O ministro Ricardo Lewandowski, um dos sete membros do STF que defenderam o aumento salarial dele e de seus pares, disse que se tratava de “modestíssimo reajuste”. Na verdade, uma elevação de 16,38% não é “modestíssimo” em qualquer lugar, mesmo que se considere os anos passados desde o último aumento. O contracheque dos ministros vai chegar perto de 40.000 reais mensais (fora acréscimos), sem contar o efeito cascata nos salários de magistrados país afora, o que elevará a conta para 4 bilhões de reais em 2019.
O ministro se valeu de estranho raciocínio para justificar o reajuste, que pode acontecer em um momento de grave crise fiscal e da existência de mais de treze milhões de brasileiros desempregados (sem contar os muitos milhões que desistiram de procurar emprego). Para ele, o gasto adicional será menor, pois o Judiciário, via Operação Lava Jato, recuperou mais de 1 bilhão de reais surrupiados da Petrobras.
Lewandowski cometeu dois equívocos. Primeiro, esqueceu-se de considerar em seu cálculo o efeito cascata do reajuste salarial dos ministros do STF. Segundo, confundiu estoque com fluxo.
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De fato, o gasto adicional do reajuste será uma elevação do estoque de gastos salariais, o que acarretará um fluxo permanente, isto é, vai ocorrer todos os anos e para sempre, sem contar futuros aumentos que levarão em conta a inflação dos anos vindouros.
Assim, para que o aumento dos salários dos magistrados fosse compensado com a recuperação de valores pela Operação Lava Jato seria necessário que ocorresse um fluxo de recuperação desses valores todos os anos, para sempre e igualmente reajustados pela inflação futura. Qualquer um sabe que isso não acontecerá.
Além do mais, a recuperação dos desvios na Petrobras são parte inerente do trabalho de procuradores e juízes da Operação Lava Jato. É sua obrigação lutar pela maior devolução possível dos correspondentes recursos. Não é próprio justificar assim os novos gastos.
O ministro precisa encontrar outra justificativa para convencer a sociedade e o Congresso de que, em meio a tantas dificuldades que o país enfrenta, o Supremo possa ser insensível ao efeito do aumento salarial nas contas da União e de suas consequências nas finanças estaduais, que estão piores do que as federais.
Fonte: “Veja”, 10/08/2018