O clientelismo distorce a representatividade política, e se a votação do candidato depender de sua capacidade de distribuir benesses, corrói-se o regime
Assim como ocorreu nas eleições de 2010, a Justiça e o Ministério Público Eleitorais fluminenses empreendem ações para coibir talvez uma das mais deletérias ações clientelistas da política local, os chamados “centros sociais”.
Sem nada a dever a esquemas semelhantes existentes nas regiões mais atrasadas do país, em que o voto é trocado por favores e até mesmo dinheiro, esses centros são instalados por políticos para atender eleitores carentes e, assim, obter seu voto. Subúrbios do Rio e a Baixada Fluminense são as áreas mais visadas pelo clientelismo.
Oferecem-se tratamento dentário e consulta de clínica geral, pediatria, ortopedia, entre outras especialidades médicas. Até mesmo a oferta de assistência jurídica serve para atrair votos.
É árduo o trabalho da Justiça Eleitoral. No início do mês, “O Globo” constatou que pelo menos cinco centros sociais de políticos já processados devido à prática clientelista continuavam a operar na Zona Norte e Baixada Fluminense. Pertenciam aos deputados estaduais candidatos à reeleição Dionísio Lins (PP), Márcio Panisset (PDT) e Dica (PMDB). Os processos se encontravam no gabinete da juíza Laurita Vaz, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A proverbial lentidão da Justiça brasileira no julgamento de processos torna o problema ainda mais sério, por estimular a impunidade.
O clientelismo é sintoma de um estilo degradado de se fazer política. No caso dos ditos centros sociais, há peculiaridades hediondas. Por eles existirem devido às deficiências na prestação de serviços públicos, principalmente na Saúde, é certo que ao político beneficiário desses centros não interessa qualquer melhoria no SUS, por exemplo.
Elegem-se, portanto, agentes públicos que não trabalharão para que serviços essenciais melhorem de qualidade, um tremendo contrassenso. Se puderem, farão o oposto. Não é incomum se encontrar nesses centros material médico desviado de unidades públicas.
Outra séria distorção é que o dinheiro usado nos centros não aparece na prestação de contas do candidato. Imagina-se que parte do clássico caixa dois sirva para bancar esses guichês de compra de votos.
O clientelismo é um eficaz instrumento de distorção da representatividade, cuja qualidade é essencial para a democracia. Se a votação do candidato passa a depender de sua capacidade de distribuir favores, a democracia representativa é negada.
A demagogia e o clientelismo têm raízes fundas num sistema partidário distorcido. Mas, independentemente disso, a Justiça Eleitoral e o MP precisam continuar a atuar contra este mercado de trocas. Mesmo que a prática do “toma lá, dá cá” também exista em altos escalões do poder. Não se deve ficar à espera de reformas.
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