Na antevéspera do Natal, é natural que falemos de esperança. O espírito natalino sugere fé e solidariedade. Por isso, escolhi uma mensagem contendo tais virtudes em elevada dosagem.
Sem perder de vista nosso compromisso de acompanhar a economia mundial. O personagem deste conto é português: Ernani Rodrigues Lopes, morto no ano passado, nesse mesmo mês de dezembro, após dura batalha contra um câncer, ou cancro, como diriam nossos irmãos portugueses.
Irmão, eu também me sentia de Ernani. Pela admiração a sua vitalidade intelectual, a sua acendrada luso-brasilidade, a seu engajamento nas grandes causas de seu país e dos países que Portugal fundou pelos séculos afora.
E foi Ernani Lopes que comandou a economia portuguesa em seu momento mais obscuro – tentemos retornar aos penosos 1980 – e lembrar uma nação desfigurada pela perda de suas colônias de ultramar, defraudada pelo regime comunista mais obtuso, combalida pelo isolamento físico e econômico do resto da Europa.
Quem ousaria, naquele momento, tentar uma reviravolta na economia? O risco da empreitada daria para queimar uma boa biografia. Mas Ernani ousou. Atendendo ao chamado de Mario Soares, o grande economista assumiu a pasta das Finanças em 1984.
Desvalorizou a moeda. Liberou travas à livre iniciativa. Cortou subsídios e vantagens. Emagreceu o gasto público e controlou o déficit fiscal. Nesse trajeto de recuperação, os alemães sempre ajudaram com financiamentos.
Em 1984, a infraestrutura de Portugal era a de uma aldeia atrasada. Mas, em apenas dois anos, um milagre aconteceu. Em janeiro de 1986, Ernani Lopes assinaria os compromissos de ingresso de Portugal na Comunidade Europeia. Dai em diante, Portugal escreveu uma história de contínuo progresso e modernidade.
Conto essa história por ser absolutamente atual. Muitos falam, no mercado, que o euro vai acabar. Outros arriscam que países como Portugal sairão da área do euro para poder se tornar competitivos.
Cada uma dessas alegações, embora possíveis (tudo é possível numa grande crise), não têm compatibilidade com o esforço histórico de homens como Ernani Lopes. Muito foi realizado para dar a Portugal o grau de desenvolvimento que alcançou.
Se a atual crise exigir que o poder de compra recue, momentaneamente, algo como 10% por exemplo, será um preço módico a pagar diante do que Portugal acumulou durante 25 anos de participação na União Europeia.
Nada disso merece ser perdido, só porque a atual geração de portugueses já não se lembra de como era a economia lusitana e de como se chegou até o ponto em que estão. Tampouco deve a população alemã desistir, agora, do vasto investimento que tem feito numa Europa comum.
Esta é a “guerra” que os alemães desta geração estão ganhando pacifica e generosamente, após a devastação que provocaram na loucura nazista. Já os ingleses, acuados em sua ilha, decepcionam ao não emprestar apoio claro ao esforço de recuperação financeira.
Não é difícil prever que o espírito pan-europeu de Ernani Lopes prevalecerá sobre a cultura do desânimo, do derrotismo e do isolamento. Angela Merkel trabalha por isso.
O desafio europeu de hoje é bem mais palatável do que o do pós-guerra. O que ainda falta é introduzir, nas economias abaladas pela crise, as políticas de alta competitividade, como defendidas e implantadas por Ernani Lopes em Portugal e Ludwig Ehrard na Alemanha.
Caro leitor: um Natal com fé e esperança no futuro.
Fonte: Brasil Econômico, 23/12/2011
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