O gás natural tem se consolidado cada vez mais como importante energético de transição para uma matriz limpa. Por ser o combustível fóssil com menor emissão de gases do efeito estufa, tem sido usado para garantir segurança energética e redução de emissões em matrizes elétricas com predomínio de renováveis intermitentes de baixo impacto.
Na média global, o gás natural foi responsável por 25% da oferta de energia em 2018. Os Estados Unidos (EUA) se destacam nesse mercado, com o gás natural sendo responsável por 31% da demanda energética do país. O consumo americano é de aproximadamente 2 bilhões de m³/dia, mais de 20 vezes o registrado no Brasil. Mais impressionante ainda é a diferença na extensão de gasodutos de transporte e distribuição, com os EUA registrando mais de 4 milhões de quilômetros e o Brasil com menos de 50 mil. Mesmo com essa extensão de gasodutos o mercado americano ainda está carente dessa infraestrutura.
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A viabilização do shale gas aumentou consideravelmente a produção americana, principalmente a partir de 2005, transformando os EUA no maior produtor global em 2011. Em 2016, o shale gas alcançou 60% da produção total e contribuiu de forma decisiva para o país passar a ser exportador líquido de gás natural a partir de 2017.
Apesar da produção americana de gás natural estar atingindo níveis históricos e crescentes, o desenvolvimento da infraestrutura local não está acompanhando esse movimento. A construção de novos gasodutos virou uma questão política, com forte pressão de agentes contrários à expansão dos combustíveis fósseis, o que dificulta a ampliação e a modernização da infraestrutura. Mesmo o país já possuindo uma malha muito extensa, ainda existe uma grande desigualdade entre as regiões.
Enquanto a rede de distribuição de Nova York não tem capacidade de atender a novos clientes, no Texas tem aumentado a queima de gás. As desigualdades também são registradas nos preços praticados entre os Estados. Em um ponto de entrega de gás localizado em Sumas (Washington), o preço comercializado chegou ao patamar histórico de US$ 200 por milhão de BTU (British Thermal Units) em março, durante um inverno rigoroso em que a região enfrentou problemas na oferta. Por outro lado, o preço em um ponto de entrega próximo a Midland (Texas) durante a primavera atingiu US$ 9 negativos por BTU, ou seja, os consumidores recebiam para dar vazão à produção.
Esse mesmo cenário poderia ser usado para retratar o mercado brasileiro de gás natural, apesar da evidente discrepância na infraestrutura entre os dois países. Apenas 4% dos domicílios no Brasil têm acesso a gás encanado e a desigualdade regional também é grande. Enquanto a região Sudeste concentra 60% da demanda e 80% da malha, o Centro-Oeste, de baixa densidade demográfica, mas grande importância econômica pelo agronegócio consome apenas 1% do total nacional e só tem 324 quilômetros de rede.
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A dificuldade de interiorizar o gás se reflete na baixa participação desse energético na nossa matriz, estagnada em cerca de 13% há anos. Enquanto isso, os derivados de petróleo seguem responsáveis por um terço da oferta total. Essa diferença é consequência, principalmente, da dificuldade em expandir a infraestrutura para ampliar a oferta de gás natural. É bom lembrar que o gás natural é uma indústria de rede. Portanto, o crescimento do mercado e a existência de um preço competitivo está diretamente ligado à expansão de suas redes.
Medidas recentes, como a aprovação do TCC entre Cade e Petrobras para abertura do mercado de gás e a discussão do Brasduto para financiar a expansão da malha de gasodutos, serão fundamentais para desatar os nós do setor. Só assim será possível promover o aumento da demanda e o aproveitamento da oferta adicional do pré-sal. Caso contrário, o mercado seguirá com um crescimento pífio e, ao invés, de redução de preços teremos aumento para os consumidores. É bom sempre olhar para o que está acontecendo no mercado americano. E entender que gás natural é uma indústria de rede.
Fonte: “Poder 360”, 16/07/2019