A entrada de ganenses no Brasil durante a Copa do Mundo e de haitianos nos últimos meses desperta a atenção para a forma como o país lida com a questão da imigração. Especialista do Instituto Millenium, Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres (1994-1999) e em Washington (1999-2004), alerta para a ausência de uma política migratória direcionada para as necessidades econômicas do país. “O Brasil não tem uma política de migração organizada e orientada para favorecer os gargalos da economia brasileira”, conclui.
Assim como os haitianos e senegaleses, os ganenses vieram à procura de trabalho. De acordo com o ex-embaixador esse é o perfil de estrangeiros que o país mais atrai. “São imigrantes ocasionais que buscam empregos”, diz, lembrando que o Brasil os recebe em respeito a questões humanitárias. Barbosa acredita que o governo deveria desenvolver ações para incentivar a entrada de outro tipo de imigrantes. “Se nós contássemos com uma política de migração, estaria sendo estimulada a vinda de pessoas com um perfil importante para a economia brasileira”, afirma, acrescentando que o assunto merece a atenção do próximo governo: “O Ministério da Justiça e a sociedade brasileira precisam se mobilizar para enfrentar esse problema que deve crescer ao longo dos anos”.
Leia:
Instituto Millenium: Como o senhor avalia a atual política de migração do Brasil? Como é feito o controle de entrada no país?
Rubens Barbosa: O Brasil não tem uma política de migração organizada e orientada para favorecer os gargalos da economia brasileira. Se nós contássemos com uma política de migração, estaria sendo estimulada a vinda de pessoas com um perfil importante para a economia brasileira, como os indianos que atuam na área de informática. Assim, haveria uma política industrial que favoreceria a economia brasileira. Não temos nada disso. Se existe no papel, não vemos na prática. Podíamos atrair espanhóis e franceses desempregados na Europa para determinados setores da economia através de estímulos.
O Brasil fica exposto a um tipo de imigração de ocasião. Os haitianos vêm para cá buscando oportunidades de trabalho. A mesma coisa acontece com os ganenses, que vieram para a Copa e resolveram ficar aqui. O Brasil precisa desenvolver uma política porque à medida que o país crescer, a imigração vai aumentar, inclusive de pessoas provenientes de países da região. Nós não estamos preparados para isso. Já está começando. Há os bolivianos em São Paulo. Não temos uma política para atrair e cuidar dos imigrantes que se instalam ilegalmente no Brasil.
Imil: É interesse do Brasil pautar a política de concessão de vistos permanentes e cidadania?
Barbosa: Acho que o Brasil precisa ter uma política. Países como Portugal, Espanha, França, Inglaterra e mesmo os Estados Unidos dão visto permanente para pessoas que trazem investimentos. A questão do visto permanente no Brasil é para reunião familiar ou para gente que vem para trabalhos temporários. As concessões são dadas sempre do ponto de vista de quem pede e não do ponto de vista do governo, que podia atrair outro tipo de imigrantes.
Imil: O Brasil tem estrutura para receber os imigrantes que procuram melhores condições de vida fora dos seus países?
Barbosa: O país não tem condição. O Acre enviou os haitianos para São Paulo, criando um problema para a cidade. Em São Paulo está começando a haver uma preocupação com o tema – a Casa do Imigrante até foi reinaugurada. Precisamos começar a ver isso. O Brasil tem fronteira com dez países. À medida que o país se desenvolver vai haver uma atração muito grande em busca de mercado de trabalho.
Imil: Na prática, qual é a responsabilidade legal do governo brasileiro para com os refugiados?
Barbosa: Os haitianos e os ganenses não são refugiados, eles buscam trabalho. O Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) cuida dos refugiados. Também nesse caso é preciso haver uma melhoria das condições. Não é possível ter casos com dois anos sem nenhuma resolução.
Imil: A disputa eleitoral já começou. O senhor acredita que a questão da imigração será uma prioridade do governo que será eleito em outubro? Por quê?
Barbosa: Não sei se será uma prioridade, mas o assunto merece atenção de qualquer que seja o governo eleito porque a questão da imigração vai se colocar cada vez mais. O Ministério da Justiça e a sociedade brasileira precisam se mobilizar para enfrentar esse problema que deve crescer ao longo dos anos.
No Comment! Be the first one.