“Há quatro tipos de países: os desenvolvidos, os subdesenvolvidos, o Japão e a Argentina”, afirmou Simon Kusznets (1901-1985), ganhador do prêmio Nobel de economia de 1971. O excepcionalismo da Argentina é lendário entre cientistas sociais, e o enigma é decadência do país.
Para alguns analistas, a chave são as instituições. A explicação clássica foi apresentada pelo jurista e teórico social Carlos Nino em seu notável “Un País al Margen de la Ley” (1992). Seu diagnóstico é brutal: a institucionalidade escassa do país deve-se a uma patologia que denominou “anomia boba”, e define como “inobservância normativa generalizada”. Essa modalidade de anomia é tola por ser ineficiente: todos estariam em situação melhor se observassem as leis.
A estrutura do conflito a partir de então foi analisada por Guillermo O’Donnel (1936-2011), o maior cientista político argentino, em clássico de 1973, como um “juego imposible”.
Seus contendores são os militares, o justicialismo (peronismo) e os partidos de oposição. O quadro analítico também é o da teoria dos jogos. O cálculo dos demais atores é que, se os peronistas ganharem as eleições, não respeitarão a institucionalidade democrática. E que, se a oposição tiver sucesso, os peronistas não deixarão governar.
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Esses atores esperam também que os militares atuem como árbitro e intervenham temporariamente no jogo se um dos dois cenários se materialize. Essa estrutura de incentivos —na qual ninguém podia ganhar— alimentava a polarização, fazia com que a democracia se convertesse em um jogo impossível. E desaparecesse.
A transição por colapso ocorrida após a Guerra das Malvinas e a saída dos militares da cena política alteraram o jogo, mas o país permanece ingovernável e muito polarizado.
Intensa polarização marca a linguagem política argentina desde os anos 40, quando surgem as expressões gorilas e cabecitas negras / gordura, cujos correlatos entre nós —coxinhas e mortadelas— só apareceram recentemente.
O que essa argentinização da nossa linguagem política prenuncia?