Uma empresa que busca competitividade no mundo globalizado precisa adotar uma estratégia de negociação que leva em conta as particularidades culturais dos seus interlocutores internacionais, que podem ser clientes, fornecedores ou mesmo a opinião pública e o governo do país onde eles estão. O processo de internacionalização para ser empresarialmente eficaz e benéfico não pode negligenciar a relevância do conhecimento relacionado à negociação internacional.
A negociação é um relacionamento interpessoal, no qual as partes interagem para obter o que lhes interessa, mas com a expectativa de gerar aos envolvidos um resultado, que deve ser superior ao que seria obtido se não houvesse uma negociação. Pode-se negociar tanto o processo de negociação (por exemplo: a agenda dos temas a negociar ou a forma de apreciar cada tópico) quanto o objeto alvo da negociação, tais como: uma transação de compra e venda (ou aluguel), as condições de um empréstimo, a divisão de um orçamento, a repartição de tarefas ou um acordo comercial (por exemplo: licença de uso de marca ou patente). Ainda que cada negociação possa ter um desenrolar distinto, normalmente há um conjunto de etapas que podem ser identificadas: (a) preparação sobre o que é essencial, o que se pode ceder e alternativas à negociação; (b) escolher (eventualmente negociar) um procedimento (agenda) para a negociação; (c) identificar interesses (comuns, diferentes e conflitantes) e expectativas; (d) gerar soluções ou interpretações criativas para evitar ou contornar impasses; (e) selar e redigir acordo, verificando a viabilidade de sua implementação.
A duração de uma negociação pode ser imprevisível devido a inúmeros motivos, incluindo a demora para estabelecer uma relação de respeito ou confiança, havendo também quem correlacione a duração da negociação ao empenho das partes, de forma que concessões percebidas como “precipitadas” podem vir a ser interpretadas como sinais de fraqueza. Se, por um lado, o tempo pode ser desperdiçado com divagações, exibições, interrupções e tumultos pela apresentação de “propostas radicais”, uma extensão no tempo disponível pode prejudicar quem fala demais, quem age de forma açodada ou ainda quem cai em contradição, embora nesse período possam surgir de forma inesperada pelo menos um fato novo que pode facilitar ou determinar um acordo.
A empatia entre negociadores auxilia o andamento das negociações e consiste em procurar se colocar na posição do interlocutor, de forma a avaliar suas emoções, motivações e interesses, o que pode facilitar um acordo. Entender os argumentos e as dificuldades do outro não significa, entretanto, que se deva concordar com o ponto de vista defendido pelo outro e favorecê-lo, em detrimento de sua própria opinião. O objetivo do diálogo é obter mais informações para criar e propor uma solução negociada. Em todo caso, são injustificáveis ataques pessoais durante um debate, inclusive porque as opiniões e expectativas pessoais do interlocutor nem sempre coincidem com aquelas que ele deve apresentar e defender em uma negociação, como representante de uma organização ou de um país. Se já não é fácil estabelecer relações de empatia com compatriotas, nem é trivial manter a cordialidade durante um conflito de interesses, o processo de negociação é mais difícil com estrangeiros, em um idioma diferente da língua materna. É ainda mais desafiador estabelecer relações de empatia em negociações multiculturais, quando estão presentes membros com opiniões, interesses e expectativas muito distintas. Preconceitos dificultam a compreensão de uma situação e a busca da melhor solução possível.
Há negociações internacionais nas quais é necessário recorrer a um tradutor, que é, simultaneamente, um porta-voz e um mensageiro, o que lhe confere uma importância estratégica. O tradutor deve ser alguém de plena confiança, a fim de evitar o acréscimo de problemas de comunicação ou mesmo a participação de alguém pouco interessado em contribuir para o desenvolvimento da relação entre os negociadores, inclusive pela possibilidade de uma “intolerável atitude de sabotagem do tradutor”, tal como relatou Roberto Giannetti da Fonseca no seu livro “Memórias de um trader: a história vivida do comércio exterior brasileiro nos anos 70 e 80” ao comentar uma negociação na China em 1986. Há, entretanto, quem, mesmo dominando o idioma da negociação, recorra a um tradutor como tática para ganhar tempo, ao formular uma resposta, assim como para se esquivar da responsabilidade por uma frase infeliz ou uma palavra mal colocada. Esta tática pode, entretanto, abalar a relação de confiança mútua e, portanto, ser contraproducente.
É importante sempre buscar uma solução negociada mesmo quando há um desnível de poder, pois, além da parte mais forte poder ter seu “calcanhar de Aquiles”, evitar maiores perdas pode de fato ser um ganho da negociação para a parte mais fraca. Ademais, o mais forte pode avaliar que concessões no presente podem gerar benefícios no longo prazo, lembrando inclusive o comentário do chinês Confúcio: “Quem age considerando apenas seus próprios interesses desperta muito ressentimento”.
Publicado no Jornal do Commercio, 10/ 11/ 2010
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