Por Adriano Pires e Abel Holtz
Nos últimos meses, os agentes do setor de energia no Brasil voltaram sua atenção para a questão da renovação das concessões de geração e transmissão de energia elétrica no país. O governo tem três alternativas para lidar com a questão: relicitar, renovar as concessões ou retornar os empreendimentos ao poder concedente, que na sequência contrataria empresas para operar as usinas.
Embora a indicação do governo aponte na direção da renovação das concessões, por meio da extensão do prazo, essa solução não encontra suporte nos atuais dispositivos legais. Ademais, a definição das tarifas será resultado de um processo pouco transparente e, portanto, de difícil aceitação. Caso a busca pela modicidade tarifária gere uma tarifa excessivamente baixa, ficam comprometidos o equilíbrio econômico-financeiro e a preservação das empresas. Como a decisão de renovar as concessões vincendas não está prevista no marco legal do setor elétrico, é de esperar que a discussão sobre a sua viabilidade ainda se estenda por um longo período.
O governo hoje discute qual o instrumento mais adequado: medida provisória ou projeto de lei. Porém renomados juristas já se manifestaram pela inconstitucionalidade da medida, o que significa que o assunto ainda está longe de ser encerrado. O tempo e a energia gastos com a indefinição da questão das concessões desviaram o foco do real problema do setor elétrico, que é a questão do planejamento e do aproveitamento ineficiente das diversas fontes de energia.
Como já dissemos antes, a construção de usinas hidrelétricas (UHEs) está condicionada a elas não terem reservatórios de regularização plurianual. Com as usinas a fio d’água, a geração plena se dá durante os oito meses do período úmido, e nos quatro meses restantes (período seco) elas geram só 10% de sua capacidade instalada. Mas, ao estabelecerem seu preço para entrada nos leilões de energia nova, são obrigadas a considerar o custo do investimento para sua construção, que seria o mesmo no caso de gerar continuamente. A obrigatoriedade de construir usinas a fio d’água, pois, retira a competitividade das UHEs, prejudicando a contratação de energia hidrelétrica.
No caso da energia eólica, passada a euforia inicial, alguns empreendedores mencionam que os preços encontrados nos últimos leilões não poderão mais ser praticados, pois as condições preexistentes não permitem sua repetição. Além disso, muitos dos parques da fonte eólica foram construídos em locais sem condições de escoamento da energia produzida ou onde o sistema está equilibrado. Mais uma vez, a falta de planejamento acaba por onerar o consumidor, que estaria pagando pela energia não gerada ou desnecessária naquele ponto, contrariando até mesmo o paradigma da modicidade tarifária.
A fonte biomassa e as pequenas centrais hidrelétricas continuam com os mesmos problemas definidos pela baixa condição de competitividade com as demais fontes.
Quanto às térmicas, são inúmeros os problemas que limitam a sua operação e, por conseguinte, o aumento de sua participação na matriz de geração. Além do estigma das térmicas a carvão e do efeito sobre as nucleares derivado do acidente no Japão, as térmicas a gás natural só podem existir e operar se tiverem garantia firme para o fornecimento do seu combustível. Por sua vez, dadas as características da operação do nosso sistema, as térmicas passam a maior parte do tempo à disposição, pois a carga do sistema estaria sendo atendida pelas hidrelétricas e, nessa condição, não necessitariam de fluxo do combustível de forma perene, fazendo com que a existência de contratos com cláusulas de Take or Pay onerem sua operação e diminuam a sua competitividade.
E aí se insere o caleidoscópio de oportunidades e decisões que deve considerar escolhas estratégicas quanto ao aproveitamento das diversas fontes de energia, sem que fiquemos ancorados exclusivamente aos preços dos leilões, onde díspares fontes competem em condições desiguais.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 29/08/2012
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