Há cerca de um ano as expectativas de mercado para a inflação de 2017 se encontravam ao redor de 5,7% e em trajetória ascendente, atingindo um pico ao redor de 6,0% em março de 2016. Já os dados mais recentes apontam para algo próximo a 4,7%, ainda um tanto superior à meta, mas em nítida queda.
Da mesma forma, as expectativas para 2018 e 2019 bateram as máximas no final do primeiro trimestre de 2016, para então recuar até 4,5%, marcando a reconquista da credibilidade do BC no período.
Essa afirmação não significa que a inflação vá seguir exatamente a trajetória acima descrita. Pelo contrário, muito provavelmente isso não ocorrerá. Por mais que bancos centrais calibrem sua política monetária com o maior esmero possível, não há como garantir que em dezembro de cada ano a inflação se encontrará precisamente na meta.
Como há defasagens longas entre a decisão de política monetária e a reação da inflação, eventos imprevisíveis tipicamente a desviam sem que haja tempo para o BC corrigir o rumo ainda dentro do ano-calendário.
Por exemplo, uma redução inesperada dos preços de combustíveis, digamos, em novembro de um determinado ano faria o IPCA escorregar para baixo da meta no período, independentemente de qualquer ação do BC a respeito.
O que se espera, portanto, sob um regime de metas para a inflação é que esta oscile pouco ao redor do objetivo, isto é, que sua média num horizonte de dois ou três anos fique bastante próxima do valor perseguido, com desvios relativamente modestos em cada período, aumentando a previsibilidade do ambiente econômico.
Com efeito, sob um cenário como esse, uma empresa, ao avaliar um projeto de investimento, pode, com mais certeza, presumir que a inflação ficará em torno da meta durante o horizonte desse investimento, não por sorte, mas porque sabe que o BC estará continuamente agindo para contrabalançar eventuais desvios, ajustando a política monetária para compensar os fatores que os provocam.
É nesse sentido que se avalia positivamente a reversão das expectativas, por mais que as projeções do Focus tenham demonstrado certa tendência a subestimar a inflação futura. Isso sugere que o BC recuperou a capacidade de ancorar as expectativas, que havia sido perdida –depois de duramente conquistada– pela gestão anterior.
Em conjunto com a queda da inflação observada em 2016 (objeto da coluna da semana passada), e que deve continuar ao longo deste ano, esse desenvolvimento representa um sério golpe na tese da
“dominância fiscal”. Esta última afirmava que, em face da óbvia deterioração das contas públicas e, consequentemente, da dívida do governo, o BC teria perdido a capacidade de influenciar tanto a inflação corrente quanto as expectativas inflacionárias.
Apontava, em particular, que estaríamos em um mundo no qual as relações usuais funcionariam ao contrário, a saber, que a redução da taxa de juros levaria à queda da inflação e vice-versa.
Os fatos, sempre eles, porém, trataram de enterrar a elegante teoria sob toneladas de dados.
Com isso não se pretende minimizar a gravidade do problema fiscal nem negar que a dominância fiscal possa se materializar caso o problema não seja devidamente tratado. Mas resta hoje pouca dúvida de que a tese se mostrou equivocada. Melhor sorte na próxima vez.
Fonte: Folha de S.Paulo, 24/01/2017.
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