Estamos tão acostumados a viver sob a égide da coerção estatal que não conseguimos mais discernir a diferença de imposto e taxação não-coercitiva.
Quando me pedem para dar um exemplo de um lugar onde o governo pratica a taxação não-coercitiva e eu respondo, aqui mesmo, no Rio Grande do Sul, as pessoas franzem a testa num misto de espanto e curiosidade antes de me perguntarem, aqui?
Sim, aqui. Qual a diferença entre imposto é taxação não-coercitiva? Imposto é quando o governo nos obriga a pagar sem apelação. Não importa se iremos utilizar os seus serviços ou não, ele vem e nos impõe o pagamento. Tampouco importa se ele vai prestar o serviço, a conta vem e devemos pagar incondicionalmente.
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Exemplo desse imposto ocorre com toda transação comercial onde há a circulação de uma mercadoria, não temos a opção de recusarmos o pagamento, mesmo que a gente não queira usufruir da proteção do governo sobre aquele contrato de compra e venda. Faria sentido esse imposto ser opcional, porque poderíamos decidir que iríamos querer o governo tutelando aquele contrato ou não, para o caso de haver algum tipo de fraude ou descumprimento. Se o governo cobrisse o contrato porque nos resolvemos pagar a taxa cobrada pelo governo, esse valor pago deixa de ser coercitivo para ser não-coercitivo ou opcional. Obviamente que não havendo o pagamento da taxa, o governo ficaria isento de impor coercitivamente que o contrato fosse cumprido, como faria com uma lei.
A taxação não-coercitiva exige a contraprestação de serviços os quais servirá como fato gerador da taxação.
Ora, desta forma, contratar os serviços do governo seria opcional mas, obviamente, se o serviço viesse a ser contratado o pagamento é obrigatório. Como é obrigatório quando entramos no supermercado, fazemos as compras e pagamos antes de sair ou quando contratamos um seguro que poderá ou não ser utilizado porque não ocorreu nenhum sinistro que justificasse a sua utilização.
Com essa explicação, espero que seja mais fácil percebermos que, por exemplo, quando contratamos um advogado e entramos com um processo na justiça contra alguém, seja ele criminal ou cível, o foro exige que paguemos às custas processuais judiciais. Mas isso não configura uma cobrança coercitiva como um imposto, pagamos por que por iniciativa própria, por livre escolha, resolvemos estabelecer uma demanda que mobiliza o governo a trabalhar em nosso favor.
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Ninguém paga imposto para ter serviços prestados pelo governo. Pagamos impostos porque somos obrigados sob pena de perdemos mais do que o dinheiro do imposto cobrado. Podemos perder o dinheiro do imposto, multas, juros e talvez até a liberdade ou a vida se resistirmos contra a coerção estatal.
Os serviços de segurança e justiça prestados pelo governo são essenciais para se coibir a violência na sociedade, mas esses serviços podem ser cobrados de diversas maneiras não-coercitivas ou opcionais. Taxas sobre contratos a serem tutelados, custas judiciais, taxas por serviços prestados mediante demanda são apenas as formas básicas que poderiam financiar o governo de maneira que ele nos servisse sem nos espoliar.
Sim, vá ali no foro de Porto Alegre, experimente usar o judiciário sem pagar, ninguém moverá um dedo por você da mesma forma que se você comprar um televisor nas Americanas, não receberá a encomenda sem pagar.
Sabemos que o judiciário gaúcho, por exemplo, recebe além das custas, o duodécimo dos impostos cobrados pelo governo estadual. Não tenho esse número, mas me parece que para cada real cobrado com as taxas não-coercitivas, o judiciário recebe dois ou três reais de impostos. Por que tanto? Provavelmente porque o volume de ações envolvendo o próprio governo e também o inferno jurídico-tributário onde vivemos exacerba o volume de conflitos judiciais.
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Se tivermos uma legislação racional e cobrança de taxas não-coercitivas em vez de impostos escorchantes e irrecorríveis, o governo seria muito menor, mais eficiente e menos custoso, podendo subsistir tranquilamente apenas do que for pago voluntariamente por quem quiser contratar os seus serviços.
Isso é utópico? Claro que não. Isso é o ideal. O fato de que a justiça já funciona assim, ainda que parcialmente, desfaz a ideia de utopia quanto à taxação não-coercitiva. Com o advento do blockchain, os custos cartoriais que fazem parte do serviço de justiça, podem baratear e tornar mais confiáveis esses serviços. O que precisamos fazer é parar de resistirmos às ideias disruptivas que colocam em xeque os modelos com os quais estamos acostumados a viver.
Quem imaginava há 5 anos que poderíamos com o apertar de poucos botões, chamar um estranho para nos levar de um ponto a outro da cidade sem que o carro fosse laranja, tivesse um taxímetro e fosse dirigido por um privilegiado pela prefeitura? O cara seria chamado de louco ou se tornaria um bilionário por trás de uma marca chamada Uber.
Fonte: “Instituto Liberal”, 04/07/2018