No início dos anos 1990, por iniciativa do Itamaraty, conjuntamente com outros órgãos governamentais e instituições privadas, o Brasil partiu acertadamente para uma aproximação gradual com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Essa estratégia segue sendo aplicada pelo governo atual, embora de forma reativa e menos coordenada.
O Brasil nunca procurou uma adesão formal à OCDE, que dependeria de reformas e da defesa de interesses nacionais à luz do conjunto de regras da organização.
[su_quote]As mudanças comandadas pelo ministro Joaquim Levy podem se beneficiar da adesão à OCDE[/su_quote]
A estratégia de aproximação sempre visou à participação nos trabalhos da OCDE como mais um instrumento para apoiar o desenvolvimento do país: modernizar a economia, fortalecer os mecanismos de regulação, aprimorar as políticas públicas e promover reformas estruturais e institucionais.
O nosso engajamento na OCDE serviria para enriquecer os processos de reflexão e de formulação de políticas. Permitiria colher lições de experiências de 34 países que em conjunto somam cerca da metade da corrente de comércio do Brasil, a maioria esmagadora dos investimentos diretos estrangeiros no país e da capacitação dos nossos cientistas e engenheiros em pesquisa, doutorado e pós-doutorado no exterior.
Em contraste com outros organismos econômicos (como o Bird, o FMI, a OIT e a OMC), a OCDE tem um escopo temático mais abrangente. Reúne capacidade para integrar temas de diferentes perspectivas. Atua em várias frentes do G-20, tais como monitorar medidas restritivas do comércio e dos investimentos internacionais, combater a corrupção e outros ilícitos transnacionais, aprimorar a governança corporativa e a responsabilidade social das empresas, revisitar as regras internacionais de tributação contra a erosão fiscal, compreender as relações entre emprego e comércio e o papel das cadeias globais de valor, identificar políticas e reformas estruturais para revigorar o crescimento de cada país de modo sustentado e equilibrado.
O reconhecimento do papel da OCDE na construção da ordem econômica internacional não pode ser passivo, mas ativo e crítico. Deveria estimular a organização a reconciliar interesses e objetivos de países desenvolvidos e em desenvolvimento – uma missão implícita nos mandatos que lhe atribui o G-20. Cabe ao Brasil, membro desse grupo e tradicional advogado do desenvolvimento, ser um dos líderes nesse processo. Como outras organizações econômicas internacionais, a OCDE não logrou antecipar a crise financeira internacional iniciada nos EUA, tampouco denunciar convincentemente desequilíbrios – mesmo entre países-membros. Ao
Brasil e à comunidade internacional interessa que a OCDE corrija consideráveis falhas em análises e prescrições, feitas individual ou coletivamente, para países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Hoje a OCDE negocia a adesão da Colômbia e da Rússia, entre outros países, e intensifica relações com países do Sudeste Asiático. Deseja, sobretudo, a participação ampla e regular e mesmo, se possível, a adesão do Brasil e dos outros Brics.
[su_quote]O ingresso do Brasil na OCDE seria uma estimulante decisão de política externa com amplos reflexos na economia[/su_quote]
Da integração dos Brics – a OCDE não esconde – dependerão não só o alcance e a credibilidade dos seus trabalhos, mas também a superação de seu déficit de representatividade. São essenciais todas essas condições para que a OCDE continue a desempenhar papel influente e global. Por essa razão, a OCDE já vem incluindo os Brics sistematicamente em todos os seus principais estudos e relatórios. Ademais, faculta a estes participar de virtualmente todos os 200 comitês e organismos da OCDE, dedicados a distintos setores e temas.
De sua parte, o Brasil, como outros Brics, participa, em diferentes modalidades, de cerca de um terço desses comitês e organismos. Essa presença é, porém, ainda discreta, sem que o país exerça a influência correspondente ao seu peso internacional dentro da OCDE, exceto em alguns poucos foros – por exemplo, o encarregado do programa internacional de testes de educação (Pisa).
Tanto diante da internacionalização da economia como para a consecução dos objetivos de desenvolvimento do país, são três as vantagens que se tornam cada vez mais evidentes para o Brasil numa eventual adesão à OCDE:
1) Comparar políticas econômicas e públicas aplicadas por países, muitos dos quais mais desenvolvidos, e aperfeiçoar práticas, por exemplo, em matéria de eficiência de políticas econômicas em prol do crescimento, de desenvolvimento da capacitação em C&T e da inovação industrial, de aprimoramento das políticas nas áreas de educação, saúde e inclusão social em geral.
2) Influenciar, com base em nossa experiência e nossos interesses, inclusive como país em desenvolvimento, a concepção de estatísticas internacionais, bem como a identificação e a difusão de “boas práticas” de políticas econômicas públicas;.
3) Participar ativamente – e não reativamente – da definição de parâmetros e regras internacionais que, inicialmente aplicadas pelos países-membros, acabam se tornando elementos centrais em negociações multilaterais, (inter)regionais e mesmo bilaterais, por exemplo, nas áreas de tributação, comércio, investimentos, agricultura, finanças (inclusive créditos e garantias à exportação), propriedade intelectual, energia e mudança do clima.
As mudanças comandadas pelo ministro Joaquim Levy para dinamizar a economia e torná-la mais produtiva e competitiva podem se beneficiar da adesão à OCDE. O Brasil poderia retirar lições comparadas, identificar subsídios para nossas políticas, fortalecer a ação de nossa diplomacia econômica e melhor projetar no mundo nossas experiências e “boas práticas”.
Novo governo, novas ideias. O ingresso do Brasil na OCDE seria uma estimulante decisão de política externa com amplos reflexos na economia.
Fonte: O Estado de S.Paulo, 10/02/2015.
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