Já passou a hora de se desconstituir qualquer tese que – ainda – defenda um tal Direito alternativo que se tornou en vogue no Brasil a partir dos anos 1980, principalmente naqueles primeiros após a eleição de Tancredo Neves para a Presidência da República e sobretudo entre os gaúchos.
Numa comparação entre Direito alternativo e Direito natural, pode-se inferir que pelo menos o Direito natural tem onde se escorar: na natureza, na causalidade newtoniana (Sir Isaac Newton). O Direito alternativo, nem isso. Trata-se de uma tirania que contribuiu para um ativismo judicial exacerbado. Deixa o juiz de ser um observador da norma geral e abstrata para aplicar o Direito que acha certo, que entende justo. O problema aqui é identificar: o que é justo se a Constituição, as leis e os tratados internacionais nada valem para o juiz adepto do Direito alternativo? Qual é o parâmetro geral sobre o qual assenta as suas decisões? Quem lhe outorgou mandato para tanto? Até que ponto este realismo jurídico pode ser aplicado em países de tradição romano-franco-germânica? O que permite que um juiz, que geralmente não é eleito pelo povo, possa ditar as regras que aplicará num caso concreto?
O Direito alternativo não responde nenhuma das perguntas constantes no parágrafo anterior, nem as teses do realismo jurídico. O que desconstitui o Direito alternativo é o seguinte: há normas gerais e abstratas que regram o mundo e/ou um país. O juiz as interpreta e reinterpreta, inovando mesmo o sistema jurídico. Mas delas não pode fugir. Por exemplo, não pode um magistrado brasileiro fazer de conta que o empregador não está obrigado a depositar na Caixa Econômica Federal o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) de um empregado seu, nem pode este mesmo juiz liberar ao empregado o FGTS depositado fora dos casos previstos na norma aplicável à espécie.
O problema dos alternativistas é a confusão que fizeram em suas cabeças – e nas dos estudantes e adeptos – no que diz respeito aos significados das palavras normas, regras, princípios e leis.
Os alternativistas são antilegalistas porque eles preferem dizer que são mais apegados aos princípios. Ora, ocorre aí um erro de gênero: qualquer norma, escrita ou não, deve ser interpretada segundo os princípios constitucionais e internacionais de Direito, sobretudo aqueles de Direitos Humanos. Os alternativistas são antinormativistas: novamente incorrem eles num erro de gênero, e isso é grave: norma é gênero! Constituição, tratados internacionais, leis e decretos são espécies normativas nas quais se encontram regras e/ou princípios. Os alternativistas são avessos às regras: erram de novo, pois há no sistema jurídico as normas-regras e as normas-princípios. Exemplo de norma-regra: “todo proprietário de imóvel no perímetro urbano no Município do Rio de Janeiro é obrigado a pagar Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) à base de 1% sobre o valor venal do imóvel”. De outro lado, exemplo de norma-princípio é “Todos são iguais perante a lei”.
O Direito Alternativo faz proliferar a ditadura dos juízes, e isso fere o princípio constitucional da legalidade, além de representar uma violência contra a liberdade, a democracia e o Estado de Direito.
Este ótimo artigo deveria ser enviado como presente de ano novo aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Sempre que publica seus artigos pelo Millenium, esse Professor Alexandre Pagliarini acaba por dizer tudo o que nós leigos queremos expressar. Muito bom!
Professor
Belo artigo o seu. Parabéns.
Para contribuir com a discussão, aí vai o link de artigo que escrevi há pouco tempo aqui no Instituto Millenium abordando este assunto, mas num contexto (inegável) de que atualmente no Brasil tudo o que propõem de mudanças aponta para o perigoso caminho “alternativo”, como querem os defensores do direito alternativo.
http://www.imil.org.br/artigos/ptestado-de-direito-alternativo/
Atenciosamente
Parabéns pelo excelente artigo!
Mes félicitations à mon ami Prof. Dr. Alexandre Pagliarini et au Millenium. Anne Le Gros (Profe. de la Sorbonne, Paris)
Professor Alexandre Pagliarini, o senhor é seguidor do doutrinador Hans Kelsen? Será que é por isso que o senhor é contra o Direito Alternativo? Parabéns por suscitar a presente argumentação doutrinária. Aguardo a sua resposta, por favor. Obrigado. R. Latorre.
Concordo em linhas gerais com o autor em seu brilhante artigo. Mas, não vejo por que a comparação entre direito alternativo, mostrengo espúrio, e o direito natural, que tem fundamentação histórica e real. O direito natural emerge da esperiência história e da razão. Ver a magna obra de Hayek, “Direito, Legislação e Liberdade”, jamais citada nas Escolas de Direito, no Brasil. Direito Alternativo é simples expediente ideológico e manipulador, que compromete a viga mestra do direito – a segurança jurídica.
caro sr. reginaldo latorre: obrigado pela pergunta. sim, sou kelseniano, mas não é por isso que sou contra os juízes adeptos ao direito alternativo e/ou ao direito natural. a minha posição decorre do fato de que aos juízes cabe interpretar o sistema normativo geral e abstrato (constituição, tratados internacionais, leis etc) para que, a partir dele (do sistema normativo), possam criar a norma individual e concreta (a sentença); qualquer atitude judicial que fuja disso, configura-se como “ditadura de juiz”. Abraço. PROF. DR. ALEXANDRE COUTINHO PAGLIARINI
muito obrigado aos doutores tatiana de carvalho socorro e joselito britto pelos seus comentários. beijos à primeira e abraços ao segundo. alexandre coutinho pagliarini
Adoro quando o Pagliarini critica os juízes!
Disse que adoro quando ele critica os juízes, mas gosto mais ainda quando Alexandre Coutinho Pagliarini denuncia os descalabros do PT, deixando claro aos brasileiros que precisamos de governos sérios como o de Aécio Neves em Minas Gerais – e, Deus queira que em breve, na Presidência da República em nome da oposição responsável e desenvolvimentista. Dr. Reinaldo da Matta Machado