A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de anular o julgamento que condenou Aldemir Bendine por ter recebido R$ 3 milhões da Odebrecht para facilitar contratos da empreiteira com a Petrobras, que presidia na ocasião, pode ter um efeito cascata nos julgamentos da Lava-Jato e, no limite, permitir anulação do julgamento do ex-presidente Lula.
Sérgio Moro, quando juiz de primeira instância, condenou Bendine e vários outros réus usando o mesmo critério, que agora está sendo contestado pela Segunda Turma. O Tribunal Regional Federal da 4 Região (TRF-4) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) referendaram a decisão de Moro, apesar dos apelos da defesa.
O caso acabou no STF. A defesa de Bendine sustentou que o réu deveria ter tido o direito de apresentar suas “alegações finais” depois dos delatores, réus como ele, pois teriam se transformado em “assistentes de acusação”. A lei garante que a defesa tenha a palavra final, depois da acusação.
Moro rejeitou a tese, por absoluta falta de “previsão legal, forma ou figura em Juízo”. E explicou: “A lei estabelece prazo comum para a apresentação de alegações finais, ainda que as defesas não sejam convergentes, e não cabe à Justiça estabelecer hierarquia entre acusados, todos com igual proteção da lei”.
A decisão da Segunda Turma, com os votos favoráveis dos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Cármem Lúcia, foi de certo modo surpreendente, pois não há na legislação exigência desse tipo, porque o instituto da delação premiada ainda é novo na nossa legislação penal. O Código de Processo Penal exige demonstração de prejuízo para a defesa para que o processo seja anulado, e os ministros entenderam que o fato de dar o mesmo prazo para todos os réus, quando alguns eram delatores, feriu os direitos de Bendine.
Justamente por ser uma decisão sem precedentes, o caso deve ser levado ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Também por ser um procedimento comum nos julgamentos, é possível que vários outros advogados de defesa, que tiveram seus recursos negados por Moro, reivindiquem a mesma decisão.
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Até mesmo a defesa do ex-presidente Lula já anunciou que fará uma revisão dos processos para ver se pode se beneficiar da decisão. Pela reação do advogado Cristiano Zanin, ele não deve ter feito na ocasião esse pedido, e agora haverá outra batalha jurídica: pode a defesa alegar um prejuízo depois que o julgamento passou por todas as instâncias sem que o pedido fosse feito no momento oportuno?
Os julgamentos presididos pelo então juiz Sérgio Moro seguiram certamente o critério único, pois ele considera que “o acusado colaborador não se despe de sua condição de acusado no processo. Apenas optou, com legitimidade, por defender-se com a pretensão de colaborar com a Justiça. Acolher o requerimento da Defesa de Aldemir Bendine seria o equivalente a estabelecer uma hierarquia entre os acusados, distinguindo-os entre colaboradores e não colaboradores, com a concessão de privilégios aos últimos por não terem colaborado.”
Se acolhesse a pretensão de Bendine e de outros réus em outros julgamentos, Moro correria o risco de a defesa do colaborador também alegar nulidade. Parece absurdo anular uma sentença com base em filigrana processual sem base legal.
Proximidades conceituais
Em 2016, quando ainda era candidato à presidência dos Estados Unidos, Donald Trump twitou: “It´s better to live onde day of Lion than 100 years as a sheep”.
Semana passada, Bolsonaro traduziu, adaptando: “Mais vale um segundo da minha vida como águia do que cem anos como cordeiro, aceitando tudo”.
Estaria copiando seu ídolo Trump, apenas adaptando o pensamento? Não. Ambos copiaram Mussolini: È meglio vivere un giorno da leone, che cent´anni da pecora.”
Fonte: “O Globo”, 28/8/2019