Após muitas idas e vindas do Planalto, um “Chicago boy” foi chamado para arrumar as contas do governo. Por sua origem acadêmica, era de se esperar que medidas de racionalização burocrática e de apoio ao livre mercado seriam a tônica da nova equipe econômica. No entanto, a novidade nasceu passada, vindo, já na largada, a fazer mão do velho e saturado recurso do aumento tributário. Para tentar amenizar a ferroada, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se apressou em dizer que a iniciativa não traduziria um saco de maldades. O interessante é que ninguém havia abandonado a bondade de pensamentos, sendo a fala do ilustre titular da Fazenda absolutamente sintomática.
Honrando as melhores tradições da Escola de Chicago, Milton Friedman foi um homem que jamais temeu o debate público, contribuindo com sua eloquente inteligência para o progressivo aperfeiçoamento das instituições. Que o exemplo cívico de Friedman sirva de modelo em terras nossas e, por assim ser, torço para que Levy tenha a coragem de colocar o dedo na ferida e não se torne mais um simples joguete nas mãos do poder desmiolado. A independência talvez cobre o seu preço, mas não há valor que pague a tranquilidade de uma consciência que cumpriu o seu dever. E cumprir o dever com retidão é o primeiro imperativo ético de um homem público que se preze.
A situação é clara: o art. 37 da Constituição elevou a eficiência como princípio fundamental da administração pública brasileira. Ou seja, governo ineficiente é inconstitucional, estando despido de legitimidade para onerar o cidadão com o custo de sua ineficiência. Naturalmente, os tributos podem ser majorados com vistas a maior promoção e abrangência do bem-estar do povo. Todavia, o governo deve provar que a elevação fiscal não é resultado da incompetência de uma administração perdulária, inchada e corrupta.
[su_quote]A insanidade fiscal brasileira tem que ter um fim. Não é mais possível que o setor produtivo pague a conta da improdutividade pública[/su_quote]
Objetivamente, quanto mais eficiente for a gestão pública, menor será a necessidade de recolhimento tributário. O motivo é simples: a eficiência é uma forma de otimização administrativa, gerando redução dos gastos, aumento da produtividade e incremento material das políticas de interesse coletivo. Todavia, quanto maior for o grau de corrupção, burocracia e falta de espírito público de uma nação, maior será a gula de arrecadação fiscal para compensar as mazelas da ineficiência estatal. Nesse contexto, o governo usa o contribuinte para autofinanciar sua grave incompetência política.
Com uma carga tributária que beira os 40% do PIB nacional, seria de supor que os serviços públicos brasileiros fossem modelares. Todavia, a realidade não é tão doce quanto a ilusão dos sonhos. O fato é que pagamos muito para receber muito pouco. Na verdade, quem dispõe de capacidade contributiva no Brasil tem o pesado encargo de pagar duas vezes: primeiro, para a ineficiência pública e, depois, para a proteção privada. Os exemplos não nos deixam mentir: como o Estado não proporciona segurança, temos que contratar guardas privados; como a escola pública está dilapidada, o ensino particular surge como alternativa; diante do caos da saúde pública, os planos médicos particulares são a saída; e, diante das insuficiências do INSS, os aposentados têm que buscar dignidade em programas de previdência privada. E por aí vai, pois a lista é longa.
Ora, a insanidade fiscal brasileira tem que ter um fim. Não é mais possível que o setor produtivo pague a conta da improdutividade pública. Para agravar a situação, temos um cipoal de 39 ministérios e uma frenética burocracia estatal. Além disso, a corrupção é uma realidade evidente, tão escura quanto à bilionária cor do petróleo. Portanto, seria aconselhável que o eminente ministro Joaquim Levy centrasse seus esforços nesse aspecto do problema: o combate à ineficiência estatal, cujo preço é o sistemático aumento tributário. Mas o que fazer quando o alto saber técnico se choca com os baixos interesses da política rasteira?
Fonte: O Estado de Minas, 26/1/2015
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