Os atuais instrumentos de poder estão superados pela velocidade dos acontecimentos sociais. O fato é que a sociedade mudou, mas a política ficou onde estava. No hiato entre o passado e o presente, é o futuro das pessoas que sai comprometido. Sem cortinas, as pulsantes expectativas do hoje não serão satisfeitas com o pó das ideias do ontem. A democracia moderna requer uma nova pauta de procedimentos. Nesse contexto desafiador, a reconciliação pacífica entre a cidadania e a política constitui uma condição absolutamente necessária para o sucesso do regime das liberdades constitucionais.
Os sintomas da ineficácia das tradicionais estruturas políticas estão sendo sentidas ao redor do globo. Se a primavera árabe foi um grito contra a opressão de regimes ditatoriais, o mesmo não pode ser dito quanto aos “Indignados” na Espanha nem com a eleição de Virgínia Raggi, candidata antissistema do Movimento Cinco Estrelas, para a prefeitura de Roma. Na França, recentes pesquisas sugerem que Marine Le Pen será uma forte concorrente nas eleições de 2017. Se tudo já não bastasse, o antes inimaginável Brexit expôs as profundas assimetrias da União Europeia, tornando ainda mais turbulento o panorama internacional.
Nesse panorama geopolítico movediço, é indubitável que – entre os cogentes desafios contemporâneos – está a justa adequação da fórmula capitalismo-democracia. Ora, basta abrir a janela do mundo e ver que a política passou a ser cooptada pelos jogos de mercado, formando um sistema internamente corrupto que beneficia poucos em prejuízo de muitos. Na lógica das cifras, substituímos valores humanos por preços monetários, transformando a vida política em um raso negócio venal. Ou seja, quando o valor democrático é substituído por um preço político, é sinal de que a vida pública virou um simples mercado de balcão, traindo sua inata vocação de dedicação ao bem comum.
Sim, a boa política requer doação e impessoalidade de interesses. Democracia é sair de si e trabalhar para o outro. Infelizmente, vivemos em época de tórrido individualismo egoísta. O eu tem se sobreposto ao nós, dificultando um olhar abrangente sobre os problemas da sociedade. Frisa-se que não se está a defender aqui o abandono do indivíduo em prol de pautas coletivistas de nivelamento do talento pessoal; ao contrário, o que se propõe é uma exaltação das vigorantes potencialidades individuais, mas com uma necessária conexão ao contexto histórico e à circunstância vivencial. Ou seja, ir além de si e ter a consciência de que é somando que a humanidade progride.
A democracia eficaz tem na cidadania ativa a sua grande força transformadora. Logo, se quisermos uma nova política, também teremos que ser cidadãos renovados. Para mudar, mais do que querer, é preciso fazer. No apagar das luzes do que se foi, a decadência da vida pública não deixa de ser o reflexo de um povo desabituado a lutar por grandes ideais. A inércia, embora cômoda, não irá resolver nossos problemas.
Entre a certeza do nada e a possibilidade de um futuro melhor, que tal levantarmos de nossa letargia, com um primeiro passo à frente?
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