Ao longo dos últimos anos a previdência complementar brasileira foi beneficiada pelas altas taxas de juros praticadas pelo governo. Num mundo com taxas ao redor de zero, o Brasil ostentava gloriosos 15% ao ano. E os brasileiros se acostumaram com isso, sem fazer a conta básica para saber quanto, efetivamente, estava sobrando, descontando-se a inflação.
Nesse período, em alguns momentos, a inflação bateu os dois dígitos, o que quer dizer que os 15% ao ano, na verdade, eram menos do que 5%, já que boa parte era comida pela inflação.
Mas a conta é mais complicada do que simplesmente abater a inflação real da taxa de juro nominal. Tem mais coisas impactando o resultado e elas não são pequenas. Começando pelo Imposto de Renda, na melhor das hipóteses, ele tem peso de 15% sobre o rendimento, ou seja, os quase 5% ficam menores ainda. E além dele, os custos diretos e indiretos cobrados pelos administradores dos planos costumam se aproximar dos 3%, o que também reduz a margem livre do investidor.
No mundo inteiro os planos de previdência complementar não são campeões de rentabilidade. Raramente eles competem com investimentos de curto prazo, ou com risco maior. Ao contrário, as operadoras de planos de previdência complementar buscam, invariavelmente, títulos garantidos pelo governo, ou aplicações seguras, que não costumam ser as mais rentáveis.
Afinal, se quanto maior o risco, mais o título tem de pagar, o oposto também é verdade, quanto mais seguro o título, menos ele tem de pagar. A regra é velha como o mercado e nunca foi desmentida. Um título de 99 anos do governo americano paga juros baixos e tem colocação imediata. Um mesmo papel, emitido pelo governo brasileiro, ou paga juros bem mais elevados ou não tem colocação.
Há alguns anos o governo alemão precisou mudar uma antiga lei que determinava que os seguros de vida deveriam pagar rendimentos mínimos de 3% ao ano. As seguradoras não estavam conseguindo manter a exigência e várias delas estavam na iminência de quebrar porque a remuneração mínima era obrigatória.
Três por cento ao ano, em termos reais, ao longo de dez anos, é a remuneração em torno da qual os planos de previdência complementar giram. Um ano pode render um pouco mais, no outro um pouco menos, mas, na média, a conta fecha ao redor disso.
A grande vantagem dos planos de previdência complementar é o desconto fiscal oferecido pelo governo. É neste item que ele se torna interessante, afinal, a alíquota pode cair de 27% para 15% se o investidor deixar o dinheiro dez anos no plano. É uma redução significativa que torna os nossos PGBL’s e VGBL’s campeões de venda, entra ano, sai ano, com crise ou sem.
Agora a situação relativamente cômoda das operadoras de planos complementar começa a mudar. Com a inflação baixa e os juros oficiais em menos de 9%, a rentabilidade cai bastante, quer dizer a remuneração real será efetivamente menor e ainda deve ser abatido dela o índice da inflação. Isso quer dizer algo próximo de 5% ao ano, sobre os quais incidem os 3% cobrados pelas operadoras. Ou seja, descontando o Imposto de Renda, o investidor, hoje, corre o risco de ter uma rentabilidade de menos de 2% ao ano.
É evidente que ninguém em sã consciência manterá seu dinheiro numa aplicação como esta, se tiver como migrar para a caderneta de poupança, que, no atual cenário, está pagando bem mais, na casa dos 5% ao ano. O que segura uma migração maciça é a elevada alíquota do Imposto de Renda incidente nos resgates de planos com menos de dez anos, e, especialmente, os com menos de cinco anos.
Há algo que o investidor possa fazer? Sem dúvida. Ele pode negociar os custos incidentes sobre sua aplicação, ou pode mudar de plano, levando suas reservas para outra operadora que lhe ofereça melhores condições.
Com a consolidação do novo cenário, a concorrência entre as operadoras de planos complementares deve se acirrar. Com isso quem leva vantagem é o investidor que tiver cabeça e competência para negociar um melhor desempenho para sua aplicação.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 25/09/2017.
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