O sistema de poder perdeu sua intrínseca capacidade de realização. Há uma evidente desconexão de perspectivas: temos problemas públicos graves, urgentes e numerosos frente a uma política lerda, solene e irresponsável. A democracia, assim, patina sem sair do lugar, potencializando a insatisfação cívica e as tensões sociais. Portanto, ou a política muda, ou será mudada pelas circunstâncias.
Ora, se uma lei necessária ao Brasil não é votada no Congresso Nacional, nada acontece com os políticos que lá estão. Isso é simplesmente inaceitável e demonstra o quão primária é a democracia brasileira.
Aqui, a solução é reta: temos que estabelecer um sério regime de produtividade parlamentar que possibilite mandar mais cedo para casa os políticos que trabalham pouco ou mal. No plano macro, a classe política é, em larga medida, descomprometida com o bem dos brasileiros. Acontece que o jogo mudou; atualmente, através da democratização das redes sociais e da popularização dos smartphones, os casos de corrupção ao espírito público pipocam freneticamente na mão de cada cidadão, insuflando a indignação coletiva.
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Nessa sociedade tensionada, o competente exercício do Poder Executivo se transformou em função estratégica decisiva para a nova dinâmica democrática. Para além de reduzir burocracias e potencializar a eficiência pública, o presidente da República, governadores e prefeitos devem encaminhar aos respectivos parlamentos projetos de lei para: (i) modernizar o País, tornando-o atrativo e favorável a negócios e investimentos privados; (ii) conter o déficit e reduzir o endividamento público; (iii) educar crianças, jovens, adultos e idosos às lógicas das economia digital, viabilizando empregabilidade cíclica e contínua; e (iv) auxiliar os desvalidos frente às dores da miséria absoluta.
As medidas citadas, embora não lineares, são para amanhã. Aliás, muitos projetos legislativos já existem e estão prontos para serem votados. É claro que, como toda e qualquer atividade humana, há o espaço de construção do possível que exige capacidade de compor diferenças e inteligência para criar soluções de impacto. O recente esforço da Assembleia Legislativa gaúcha em aprovar a reforma previdenciária, associado à eficaz habilidade negocial do promissor titular do Piratini, bem demonstra que, com a arte da boa política, os caminhos existem e se tornam reais.
Fonte: “Jornal do Comércio”, 04/03/2020