O Supremo Tribunal Federal começa a julgar hoje o mais complexo e rumoroso processo de corrupção já levado adiante no Brasil. O veredito ainda vai demorar alguns dias e, seja qual for ele (ou eles, já que há quase 40 réus envolvidos), tudo indica que o caso do “mensalão”, como ficou conhecido o escândalo que motivou o processo, sobreviverá ao julgamento.
Condenados ou absolvidos, os réus dificilmente se livrarão da marca que os acompanha ao longo dos últimos cinco anos – visto que a possibilidade de esse assunto se encerrar com o veredito é praticamente nula.
Existe por parte da imprensa uma cobrança firme pela condenação dos réus – mas esse não é (ou pelo menos não deveria ser) o critério pelo qual a sociedade deve avaliar o resultado do julgamento.
Acima e além das sentenças que vierem a ser proferidas, o que está sob o foco dos holofotes é a qualidade das leis brasileiras. São elas que, em última instância, serão consideradas nas decisões dos magistrados.
De antemão, é possível afirmar que a lei brasileira sobre o tema é tão remendada e prevê tantas exceções que, com base no que está escrito, nenhum resultado será surpreendente. E, qualquer que seja a sentença proferida, ela será objeto de queixas.
Nas últimas semanas, uma série de reportagens recheou as páginas dos jornais com relatos de um esquema de corrupção que começou a ser investigado a partir das denúncia de um caso de suborno nos Correios e progrediu a ponto de encostar uma adaga ameaçadora contra o peito do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
No final do “julgamento político” (expressão criada recentemente pelo senador Humberto Costa para justificar a punição a seu ex-colega Demóstenes Torres), o ex-ministro da Casa Civil de Lula, José Dirceu, e o deputado Roberto Jefferson (que fez as denúncias do pagamento mensal de uma caixinha aos parlamentares em troca de fidelidade ao governo) tiveram seus mandatos cassados e perderam os direitos políticos.
As empresas do publicitário mineiro Marcos Valério foram à falência. E todo o resto seguiu como dantes.
O que, de fato, deixou muito cidadão com o queixo caído naquela ocasião foi o fato de o Congresso simplesmente ignorar os flagrantes contra diversos parlamentares, que na reta final tiveram seus mandatos preservados pelos colegas.
Agora, o rigor que não existiu no Congresso (que preservou os mandatos de colegas mensaleiros escondido atrás do anonimato conferido pelo voto secreto em plenário) vem sendo exigido do Supremo Tribunal Federal.
Ou seja: os parlamentares terceirizaram para o Judiciário a responsabilidade pelo “julgamento político” – quando, para a proteção da sociedade, o melhor seria o resultado mais técnico possível.
O Brasil precisa entender que, numa democracia, o Executivo governa, o Legislativo legisla e o Judiciário aplica as leis. A confusão em torno das atribuições dos poderes é a prova de que o melhor de todos os regimes políticos ainda tem muito o que evoluir no Brasil.
Fonte: Brasil Econômico, 02/08/2012
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