O portal da revista britânica “The Economist” (7/4) publicou os resultados surpreendentes de pesquisa a respeito do apoio dos brasileiros ao livre mercado: 67% o apoiam. O país está em segundo lugar, abaixo apenas da Alemanha e razoavelmente acima dos EUA, a pátria mãe do capitalismo do século 20. O resultado contradiz boa parte do que anda pela mídia e a maioria ainda das declarações de autoridades governamentais.
Viva!
Visto tradicionalmente como o patinho feio do apoio ao livre mercado e cercado de declarações oficiais intervencionistas e a favor do Estado “indutor do desenvolvimento” e coisas que tais, 43% dos brasileiros surpreenderam ao concordar fortemente com a afirmação de que a economia de livre mercado é o melhor sistema econômico. Somados aos 24% que concordam em parte com a afirmação, o Brasil ficou bem acima de outros países considerados pelo senso comum (que é o menos comum de todos os sensos) fortes bastiões do livre mercado.
Qualquer pesquisa é um retrato que se tira de uma realidade. Bem feita, reflete a realidade. Prefiro acreditar que tenha sido o caso desta. Outra pesquisa, daqui a algum tempo, pode mostrar uma foto diferente. Mas vamo-nos ater um pouco à análise da realidade desta pesquisa.
A primeira coisa que chama a atenção é uma aparente dissonância cognitiva entre o que acham os brasileiros entrevistados pela pesquisa e boa parte das elites políticas e burocráticas brasileiras. Na sua maioria, elas descreem do apoio que o livre mercado tem por parte dos brasileiros. Muitos serão apanhados de surpresa. Fiquemos alerta, porque choverão contestações à pesquisa. Isso porque as crenças do Estado brasileiro e da maior parte dos governos (mesmo os mais liberais) sempre mantiveram a cantilena da conveniência e do desejo da população brasileira de que o intervencionismo estatal seria a melhor opção.
Mas a realidade mostrou-lhes que a parte mais sensível do corpo humano é mesmo o bolso. Em geral utilizado para justificar penas monetárias e multas para transgressões, o ditado agora parece aplicar-se muito fortemente às benesses monetárias.
Trocado em miúdos, o povo está com mais dinheiro e aprendeu que pode ganhar mais ainda e viver melhor, em que pese a pressão do Estado para que as pessoas adotem atitudes menos liberais.
Mais irônico ainda é que isso tenha ocorrido depois de oito anos de governo Lula, considerado por muitos um governo claramente “de esquerda”, e da eleição de Dilma Rousseff, que confirmou a predileção do povo brasileiro por um governo de continuação, mas que permitiu que os pobres melhorassem de vida (ver meus artigos O dia em que os pobres enriqueceram, Banco Central, o amigo do pobres e Uma perspectiva liberal do Bolsa-Família, publicados no “Estado”).
O Banco Central era uma caixa-preta demoníaca para o governo Itamar Franco. O Bolsa-Família era a grande indignação para as elites, porque, alegadamente, iria dar dinheiro aos pobres sem que eles precisassem trabalhar. O fim da inflação matou a noção predominante entre os economistas inflacionistas (que adoram se chamar de “desenvolvimentistas”) de que ela era boa e acelerava o desenvolvimento.
A percepção equivocada da oposição sobre o Bolsa-Família ignorou um dos aspectos básicos de economia: a vida fica mais fácil para todos, simplesmente, se existir dinheiro. O leitor perguntará: mas como existir dinheiro? Ele sempre existiu. Isso não era verdade. Em boa parte do Norte e do Nordeste não havia dinheiro como os urbanos modernos o entendem, isto é, como um meio de troca que facilita o comércio e a indústria (aqui considerada como qualquer tipo de produção). Isso porque, com a existência de dinheiro, as pessoas podem trocar habilidades e competências com muito mais eficácia, produzindo aquilo em que são mais competentes (por exemplo, buchada de bode), e consumir serviços como os de cabeleireiros, manicures, ou vendedores de produção agrícola.
Não sei se o Bolsa-Família e seus predecessores atiraram no que viram e acertaram no que não viram, mas, claramente, foi bom para o capitalismo brasileiro.
Em reunião recente com banqueiros, quase todos do Sul e do Sudeste (só um do Nordeste), notei um desconhecimento total dos sulistas da capilaridade exercida pela distribuição de um pouco de dinheiro (o Bolsa-Família custa o equivalente a mais ou menos sete Senados Federais, barato, portanto).
O banqueiro do Nordeste ficou pasmo com o desconhecimento de seus colegas. Suas palavras: “Minha família tem banco há três gerações e nosso negócio sempre foi muito limitado. A partir da existência de dinheiro no Nordeste, os negócios do banco cresceram e até precisamos criar uma empresa para transportar dinheiro, antes praticamente inexistente” na região.
Esperemos que esses resultados reduzam a dissonância cognitiva das elites que vestem togas esquerdistas e as ajudem a buscar uma consonância, ajustando suas percepções ao que os brasileiros querem, por razões simples: sem inflação o País cresce mais sustentavelmente e com dinheiro no bolso as pessoas progridem mais, fazem mais negócios e todas melhoram de vida.
É irrelevante a retórica que o governo utilizará se o resultado for bom. Como dizia Deng Xiaoping, não importa a cor do gato, desde que ele mate o rato.
Falta aceitar que mais dinheiro circulando produz mais progresso para todos e para cada um, e as pessoas serão mais felizes.
O próximo passo é liberar dinheiro que o governo expropria dos cidadãos por meio de impostos altíssimos e o deixe nas mãos de quem produz e ganha, para gastar como quiser.
O somatório das felicidades pessoais é fator fundamental da felicidade coletiva.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 12/04/2011
Aceitar o livre mercado não significa entendê-lo. Alexandre Barros, por exemplo, não tem uma compreensão perfeita do livre mercado, a supor por este seu artigo. As pessoas aceitam o livre mercado porque é evidente as vantagens que recebem, mas aprovam medidas que contradizem o livre mercado e favorecem o coletivismo.Assim, Barros bate palmas para a bolsa familia e usa expressões estranhas como “dinheiro circulando” e outras esquisitices que nada a ver com o livre mercado.