Os sistemas políticos atuais são marcados pela ascensão dos extremos, mediante incandescentes pautas de polarização. A estratégia é pragmática: muito mais fácil organizar eleitoralmente uma sociedade em uma linear lógica do “nós contra eles”. Criam-se, então, dois lados que, através de discursos dirigidos, procuram ganhar maiorias temporárias que legitimem a vitória nas urnas.
A história recente fornece elementos concretos. Durante o regime militar, a política se polarizou no artificial bipartidarismo entre Arena e MDB. Com a redemocratização, houve um gradual e sucessivo enfrentamento de forças entre PSDB e PT. Desgastados os partidos, partimos, então, para uma pauta de personalismos; no último pleito, tivemos o duelo entre o bolsonarismo versus lulismo, redundando na eleição do atual presidente. Aliás, tanto essa como a corrida eleitoral de Collor demonstram que a política pode surpreender com candidaturas alheias ao mainstream, sendo o acaso uma força democrática jamais desprezível.
Agora, vencer eleições não garante a arte do bom governo. Isso porque a narrativa chapada dos pleitos majoritários pode pouco diante das fundas complexidades da democracia contemporânea. Sim, o voto outorga poder ao governante, que, por seu turno, deve ser dotado de capacidades especiais para bem compor as diferenças que se revelam no tecido social e no multifacetado corpo político parlamentar. Para tanto, além da habilidade de bem negociar, é fundamental a sensibilidade de fazer tocar com as palavras, criando enredos políticos aptos a despertar a esperança de que um novo tempo é possível e viável a todos, a partir de opções democráticas assertivas, efetivas e concretas.
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Democracia, participação política e representatividade
Em tempo da atual consolidação das redes sociais, a imagem e o speech político se tornam ainda mais decisivos. Com a popularização da internet e dos smartphones, é praticamente impossível esconder fatos desagradáveis ou desabonatórios ao poder. E, por mais que se inicie uma briga de versões, existem situações que falam por si, enterrando os esforços para se maquiar a realidade. Ou seja, em uma era de imediatismo informacional a cores e bom som, o charme retórico e a postura do líder serão infinitamente mais decisivos do que já foram no passado.
Sem cortinas, as tentativas recentes de se rebaixar o discurso político a pautas rasteiras e agressivas representam apenas o recurso apelativo que faz do choque um instrumento de contenção social. Em outras palavras, ganha-se tempo para alimentar o fervor dos apoiadores de fé. Todavia, ao longo da curva, tal tática perde persuasão, pois as pessoas cansam de governos que promovem conflitos permanentes. Aliás, a conflitividade é um traço maiúsculo de inaptidão democrática. É claro que há lutas e embates políticos necessários, mas a arte do bom governo requer o tato da hábil composição de interesses. A guerra deve ser um instrumento da paz.
Portanto, há uma nova dinâmica política no ar. Mais complexa, responsiva e de poliédrica comunicação. A rasteira polarização binária, embora em alta, não durará para sempre, pois incompatível com a pluralidade da democracia moderna. Tal fato não exclui o risco de retrocessos temporários e eventuais simplificações casuístas do jogo político. O pêndulo da história pode ir aos extremos, mas, obrigatoriamente, passa duas vezes pelo equilíbrio central.
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As evoluções civilizatórias exigem correlatas adaptações e aperfeiçoamentos de seus respectivos sistemas políticos e alavancas institucionais. Algumas mudanças vêm de forma rápida, outras ofertam resistências enérgicas. Mas uma realidade está posta: o futuro não será como o ontem. No entreato dos acontecimentos, aqueles, que pelo poder são capazes de tudo, serão visitados pela força do nada com uma velocidade avassaladora. E, num hiato de luz, a vida terá mudado de forma irrevogável, levando consigo tudo aquilo que pensava ser o que mais não é.
Fonte: “Estado de Minas”, 28/09/2020