No artigo de 26 de outubro passado, chamei a atenção para a possibilidade de que estivesse se delineando uma solução para a crise da área do euro, calcada em um tripé formado pela capitalização dos bancos; o calote organizado da dívida grega e, potencialmente, de outros pequenos países da periferia; e o financiamento extramercado das dívidas de Itália e Espanha, por meio da alavancagem do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF, na sigla em inglês).
Um mês depois, não se fala mais nesse plano, que se mostrou econômica e politicamente inviável. A rapidez com que as soluções para a Europa vão sendo descartadas é mais um sinal do agravamento da crise e da dificuldade de os políticos darem uma resposta com a magnitude e a tempestividade necessárias. Por mais que os otimistas tentem se agarrar aos vazamentos sobre novas soluções, da ajuda do FMI à Itália a novos acordos capitaneados por Merkel e Sarkozy, o fato é que cada vez mais a única solução para a crise parece ser o Banco Central Europeu comprar títulos soberanos em grandes quantidades.
Enquanto a situação se complica na Europa, certo alento surgiu na Ásia. Há um mês, a China ameaçava tornar-se fonte adicional de instabilidade, com vários analistas temendo um pouso forçado da economia, fruto de políticas domésticas restritivas e de um mercado de exportação em franca desaceleração. As últimas estatísticas apontam, porém, para um quadro mais favorável para o país no próximo ano.
A desaceleração chinesa neste fim de ano reflete dois fatores principais: a perda de dinamismo da indústria, por conta do menor crescimento das exportações para Europa e EUA, e o arrefecimento do setor de construção imobiliária, em função das políticas restritivas adotadas pelo governo para o setor. Essas são as causas principais porque o crescimento do PIB chinês deve cair para cerca de 8% anualizados neste e no próximo semestre. Para 2012, o mercado trabalha com alta do PIB de 8,5%, contra 9% em 2011 e 10,4% em 2010.
Menos do que os números, porém, mudou o receio de que o pouso suave que agora se prevê acabasse dando lugar a uma séria desaceleração do nível de atividade. Dois fatores alimentavam esse receio. Um, de que o governo errasse a mão e esfriasse demais o setor de construção, que responde por parcela razoável do PIB chinês. Outro, mais importante, de que a inflação, que nos 12 meses terminados no fim do terceiro trimestre (setembro) de 2011 chegara a 6,3%, na comparação com um ano antes, custasse a ceder, reduzindo o espaço para se adotar uma política econômica mais expansionista. Os indicadores de outubro diminuíram esses temores.
Preocupado com o surgimento de uma bolha no setor imobiliário e com o descontentamento dos chineses que tentam adquirir uma casa, desde 2009 o governo chinês adotou várias medidas para desestimular a compra de imóveis, especialmente para fins de investimento — como os depósitos bancários pagam taxas negativas de juros em termos reais, as famílias chinesas mais abastadas poupam comprando imóveis. Os últimos dados mostram que os preços dos imóveis começam a cair, prevendo-se inclusive uma queda no seu preço médio em 2012, especialmente nas cidades em que o mercado imobiliário estava mais aquecido. Apesar disso, o setor continua mostrando dinamismo nas cidades de nível 2 e no segmento de habitação popular.
A queda da inflação foi, porém, a melhor notícia em novembro. As pesquisas de tendência na indústria (PMI) já sinalizavam que a alta no preço dos insumos utilizados na indústria vinha perdendo fôlego. Esse resultado foi confirmado pelos índices de preços ao consumidor e ao produtor em outubro, que apresentaram altas de 5,5% e 5%, respectivamente. Com a subida do preço dos alimentos perdendo vigor, há boa chance de a inflação chinesa fechar 2011 próxima à meta do governo, de 4,5%.
Mais do que pelos valores em si, o relevante nesses números é a margem de manobra que se cria para um relaxamento adicional da política monetária e de crédito. Os bancos chineses tiveram suas cotas de novos empréstimos relaxadas e o Banco Central chinês já começou a reduzir as alíquotas de depósitos compulsórios, ainda que de forma limitada. Novas medidas devem vir na virada do ano. Tudo isso deverá aquecer a economia chinesa na segunda metade de 2012.
A China pode, portanto, reduzir o impacto da desaceleração, que se espera venha a ocorrer com a contração fiscal e do crédito na Europa e nos EUA. Isso deve ajudar o Brasil, ainda que não o suficiente para impedir que 2012 também seja um ano morno por aqui.
Fonte: Correiro Brasiliense, 30/11/2011
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