Assim como o nosso organismo reage através dos anticorpos contra a invasão de elementos estranhos a ele, nossa mente reage contra a presença de ideias que nos parecem exóticas.
Essa barreira reagente que construímos num primeiro momento, pode ocorrer por simples prudência, permitindo ganharmos tempo para analisarmos aquele corpo estranho, não identificado, até entendermos se ele aprimora ou distorce o que já sabemos.
Mas esse não é o único propósito dessa barreira protetora. Nossa mente pode desenvolver uma mentalidade dogmática, uma espécie de vício que impede que nossos pensamentos sejam oxigenados por ideias de qualquer tipo, principalmente aquelas que contrariam nossas crenças, colocando nossas certezas em perigo.
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Não podemos esquecer que quando nos abrimos para expor o que temos dentro da nossa mente. através do ato de tornar público nosso pensamento, nos tornamos ao mesmo tempo um emissor de proposições e argumentos e um receptor de críticas e contra-argumentos.
Uma mente aberta deve necessariamente ser uma via de mão dupla, de forma que o vai e vem das ideias construa um fluxo virtuoso que vá preenchendo os hiatos, desfazendo as contradições e aparando as arestas de maneira que a verdade possa ser encontrada quase à perfeição.
Todo aquele que propõe ideias joga ao mar um bote salva-vidas para quem está à deriva perdido como um náufrago, mas junto com essa oferta de ajuda sempre, inescapavelmente, acompanha um pedido de socorro, um grito a clamar por ajuda àqueles que em posição mais segura podem oferecer alento àquele que não temeu colocar à vista de todos sua incapacidade circunstancial ou o brilho de seu talento.
Vê-se quando os corpos estranhos são nocivos, agentes que nos colocam em perigo quando em vez de focarem na mensagem, nos argumentos, na discussão das ideias, miram no mensageiro, focando não na construção cooperativa para a construção de um consenso, mas na busca de uma vitória ilusória marcada pela soberba, pela postura religiosa, pela agressividade virulenta.
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Muita gente inteligente, acha que o uso comum da racionalidade, que deveria tornar qualquer debate um jogo ganha-ganha, cujo valor final, não importando a fonte, enriquece a todos que participaram do confronto, é, pelo contrário, um certame de soma zero, onde somente um pode cantar a vitória, enquanto os outros devem penar com a derrota.
Debates devem ser encarados como atos de cooperação na busca da verdade. Cada um defenderá suas premissas, seus valores, seus ideais, através de argumentos construídos sobre a experiência, a lógica e o conhecimento adquirido por transmissão dos pensamentos contidos em livros ou outros meios cabíveis.
Não importa o que cada um pensa a respeito do que defende, afinal, o juiz que decidirá sobre o que é verdadeiro ou falso, do que for extraído dos argumentos apresentados; é a realidade objetiva, que cria e impõe as leis que regem o universo assim como a nossa própria natureza.
Natureza essa que faz com haja aqueles que, com medo de ouvir o próprio grito de socorro, jogam o bote salva-vidas no oceano e correm com ouvidos e olhos fechados.
Se acham autossuficientes, jogam o bote salva-vidas e fogem, nem ficam ali para saber se salvaram, por sorte ou por azar, um náufrago perdido no mar.
Fonte: “Instituto Liberal”, 15/02/2019