A Câmara aprovou nesta terça-feira, 5, em sessão remota, o projeto que estabelece ajuda financeira da União para Estados e municípios em razão da pandemia do coronavírus. A votação foi concluída na madrugada desta quarta-feira, 6. Como o texto foi modificado, caberá aos senadores a última palavra sobre o projeto.
O pacote de medidas prevê repasses diretos de R$ 60 bilhões. No entanto, o custo total estimado do programa é de cerca de R$ 120 bilhões para a União, porque inclui também suspensão de dívidas dos governos regionais com bancos oficiais e o Tesouro.
A ideia é amenizar as perdas com queda de arrecadação de impostos, decorrentes das medidas de contenção do vírus, como o fechamento temporário de lojas e empresas.
Um outro projeto de socorro a governadores e prefeitos já havia sido aprovado pelos deputados em 15 de abril. No último sábado, 2, foi modificado pelo Senado.
Como contrapartida à liberação de recursos, o texto proíbe que os governos locais reajustem o salário de servidores públicos até 31 de dezembro de 2021.
Inicialmente, a exceção seria para profissionais das áreas de saúde e de segurança pública diretamente envolvidos no combate à pandemia. Outras categorias foram incluídas pela Câmara, como policiais federais, policiais legislativos, técnicos e peritos criminais, agentes socioeducativos, profissionais de limpeza pública e assistência social envolvidos no enfrentamento da doença.
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Os professores também ficaram de fora e poderão receber aumentos salariais. O destaque (sugestão de alteração ao texto-base) foi proposto pelo PT e aprovado com o apoio de partidos do Centrão, como PP e PL, embora o governo tenha dado orientação para barrar a medida.
Os deputados também decidiram retirar a restrição de que esses aumentos salariais só pudessem ocorrer quando as categorias estivessem diretamente envolvidas no combate à pandemia.
A equipe econômica esperava inicialmente cerca de R$ 130 bilhões em economia com o congelamento de salários de servidores públicos até o fim de 2021, mas o número deve cair com o aumento de carreiras “blindadas”.
Outra mudança feita pela Câmara, durante a votação dos destaques, suspende os prazos de validade dos concursos públicos homologados até o dia 20 de março. Os prazos voltam a correr após o término do período de calamidade pública, que se encerra no dia 31 de dezembro deste ano.
O relator na Câmara, deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), apresentou ainda uma emenda especificando que fica proibido o uso dos recursos da União transferidos a Estados e municípios para conceder reajuste para essas categorias. Na prática, os governos regionais que quiserem dar aumento terão de usar recursos de outra origem.
A economista Ana Carla Abrão, da Oliver Wyman, criticou a mudança, considerada uma porteira aberta. O projeto diz que o uso dos recursos da União transferidos a Estados e municípios não pode ser usado para concessão de aumento de remuneração de pessoal. “Ninguém explicou que esse finalzinho é só para inglês ver? O conceito de troca de fontes, tão comum nos orçamentos públicos parece passar ao largo dos conhecimentos técnicos dos deputados”.
Divisão dos recursos
O programa estabelece R$ 60 bilhões de repasses da União a Estados e municípios para financiar ações de enfrentamento ao coronavírus. Cerca de R$ 50,5 bilhões de economia estimada com a suspensão de obrigações previdenciárias e do pagamento de dívidas com a União e bancos, como BNDES e Caixa. Outros R$ 10,6 bilhões de economia potencial com a renegociação de contratos com organismos internacionais.
Pelo texto, dos R$ 60 bilhões previstos em repasses diretos para Estados e municípios, R$ 10 bilhões sejam destinados a ações na área da saúde e assistência social. Desses, R$ 7 bilhões serão repassados aos Estados. O critério de divisão será uma fórmula que considera incidência da covid-2019 (40% de peso) e população (60% de peso). Os outros R$ 3 bilhões são destinados aos municípios. O critério de distribuição será o tamanho da população.
O rateio dos outros R$ 50 bilhões obedecerá ao seguinte cálculo: 60% com os Estados (R$ 30 bilhões) e 40% com os municípios (R$ 20 bilhões).
O novo critério de divisão de recursos para estados e municípios, definido pelos senadores, desagradou a alguns parlamentares – em especial os do Sudeste, onde os estados, proporcionalmente, receberão menos.
Segundo cálculos da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof) da Câmara, os Estados que mais terão repasses per capita são Roraima (R$ 470 per capita) e Acre (R$ 427 per capita), segundo a nova divisão aprovada pelos deputados. O Amapá, Estado do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que relatou o texto, receberia R$ 733 per capita de acordo com a versão aprovada pelos senadores (atrás apenas de Roraima, cujo aporte por pessoa seria de R$ 798). Com a mudança feita pelos deputados, porém, o valor por habitante caiu para R$ 395 no Amapá.
Já São Paulo, o Estado com o maior valor em termos absolutos (R$ 13,6 bilhões), receberá, per capita, R$ 296. E Maranhão, que terá R$ 1,6 bilhão transferido pela União, é o que menos recebe considerando o critério per capita (R$ 223). Os dois Estados estão entre os que enfrentam situação crítica no enfrentamento à doença no País.
Parecer
Além da emenda que incluiu outras categorias autorizadas a ter reajuste, Pedro Paulo apresentou outra emenda que inclui os cargos de assessor entre os que podem ser repostos, sem aumento de despesa, durante a pandemia. Pelo texto, os Estados e municípios ficam proibidos de admitir ou contratar pessoal no período, mas ressalva as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa.
O relator também antecipou, de dezembro de 2021 para dezembro de 2020, o fim do prazo para a suspensão dos refinanciamentos de dívidas dos municípios com a Previdência Social, além de determinar que a suspensão seja definida por meio de regulamentação.
Durante a sessão, Pedro Paulo reiterou diversas vezes que se tratam apenas de emendas de redação. No entanto, técnicos da Câmara avaliam, que por mudar o mérito, o texto deverá voltar ao Senado para reanálise.
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Tramitação
A ajuda financeira aos Estados começou a ser discutida pelo Parlamento há mais de um mês. Um primeiro projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em abril. O conteúdo era totalmente diferente do teor aprovado nesta terça.
A proposta inicial dos deputados recompunha, durante seis meses, as perdas de estados e municípios com a arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS, estadual) e com o Imposto Sobre Serviços (ISS, municipal).
O projeto, porém, não estabelecia nenhuma contrapartida por parte dos entes federados e recebeu críticas do governo. O episódio gerou uma troca de farpas públicas entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Quando a proposta chegou no Senado, houve uma manobra regimental e outro projeto, de autoria do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), foi apensada e passou a tramitar em conjunto.
A estratégia fez com que o andamento da matéria fosse reiniciado, desta vez, pelo Senado. Com isso, a Câmara passou a ser a casa legislativa revisora, ficando o Senado com a palavra final.
Isso porque, em geral, a tramitação de projetos de lei depende da autoria da proposta. Se for um deputado, começa pela Câmara, o Senado revisa, mas, se mexer, volta à Câmara antes de ir à sanção. Se for um senador, o caminho é o inverso. Começa pelo Senado, vai à Câmara e retorna para reanálise em caso de alterações.
Em seu parecer, o relator da matéria, deputado Pedro Paulo, fez críticas à proposta do Senado. Disse que preferia o trabalho feito pela Câmara.
O presidente da Câmara também foi na mesma linha e defendeu a aprovação do texto. Ponderou que, apesar das divergências e da troca de origem da matéria para o Senado, o objetivo principal é atender os estados e municípios e fazer com que os “recursos possam chegar o mais rápido possível”.
Fonte: “Estadão”