Os portos brasileiros precisam de recursos com urgência. O governo brasileiro, no entanto, investiu U$ 682 milhões nos últimos três anos na construção do Porto de Mariel, em Cuba — conforme revela matéria publicada na Revista “Veja” da semana passada. Segundo a reportagem, o BNDES emprestou três vezes mais dinheiro ao país caribenho do que destinou a melhorias e ampliações no Porto de Suape, no Nordeste, desde sua inauguração, em 1983.
O BNDES financiou 71% do orçamento da construção do terminal cubano, que terá capacidade 30% superior ao porto nordestino, diz a Veja. De acordo com os especialistas do Instituto Millenium Luiz Felipe Lampreia e Rubens Barbosa, a opção por investir em Cuba atende a um critério ideológico. “Não é segredo nenhum que o governo PT tem uma afinidade especial com Cuba, que é tratada como um país amigo, embora seja completamente decadente, um fracasso completo do ponto de vista do seu regime, que não consegue nem alimentar o seu povo e tratá-lo com respeito. Há uma visão ideológica, sem dúvida”, diz Lampreia, ex-ministro de Relações Exteriores do Brasil.
De acordo com Lampreia, a opção pelo investimento no país caribenho não configura um problema para as relações do Brasil com outras nações. “É normal competir por oportunidade de negócios”, diz. Barbosa, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior (Coscex) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e ex-embaixador do país em Washington, também descarta qualquer tipo de consequência para as relações com outros países, embora acredite que priorizar questões políticas ao decidir onde aplicar os recursos pode ser considerado um ponto negativo. “Financiamento a regimes autoritários na África e na América Latina beneficiam empresas brasileiras que prestam serviços e exportam produtos brasileiros, mas esse aspecto positivo é contrabalançado pelo critério político na escolha dos países, como foi o caso de Cuba”, explica ele.
O engenheiro civil e professor Adilson Luiz Gonçalves, especializado em Construções e Obras Públicas, concorda que seja importante a participação de empresas brasileiras no exterior como forma de intercâmbio de tecnologia e aquisição de competitividade. Mas ressalta que, independentemente das questões ideológicas, o investimento estrangeiro precisa ser um bom negócio para o país. “Resta saber em que condições são feitos esses financiamentos e se são compatíveis com as oferecidas internamente. É fundamental que haja retorno financeiro desses investimentos, pois trata-se de dinheiro público”, afirma.
De acordo com a “Veja”, a participação anual do governo brasileiro no Porto de Mariel é de U$ 227,4 milhões, enquanto, em 2013, o governo investiu U$ 15,5 milhões nos terminais brasileiros. Para Barbosa, ao direcionar tantos recursos para Cuba, o governo deixa de priorizar o Brasil. “O financiamento a Cuba não gera qualquer problema na comunidade externa, mas esses recursos deixam de ser utilizados para a melhoria dos portos brasileiros”, diz ele.
Lampreia desconfia que o valor de U$ 15,5 milhões direcionados aos terminais brasileiros não esteja correto — “Acho baixo”, disse — mas concorda que o país não investe o suficiente no setor. “E isso, inclusive, vai ter que ser resolvido. Agora temos nova legislação e acredito que vão aumentar os investimentos em portos, um ponto de estrangulamento para a exportação brasileira”, afirma o ex-ministro, se referindo à medida provisória aprovada em maio do ano passado pelo Congresso Nacional, que promete aumentar os investimentos no setor, um dos principais pontos de estrangulamento da economia brasileira.
Além de novos terminais, o Brasil precisa modernizar a rede já existente. “Os portos são uma parte da cadeia logística que sofre os efeitos de todas as deficiências nos elos anteriores. Silagem deficiente, déficit em ferrovias, hidrovias e dutovias, rodovias precárias… Tudo isso ‘deságua’ nos portos, onerando física e ambientalmente as cidades e encarecendo fretes”, explica Adilson, acrescentando que o país não pode esperar mais por investimentos em infraestrutura. “As obras são indispensáveis ao crescimento do país, não apenas do ponto de vista econômico, mas também do social”, afirma.
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