apesar de sua importância e visibilidade para seus próprios clientes. Quanto mais altos os preços em bolsa, mais intensa a busca, maior a disputa pela compra desses ativos reais de qualidade, menores as comissões pelos serviços de abertura de capital e mais celebrados os empreendedores. O fenômeno é global: esses são os heróis dos novos tempos.
Já a classe política está em baixa em todo o mundo. A perplexidade e a inoperância ante os desafios da globalização foram particularmente dilacerantes tanto para a “esquerda” social democrata quanto para a “direita” conservadora. De tão perplexos e inoperantes, trôpegos e tontos, não surpreende que os tradicionais antagonistas estejam abraçados no Brasil. Com a agravante de que, entre nós, os infindáveis episódios de corrupção brotam sempre da mesma fonte: desvios de recursos públicos com a interferência de políticos, enquanto permanecem paralisadas as necessárias reformas.
São funestas as conseqüências da roubalheira. A primeira é o indevido desencanto com a democracia, quando na realidade a corrupção generalizada decorre do tamanho do Estado e de seu grau de intervenção na economia. O equívoco está na arquitetura socialdemocrata, e não na democracia em si. O segundo trágico efeito é a deformação do funcionamento das políticas públicas. A saudável disputa de recursos públicos no Congresso deveria se dar em torno de programas político-partidários com distintas prioridades. Em vez disso, o processo se degenera em simples apropriação indébita de recursos, por uma impertinente associação entre carreiras políticas e o sucesso de empreendimentos privados.
A classe política está em baixa no mundo inteiro. Já os empreendedores são celebrados a cada alta dos preços em bolsa
A terceira conseqüência são os desvios trazidos ao funcionamento das economias de mercado. As conexões políticas, e não a excelência do desempenho econômico, passam a determinar o sucesso dos empreendimentos. Maus políticos desviam recursos para pseudo-empresários. O favorecimento desses falsos empreendedores é custeado pela extração de impostos que derrubam a dinâmica de crescimento interno, destroem empregos e desestimulam investimentos que teriam ocorrido dentro das regras de mercado. É por essas e outras que, para a opinião pública brasileira, os políticos são os vilões dos novos tempos. O atual episódio que envolve a presidência do Senado é um claro exemplo de todas essas conseqüências: o desencanto com a classe política, o enfraquecimento das instituições e as suspeitas de tráfico de influência.
Das suspeitas de favorecimento ilícito decorre outra gravíssima conseqüência: a sedimentação da desconfiança com que os menos favorecidos olham para a ostentação de riqueza no Brasil. A visão negativa da fortuna, segundo a sabedoria popular, substitui a admiração e o respeito aos empreendedores bem-sucedidos. Nas economias de mercado das democracias ocidentais, ao contrário, vigora a percepção popular de que o sucesso é indissociável da criação de valor para os consumidores. Os empreendedores são os heróis do capitalismo de massa.
(Publicado em O Globo em 09 de julho de 2007)
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