As relações internacionais e a política externa são domínios pouco frequentados pelos políticos brasileiros, com as exceções de praxe. A percepção é de que trabalhar nessa área não dá votos e tem pouca repercussão interna. Mesmo em se tratando de comércio exterior, são poucos os congressistas que estão acompanhando as políticas internas e a evolução das negociações internacionais.
Poucos se dão conta de que, com as transformações profundas por que passa o cenário global, praticamente desapareceu o limite que sempre existiu entre a agenda do que acontece no mundo e a formulação e a execução da política econômica e de comércio exterior doméstica.
Se o presidente Donald Trump adotar medidas internas para proteger a indústria norte-americana, as empresas industriais brasileiras que mantêm comércio com esse país terão de se ajustar. As negociações de acordos de livre-comércio podem demandar a alteração de normas legais internas, como estamos acompanhando com os mega-acordos regionais, que estão criando regras e padrões que vão forçar os países a se ajustar se quiserem manter suas exportações. Decisão da Organização Mundial do Comércio (OMC) questiona a política industrial brasileira nos setores automotriz e de informática e caso o órgão de apelação em Genebra decida contra o Brasil o governo vai ter de compatibilizar os subsídios, os incentivos e o apoio a pedidos de conteúdo nacional com as regras multilaterais não discriminatórias. Tudo isso tem que ver com políticas econômicas e industriais internas e com a geração ou a perda de empregos.
São Paulo é a 19.ª maior economia do mundo, a segunda maior economia da América do Sul (atrás do Brasil) e a terceira da América Latina, depois de Brasil e México. É o maior polo de atração de investimentos na América Latina e conta com a maior concentração de corporações multinacionais em todo o continente. Dentro desse contexto é difícil explicar a inexistência de um fórum representativo para discutir essas questões.
Veja também
Marcos Troyjo: “Capitalismo de Estado brasileiro serviu para isolar o país”
O Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo, segundo pesquisa do Banco Mundial
A difícil vida de quem exporta
Sua economia é a mais internacionalizada do Brasil. O estado exportou US$ 52,6 bilhões em 2016, respondendo por 28,4% das exportações brasileiras, e recebeu em 2015 cerca de 30% do fluxo de investimentos diretos no Brasil. São Paulo está inserido na economia global e é reconhecido por sua liderança econômica e por sua atuação internacional.
A marginalização do Brasil no cenário internacional representa hoje um problema para as empresas, que deve ser mais bem examinado para encontrar formas de superá-la. Recuperar a projeção externa e reinserir-se nos fluxos dinâmicos do comércio exterior são alguns dos maiores desafios que a sociedade brasileira enfrenta. A presença brasileira nos fóruns internacionais, inclusive nas áreas de comércio e meio ambiente, cria uma demanda interna para empresas e diferentes setores da sociedade que poderia ser atendida pela criação de um fórum desse tipo.
Faltava no governo de São Paulo um fórum consultivo que pudesse mobilizar diferentes setores – oficiais, empresariais, da sociedade civil – para discutir, do ponto de vista do interesse paulista, políticas na área externa e de comércio exterior. Com uma visão atualizada das relações do Brasil com o mundo e até certo ponto com uma percepção que vai na contramão da ação dos políticos em nosso pais, o governador Geraldo Alckmin decidiu instituir o Conselho Consultivo de Relações Internacionais do governo do Estado de São Paulo, que hoje se instala e se reúne pela primeira vez. De maneira pioneira e com visão de futuro, a criação do conselho é um reconhecimento da importância das relações internacionais para o desenvolvimento social e econômico do estado.
Dentre suas atribuições, o conselho deverá informar sobre as principais tendências nas relações internacionais; formular recomendações sobre a posição do estado de São Paulo no exterior, visando a conciliar suas ações com os objetivos da política externa brasileira; propor uma estratégia para o estado na área internacional na próxima década. O novo conselho está integrado por representantes do governo estadual, empresários, especialistas em relações internacionais e do meio acadêmico, sob a presidência do governador do estado.
Essa plataforma terá uma visão da inserção internacional do Brasil levando em conta a posição relativa preponderante do Estado, onde diversos subsistemas – financeiro, manufatureiro, tecnológico, intelectual e migratório, que compõem o sistema econômico nacional – têm centros nevrálgicos. Será importante agregar ao debate das relações internacionais e comércio externo do Brasil propostas de ação próprias de São Paulo.
O conselho deverá firmar-se como um locus dentro do governo paulista para a discussão de temas relevantes para a comunidade empresarial e de todas os setores que tenham atividades na área externa.
Como no próximo ano São Paulo vai sediar o World Economic Forum latino-americano, o conselho poderá dar uma contribuição importante assessorando o governo paulista na elaboração do programa e na escolha de personalidades para participar desse relevante evento. Esse é um dos exemplos em que o conselho poderá dar subsídios para o sucesso de atividades internacionais organizadas pelo governo estadual.
A discussão de estratégias na área internacional para o estado de São Paulo vai permitir um exame sobre a política econômica, a política industrial e a política de comércio exterior para os próximos anos. Espera-se que o governador Geraldo Alckmin possa aproveitar a oportunidade da instalação do conselho para tomar posição sobre os desafios internos e externos que terão influência na definição de políticas nas áreas prioritárias de atuação do novo colegiado.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 26/09/2017.
No Comment! Be the first one.