O petróleo produz fascínio. A ideia de que se trata de um bem “estratégico” é poderosa. Roberto Campos dizia, porém, que o petróleo “é apenas um líquido pegajoso e fedorento”. Na verdade, estratégico é atributo da educação e das instituições. Claro, grandes reservas de petróleo podem impulsionar a economia e assegurar o suprimento de energia, mas elas não são essenciais. Suíça, Coreia do Sul e Singapura, países bem-sucedidos, não têm uma gota sequer de petróleo no seu território. Na Nigéria e na Venezuela, grandes produtores, o petróleo se tornou uma calamidade e perpetua o atraso. A desgraça vem do uso irresponsável dos recursos, que inibe a construção institucional, provoca o desperdício e anima a corrupção.
O Brasil instituiu o monopólio da exploração e produção do petróleo em 1953 e confiou sua execução à Petrobras. Com o tempo e duas crises do petróleo (anos 1970), ficou claro que a autossuficiência dependeria de atrair capitais privados. Daí a Lei do Petróleo, de 1997, que manteve o monopólio da União mas permitiu a participação de empresas privadas na atividade.
A mudança da Lei do Petróleo, motivada por razões políticas e ideológicas, ainda não foi posta em prática, mas o intervencionismo sugere que vai ser e que cobrará um preço elevado em termos de desenvolvimento do Brasil
Adotou-se, então, o regime de concessão, que trouxe maior dinamismo ao setor. Sob o incentivo da competição, a Petrobras se fortaleceu, bateu recordes de produção e granjeou reputação nacional e internacional. Os leilões atraíram quase 100 empresas privadas, nacionais e estrangeiras. Muitas outras se prepararam para fornecer bens e serviços. As reservas de petróleo e gás cresceram de forma acelerada. O novo modelo foi um grande êxito.
O PT, que se opôs à nova lei, lutou pela contrarreforma. A oportunidade surgiu com a descoberta do pré-sal, que Lula considerou um “bilhete premiado”. Mudou-se a lei e instituiu-se o regime de partilha nessa região, o qual amplia a ingerência estatal, reduz a competição e submete o setor a ações de política industrial. É grande a semelhança com a ação estatal que levou à estagnação do país nos anos 1980.
Imaginava-se que a mudança manteria o interesse das empresas petrolíferas, em razão do potencial das reservas e da inexistência de oportunidades comparáveis no mundo. Diagnóstico errado. Surgiram novas oportunidades menos arriscadas e mais atraentes, viabilizadas pela revolução tecnológica – como no gás de xisto e no tightoil (petróleo) nos Estados Unidos e pela expansão da fronteira de produção na África, na Rússia e no Iraque.
O regime mais restritivo contribuiu para que muitas empresas deixassem o Brasil. Um efeito colateral da mudança foi despertar o apetite de estados e municípios pelos recursos da exploração, criando o atual imbróglio da divisão dos royalties. Não há novas licitações desde 2008. O investimento privado estancou. A produção caiu em 2012. Esses e outros aspectos foram abordados em excelente livro organizado por Fábio Giambiagi e Luiz Paulo Velíozo Lucas: “Petróleo” (Elsevier, 2012).
A lógica que permeia o novo modelo – ingerência estatal e “desenvolvimentismo”-é a mesma que o governo usa na gestão da Petrobras, à qual foi imposto o peso excessivo da participação de pelo menos 30% em todos os consórcios do pré-sal. A rentabilidade despencou por causa do controle de seus preços, que a obriga a importar gasolina e diesel para revendê-los a preços mais baixos no mercado brasileiro e a perder bilhões de reais com tal política. Por isso, a empresa tem sido obrigada a se endividar mais intensamente, de forma a não interromper o ambicioso plano de investimentos. O problema é que, apesar do recente aumento de seu capital, o endividamento começa a chegar perto de seus limites. O custo financeiro poderá aumentar se a classificação de risco da empresa for rebaixada. Tal situação, insustentável, pode comprometer a exploração de nossas reservas de petróleo. Conforta saber que a nova e séria presidente da Petrobras parece compreender os riscos de tamanha intervenção.
A mudança da Lei do Petróleo, motivada por razões políticas e ideológicas, ainda não foi posta em prática, mas o intervencionismo em curso sugere que vai ser e que cobrará um preço elevado em termos de desenvolvimento do país. É hora de discutir o retorno à racionalidade nessa questão fundamental.
Fonte: revista “Veja”
É verdade, firmas estatais favorecem o empreguismo, e as vezes a corrupção. Por isto há quem defenda a exploração porm estrangeiros. Cada um terá seus motivos, nem sempre honestos.
A corrupção não é inerente às firmas estatais;é inerente aos corruptos. Veja-se os contratos com as firmas estrangeiras; o Jucá, por exemplo devolvendo os royaties em petróleo.
Creio que com a Graça Foster a petrobrás estará em boas mãos.
Sem corrupção pelo menos nos altos escalões, e sem empreguismo. GF