A oposição brasileira finalmente esboça alguma reação, ainda que bastante atrasada. O senador Aécio Neves fez um discurso mais duro no Senado, atacando os abusos do governo atual. E o ex-presidente FHC escreveu um artigo propondo mais foco da oposição, que deveria, segundo ele, aproximar-se da classe média, hoje abandonada pelo governo. Ainda que iniciativas louváveis, estas são reações muito tímidas.
Os políticos que discordam dos rumos atuais do país deveriam aprender com o jovem americano Paul Ryan, do Partido Republicano. Responsável por apresentar um orçamento alternativo ao Congresso, Ryan teve a coragem de enfrentar os verdadeiros problemas do país e colocar o dedo na ferida. Seu plano fiscal, chamado “O caminho para a prosperidade”, apresenta uma visão bastante diferente do futuro da nação americana e do papel do governo.
Deixando o excessivo pragmatismo de lado, Paul Ryan pretendeu resgatar valores hoje perdidos naquela que já foi a “terra da liberdade”. Seu objetivo é limitar novamente as funções do governo àquilo prescrito na Constituição. A igualdade perante as leis, por exemplo, voltaria a ser um princípio básico respeitado pelo governo, que atualmente vem concentrando poder arbitrário e exagerado. Ryan compartilha do ideal dos “pais fundadores” dos Estados Unidos, que defendiam um país com ampla liberdade individual, meritocracia e governo limitado.
Além disso, ele apresentou propostas concretas para a redução drástica do déficit público. O governo americano tem sido irresponsável há anos, gastando mais do que arrecada. As guerras mundo afora, os resgates bilionários de empresas e bancos falidos, estímulos keynesianos e um estado de bem-estar social cada vez mais inchado comprometeram as finanças públicas do país. O déficit fiscal este ano seránovamente superior a US$ 1 trilhão.
Não obstante, o presidente Obama, com tom extremamente populista, defende um governo ainda mais ativo. O governo pretende criar uma espécie de SUS no país, como se isso fosse realmente desejável para os mais pobres. A grande bandeira política de Obama foi sua reforma do sistema de saúde pública. Os crescentes rombos fiscais, cujos maiores drenos são justamente os gastos com saúde e previdência, parecem não incomodar os democratas no poder. Sua visão de nação reflete uma fé inabalável na capacidade de o governo prover bons serviços a preços baixos, o que a história sempre demonstrou ser uma grande ingenuidade.
Paul Ryan apresentou uma visão alternativa, onde indivíduos decidem como gastar seu próprio dinheiro, sem a tutela ineficiente do governo. Seu plano prevê um código tributário mais simples e menores impostos em relação ao que os democratas desejam. Com o foco no longo prazo, Ryan mostrou que há a necessidade de escolha entre dois futuros muito diferentes. De um lado, Washington continua decidindo onde gastar os recursos criados pela iniciativa privada, com seus projetos corruptos e incompetentes. Do outro, o governo adota uma política de forte redução dos gastos, deixando o caminho livre para que indivíduos e empresas possam novamente colocar a economia na trilha da prosperidade.
Sem apelar para discurso demagógico, Ryan reconhece que os ajustes necessários seriam também dolorosos no primeiro momento. Afinal, trata- se de corrigir o rumo atual, que tem sido de total irresponsabilidade. Não dá mais para viver além dos meios existentes, e, quanto mais tempo levar para os americanos aceitarem este fato da realidade, maior será o sofrimento. A complacência de hoje será paga com o suor dobrado de amanhã. E Ryan teve a coragem de não ignorar o enorme elefante na sala, que todos fingem não existir.
Se sua iniciativa vai ou não surtir efeito prático, ainda parece cedo para dizer. A escolha, em última instância, caberá aos eleitores americanos. Mas o presidente Obama já teve de vir a público reagir, e anunciou um projeto de corte de US$ 4 trilhões nos gastos públicos nos próximos 12 anos. Muitas incertezas ainda pairam no ar, e seu discurso foi carregado de demagogia. Obama atacou os mais ricos, como se mais impostos para ricos não prejudicassem justamente os mais pobres. Mas o pêndulo pode ter começado a virar. Os americanos agora contam com uma liderança que tem a coragem de defender uma opção diferente para o país.
Voltando ao Brasil, vemos que a reação da oposição é bem-vinda, mas que ainda é muito tímida. Falta uma liderança que conteste o modelo atual de estado, que concentra poder demais e arrecada impostos demais. Onde está o Paul Ryan brasileiro?
Fonte: O Globo, 19/04/2011
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