A saída de dois integrantes da equipe do Ministério da Economia – o secretário de Desburocratização, Paulo Uebel; e o secretário de Desestatização, Salim Mattar – reacendeu o debate sobre a continuidade da agenda liberal do governo após a superação da pandemia do novo Coronavírus. Apesar da natural preocupação após o desembarque de dois importantes integrantes da equipe econômica, que trouxeram resultados relevantes para o país em um ano e oito meses, as autoridades federais sinalizam para a manutenção da política liberal e de austeridade. Mais uma vez, ficou claro: sem ações como o respeito ao Teto de Gastos e um programa de otimização da máquina pública, o país não conseguirá retomar o rumo do desenvolvimento e dos investimentos, algo tão necessário em um momento como esse.
A CEO do Instituto Millenium, Priscila Pereira Pinto, destacou que, neste início do governo, o presidente Jair Bolsonaro deixou a agenda econômica a cargo do ministro Paulo Guedes e sua equipe, cuidando pessoalmente de temas mais próximas à sua base eleitoral. Passado esse período inicial, ela acredita que o governo poderá focar nestes projetos. “O trabalho da equipe econômica neste período foi excepcional. No entanto, a máquina pública ainda é muito engessada e todos os processos de reestruturação e desestatização são demorados. É preciso conversar com muita gente e passar por um conjunto burocrático de normas para as grandes reformas. Acredito que, agora, o presidente terá mais tempo para focar na retomada da economia, abraçando essa pauta liberal e de austeridade”, disse.
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Isso ficou claro no dia após a chamada “debandada”. Tanto o presidente Bolsonaro quanto os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), defenderam a manutenção da política de austeridade e a agenda de reformas econômicas e administrativas. “Nós respeitamos o teto dos gastos. Queremos a responsabilidade fiscal. E o Brasil tem como ser um daqueles países que melhor reagirá à crise. Assuntos variados foram tratados, como privatizações, outras reformas como a administrativa”, disse Bolsonaro, citando o esforço conjunto para destravar a economia. O compromisso foi reafirmado por Rodrigo Maia, que destacou a necessidade da boa qualidade nas despesas públicas. “A reforma administrativa, que eu espero que, assim que o presidente entender importante, a Câmara dos Deputados estará pronta para debater, para discutir e para aprovar uma reforma que tem apenas um objetivo”, afirmou.
Agenda avançou, mas há obstáculos
A agenda de modernização da máquina pública avançou no período de Uebel e Salim Mattar no Ministério da Economia. Em artigo publicado no Brazil Journal, onde expõe as razões para ter saído do governo, Salim Mattar dá uma dimensão do tamanho do Estado brasileiro, ainda mais inchado do que se pode imaginar: durante a transição, foi informado que o Brasil tinha 134 empresas públicas. A equipe chegou, analisou e encontrou 698 estatais, entre as de controle direto, subsidiárias, coligadas e com participações.
Neste período, o governo se desfez de 84 empresas, gerando R$ 150 bilhões aos cofres públicos entre desestatizações e desinvestimentos. Para as demais, um novo modelo de gestão foi implementado, com a adoção do estatuto-modelo da OCDE, que ampliou padrões de governança e compliance. O decreto 10.263, por sua vez, obriga os ministérios a justificarem a existência das empresas a cada dois ou quatro anos, dependendo do tipo.
Mas o processo de desestatização, principalmente quando se fala em grandes empresas, como Correios e Eletrobras, é extremamente complexo e depende de um amplo trâmite inclusive no Congresso Nacional. Salim Mattar explica: “O arcabouço legal do processo de desestatização é complexo e moroso. São quinze agentes envolvidos, do Presidente ao ministro setorial, do TCU ao BNDES. Tudo torna o processo burocrático, lento e, por mais que alguns se esforcem, não conseguem acelerar as coisas”, disse. O agora ex-secretário destacou, ainda, que 14 estatais (de um total de 46) estão encaminhadas para a desestatização, por meio de Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e do Programa Nacional de Desestatização (PND).
+ Transformação digital reduz burocracia e estimula a competitividade
Com relação à desburocratização, o país também experimentou avanços relevantes nos últimos anos. O principal deles foi a Lei da Liberdade Econômica, que torna mais simples o ambiente de negócios no Brasil, extinguindo a exigência de alvarás, certidões e autorizações para atividades de baixo risco, além da simplificação das exigências para atividades de médio risco. Outro projeto criado pela equipe do secretário Paulo Uebel foi o Mapa das Empresas, dispositivo que permite ao cidadão acessar informações como o número de empresas abertas e fechadas, qual tipo societário mais frequente, qual atividade, tempo médio de abertura das empresas por município, entre outros recursos. “Vai ser uma ferramenta muito útil para a tomada de decisão do empreendedor que deseja abrir uma empresa e até mesmo dos gestores públicos, na hora de verificar como as suas políticas públicas estão impactando na região. Ele vai poder interpretar como isso está funcionando”, disse em entrevista ao Clube Millenium, recentemente.
O Mapa das Empresas terá um fator multiplicador: Por um lado, o empresário vai poder definir melhor as estratégias de negócio observando o perfil de cada município, identificando novas oportunidades e dinamizando a economia. Por outro, as próprias Prefeituras podem iniciar uma disputa saudável para reduzirem suas burocracias, uma vez que, ainda hoje, em muitos lugares do país, abrir um novo negócio é uma verdadeira saga. Outras iniciativas estavam em gestação, como a identidade digital.