PEC da Magistratura ainda precisa ser votada no plenário do Senado e da Câmara
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira a chamada PEC da Magistratura, que institui parcela mensal de “valorização” por tempo de exercício na Magistratura e Ministério Público e, segundo fontes do governo, pode provocar uma “sangria” nos cofres públicos. Apenas quatro senadores – Gleisi Hoffmann (PT-PR), Eduardo Suplicy (PT-SP), Aloysio Nunes (PT-SP) e Armando Monteiro (PTB-PE) votaram contra a medida, que ainda terá de passar pelo plenário do Senado e da Câmara.
O relatório da PEC, apresentado por Vital do Rêgo (PMDB-PB), não traz estudos sobre o impacto orçamentário da medida. Em seu parecer, Vital faz uma alteração para permitir que o benefício ultrapasse o teto constitucional, hoje estabelecido em R$ 29,4 mil. A PEC é de autoria de Gim Argello (PTB-DF), senador que responde a 6 inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF). Um dos senadores favoráveis, Jayme Campos (DEM-MT), defendeu a aprovação do aumento como forma de evitar venda de sentenças e outros crimes cometidos por juízes.
– Se não pagamos um bom salário ao Ministério Público, também aos juízes, sejam os juízes estaduais ou federais, vamos continuar assistindo, lamentavelmente, alguns juízes mal intencionados vendendo sentenças, vendendo liminares, porque isso é um convite, pois se o cidadão não está ganhando bem ele vai naturalmente por esse caminho – disse o senador Jayme Campos.
A medida concede aos integrantes dessas carreiras o direito ao pagamento mensal de gratificação por tempo de serviço, que não estará sujeita à limitação do teto constitucional e poderá ser incorporada na aposentadoria e estendida aos pensionistas. Pelos cálculos governistas, o salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) poderá chegar a R$ 38 mil com a medida, que teria efeito cascata sobre os demais cargos do Judiciário e também repercutir em outras carreiras dos demais Poderes, que podem reivindicar isonomia no tratamento.
O texto aprovado determina que a parcela de pagamento será calculada na razão de 5% do subsídio, a cada cinco anos de exercício em atividade jurídica, até o máximo de 35%. Poderá ser contado também o tempo de exercício em cargos públicos de carreiras jurídicas e na advocacia, e os beneficiários poderão usar o tempo de exercício anterior à data da publicação da emenda constitucional para o cálculo.
Gleisi tenta manobra para que a PEC não passe
Apesar da articulação pessoal do ministro do Supremo Ricardo Lewandowski pela aprovação da medida, inclusive com telefonemas a diversos senadores pressionando pelo apoio à PEC, alguns parlamentares se posicionaram contrários à sua aprovação. A senadora Gleisi Hoffmann destacou que um dos problemas na carreira é a pequena diferença entre o salário inicial e final, mas que isso é uma escolha do próprio Judiciário, que prefere oferecer salários inchados logo para os primeiros degraus do cargo. Gleisi sugeriu, a pedido do Palácio do Planalto, a negociação de um plano de carreira para que a PEC não seja aprovada.
Segundo dados apresentados por Gleisi, o juiz federal substituto, por exemplo, não tem diferença alguma na sua remuneração. O juiz federal tem uma diferença de apenas 5,3%. O Juiz do Tribunal Regional Federal, de 10,8%. O Ministro de tribunal superior, de 16,6%; e o Ministro do STF, 22,8%.
– Nós temos um problema que é o fato de termos uma diferença muto pequena entre o início da carreira e o final da carreira. Isso deriva da política remuneratória do Judiciário, que preferiu fixar as remunerações em um patamar alto da tabela, o que inviabiliza uma maior variação dos subsídios e, consequentemente, uma menor progressão salarial na carreira. A progressão remuneratória da Magistratura é pequena por uma opção do próprio Judiciário. Optou-se por remunerar o Juiz de Primeira Instância com um valor muito próximo dos valores dos Ministros dos tribunais – afirmou a senadora.
A exemplo dos demais parlamentares que se posicionaram contra a PEC, Gleisi destacou que o efeito secundário da medida pode ser “extremamente prejudicial” para o planejamento dos orçamentos dos Estados e da União, devido à imprevisibilidade do impacto desta medida nos orçamentos públicos. A senadora alertou para um possível efeito dominó nas demais carreiras.
– Não há qualquer estudo disponível sobre o valor agregado da folha de pagamento dos magistrados e promotores públicos ativos e aposentados que possa ser utilizado como paradigma para o estudo do impacto real da medida nos orçamentos públicos. Mas não é só isso. É também a expectativa que criaria em outras carreiras que hoje são remuneradas por subsídio – disse.Líder do PSDB, o senador Aloysio Nunes (SP) cobrou dados sobre o impacto orçamentário da medida nos cofres dos governos estaduais.
Aloysio Nunes diz que medida pode encorajar reivindicações de outras categorias
O relator da PEC, Vital do Rêgo (PMDB-PB), não soube apresentar esses valores. Posteriormente, auxiliado por um representante da AMB, disse que não ultrapassaria um aumento de 2% em relação aos gastos atuais com a folha de pagamento dos magistrados. Aloysio contestou o número. Segundo o tucano, dados da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo mostram que o impacto imediato da aprovação desta PEC seria em torno de R$700 milhões no ano.
– É uma bagatela? Acho que não. Essa Proposta de Emenda à Constituição, no meu entender, vulnera de morte o sistema do subsídio, acaba. Porque, ao se abrir a brecha para essas categorias, que são evidentemente muito influentes e muito relevantes, você abre o caminho para outras reivindicações de outras categorias que também são influentes e relevantes e que também se acham com o direito de obter uma remuneração maior do que aquela que o teto constitucional estabelece – apontou Aloysio.
O senador Roberto Requião (PMDB-PR) também foi contrário à PEC:
– Eu vejo com antipatia as reivindicações corporativas isoladas. Nós temos que ter uma compreensão global da administração pública. Existem categorias que estão em greve no Brasil há 50 dias, como os funcionários das universidades federais, que recebem salário mínimo. Como esse pessoal vai acompanhar os quinquênios, os aumentos? Isso não tem colaborado para melhorar a qualidade da magistratura, mas apenas para desgastar a imagem pública do Judiciário brasileiro – disse.
Eduardo Suplicy afirmou que foi procurado pelo ministro Ricardo Lewandowski para ser convencido sobre a adequação da medida, mas que, em sua opinião, a PEC desrespeita o princípio isonômico.
– Esta exceção específica para os magistrados e membros do Ministério Público proposta na PEC em verdade fere o princípio isonômico, que é alicerce fundamental do edifício constitucional. Somente o tempo de serviço pretérito dos juízes, promotores e procuradores deve ser resguardado e valorado pecuniariamente? Afinal todas as outras carreiras poderão, se for aprovada esta PEC 63, pleitar, com razão, a igualdade. E será que o Estado brasileiro pretende mudar os parâmetros da reforma administrativa? Romper esse dique implica criar gravíssimos precedentes, constitucionalmente insustentáveis, que gerarão, em pouco tempo, pressões corporativas que levarão ao total solapamento do subsistema remuneratório dos servidores previsto na Constituição Federal – defendeu Suplicy.
O líder do PT, senador Humberto Costa (PE), afirmou que, na prática, a PEC acaba com o teto constitucional.
– Na prática, nós estamos acabando com o teto do funcionalismo público. Nós estamos admitindo que três carreiras… Lembrem-se de que nós estamos falando aqui de Ministério Público, de Poder Judiciário, e ontem, na emenda à Constituição que foi aprovado no plenário, nós estabelecemos exatamente as mesmas prerrogativas para a Defensoria Pública. Então, nós estamos permitindo que três categorias rompam o teto do funcionalismo público e tenham a instituição de um adicional, de uma gratificação não prevista hoje em lei – disse.
Fonte: O Globo
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