Há um argumento político-econômico que ganha cada vez mais terreno nos dias de hoje: o livre-comércio é o grande responsável pela diminuição do emprego industrial. Tal argumento é tão forte que o processo eleitoral mais importante do mundo (por sua influência) foi ganho usando-se dessa falácia contra o livre-comércio. O então candidato republicano Donald Trump esbravejou aos quatro ventos que acordos comerciais desfavoráveis (e protecionistas) com outros players mundiais (México, Canadá e China, principalmente) eram os responsáveis pela perda de um terço do emprego industrial americano desde a assinatura do NAFTA e pelo fechamento de 50.000 fábricas em solo americano desde que os Estados Unidos passaram a fazer parte da Organização Mundial do Comércio (OMC). Tal processo, segundo os defensores desse argumento contra o livre-comércio, culminou na desindustrialização americana e no achatamento da classe média.
De fato, é um argumento falacioso. No caso americano, a diminuição marcante do emprego industrial deve-se não ao livre-comércio, mas sim à evolução tecnológica que substituiu e continua substituindo trabalhadores humanos por máquinas e robôs. De acordo com um estudo realizado pelo Center for Business and Economic Researchda Ball State University, 85% da redução do emprego industrial é explicada pela automação industrial. Uma das principais conclusões do estudo é que, embora tenha havia uma acentuada queda no emprego industrial, o setor manufatureiro ficou mais produtivo e a produção industrial têm crescido continuamente. Em outras palavras, a automação industrial permite que se produza mais com menos mão-de-obra, e tal processo parece ser irreversível, aniquilando principalmente posições que exigem menos qualificação. Dessa forma, a população americana não deveria se iludir na esperança de que o tão aclamado “protecionismo comercial”, peça central do plano econômico do novo governo republicano, possa reverter tal quadro. A aceleração da automação industrial e a transição para uma economia digital forçosamente intensificarão o achatamento do emprego industrial, mas não é com protecionismo comercial que resolveremos esse problema.
O caso do Brasil é ligeiramente diferente. Dois fatores internos intensificaram a redução do PIB industrial brasileiro: primeiro, um arcabouço regulatório (CLT) defasado, confuso e custoso para as empresas, que criou um incentivo fortíssimo pela transformação de operações intensivas em mão-de-obra para operações intensivas em capital; segundo, uma total falta de política industrial capaz de inserir o país no mapa internacional da produção e do comércio, fazendo com que sejamos, em pleno século XXI, um dos países mais fechados do mundo e com os piores índices de produtividade e eficiência (custo-Brasil). A falida “política dos campeões nacionais”, pregada pelo lulopetismo e executada pela gestão anterior do BNDES, mostrou-se pobre e frágil como política industrial e ainda deixou um conjunto de “esqueletos” que ainda teremos que contabilizar pelo caminho. Oi, EBX e Sete Brasil são apenas alguns entre tantos exemplos de empresas e setores que mesmo com subsídios altíssimos (muitas vezes artificiais) encontram-se com processos de recuperação judicial já em andamento.
É importante que tiremos algumas conclusões e aprendizados depois de tantos erros cometidos. Talvez o mais importante seja que os governos não devam participar com tanto peso na economia e devem contentar-se com o papel de indutores do crescimento, ou seja, criando o ambiente econômico e a segurança institucional para que os agentes invistam de acordo com as necessidades e oportunidades apresentadas pelo mercado. Outra lição relevante é a necessidade de desburocratizar a economia e as relações entre os agentes, e nesse sentido a reforma trabalhista talvez seja um primeiro movimento nesse sentido. Também não seria mal aprendermos com as experiências bem-sucedidas de política industrial de outros países, notadamente a Coréia do Sul e alguns dos Tigres Asiáticos, cujos governos, em poucas décadas, souberam criar e executar políticas de maneira consistente e que provam para o mundo que o livre-comércio não é necessariamente uma causa para a redução do emprego industrial.
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