Normalmente se debate tanto a elevada e crescente carga tributária quanto o destino do montante arrecadado. Acontece que precisa ser também avaliada a forma pela qual os tributos são cobrados da sociedade, incluindo a maneira pela qual as autoridades tributárias nos diversos níveis de governo se relacionam com os contribuintes diante de problemas acarretados tanto por mudanças bruscas na legislação, quanto por novas interpretações do emaranhado tributário, sobretudo no que a cobrança de multas e juros de mora aparenta ser uma punição arbitrária, desmesurada e portanto injusta.
Há quem argumente que uma maior dificuldade para cumprir as exigências tributárias fomentaria a informalidade. Todavia, fora do ambiente da formalidade existe um processo ilegal de “arrecadação”, que recorre a ameaças enfáticas e sumárias à integridade física e moral de pessoas com medo. Por isso, deve-se valorizar a economia formal, que oferece a perspectiva dos tributos serem criados por legislação, após um debate transparente. Ademais, o montante arrecadado deve ir para o Estado em prol da sociedade e não em benefício de quem usurpou o poder pela força e age ilegalmente.
Ocorre que uma complicada burocracia tributária leva à reflexão do porquê de investir num negócio que poderá ser fiscalizado de forma complexa por servidores públicos se há alternativas mais cômodas de investimento. Devido à burocracia tributária talvez fiquem em aplicações financeiras recursos que, ainda que não sejam vultosos, poderiam ser destinados à abertura e à expansão de pequenas empresas formais, as quais empregariam mais pessoas e, em muitos casos, ofereceriam empregos mais criativos.
Muitos empresários de pequenas empresas não são de fato movidos pela pressão da rentabilidade, tal como se verifica em executivos de grandes corporações, que disputam a captação de recursos dos competitivos mercados de capitais e financeiros. O empreendedor comum possivelmente avalia que o êxito de uma realização não pode ser medido apenas pelo resultado financeiro: vale também a satisfação pessoal pela sensação de fazer algo construtivo. Quem tem tal mentalidade é motivado com a realização de um projeto, que iniciou como um sonho e no qual o lucro obtido, sobre o qual incidem tributos, é apenas uma consequência da sintonia entre o cerne da missão empresarial e a reação do mercado. Assim, a expansão de negócios inovadores decorre da dedicação empresarial em um ambiente com menos entraves possíveis.
O pesadelo de aborrecimentos burocráticos esmaece o sonho empresarial e, assim, arrefece a motivação em focar uma atividade geradora de produtos, serviços ou empregos, que irradia bem-estar. Não é nada fácil acompanhar tanto os pagamentos de diferentes tipos de obrigações tributárias para um mesmo evento, quanto os envios periódicos de várias declarações às autoridades tributárias, incluindo as declarações acessórias, cuja frequência ou complexidade tende a crescer.
O esforço para instalar no computador o programa tributário correto, a constante preocupação em ter sempre instalada a versão mais recente e sobretudo o cuidado em assegurar o preenchimento correto de cada declaração tributária assoberbam os empresários, especialmente aqueles de pequenas empresas.
Já os funcionários em grandes corporações estão inseridos numa estrutura hierárquica muito similar à existente no funcionalismo público e portanto podem lidar mais facilmente com as relações de poder e com as exigências para a tramitação de processos simples, as quais podem ser fatais às pequenas empresas até pela demora. Ademais, o estamento pode ampliar as obrigações tributárias a fim de reforçar sua relevância e justificar a contratação de mais servidores com salários, benefícios, aposentadorias e pensões pagas pelo contribuinte. Em contrapartida, podem os contribuintes exigir um atendimento efetivo e cortês e igualmente denunciar com eficácia aqueles servidores que ignoram, desorientam e até destratam quem pede uma solução para um problema tributário?
É importante que as autoridades tributárias tenham poder para exigir dos contribuintes um comportamento correto, porém sem abusos, lembrando Montesquieu: “A experiência eterna mostra que todo homem que tem poder é tentado a abusar dele; vai até onde encontra limites. Quem diria! A própria virtude tem necessidade de limites. Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder”.
Fonte: Jornal do Commercio do Rio de Janeiro – 19/05/10
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